Para Hélio Filho, a câmera era um brinquedo enquanto corria sobre o solo fértil do quintal da Fundação Casa Grande, em Nova Olinda. Nascido em Juazeiro do Norte, aos 8 anos, ele percorria semanalmente os 45 km que separavam as duas cidades, a fim de participar do projeto de formação cultural para crianças e jovens que a instituição proporciona.
Hoje, aos 37 anos, através de projetos para a Unesco, Itaú Cultural, Centro Cultural Banco do Nordeste e Sesc, Hélio é um dos nomes que reconta, por meio da imagem, o Cariri para o mundo.
"Onde moro, não tínhamos acesso à formação naquela época, e se não fosse por meio da Fundação Casa Grande, não teria como chegar a nada do que aprendi. Vivenciei música, vídeo, edição e sinto que foi isso que me abriu o olhar e os caminhos na área artística", explica.
Conhecido por registrar o couro de Espedito Seleiro, as máscaras do Reisado, os sons da Banda Cabaçal dos Irmãos Aniceto e as mãos enfileiradas na festa do Pau da Bandeira, Hélio se descreve como alguém que está sempre em busca de pessoas.
Se, para muitos, o definidor de uma boa foto é a lente adequada, a iluminação certa e uma pós-edição assertiva, o fotógrafo olha para o lado oposto.
"Antigamente eu pensava mais em luz, direção, composição. Hoje, o que me importa é a história. Um mestre da cultura que trabalha com determinada área, um agricultor que desenvolve a cultura do bacamarte… boas histórias são mais relevantes do que a composição estética, luz, ou qualquer outra coisa", defende.
Ao refletir sobre o papel da fotografia enquanto registro do patrimônio imaterial de um povo, Hélio também acredita na transformação social que as imagens podem causar.
"Quando a gente registra essas manifestações artísticas, através do compartilhamento de imagens e histórias, também garantimos que esses materiais circulem em novos espaços, preservando e passando adiante uma cultura. A criação artística e documental se dá a partir desse convívio com esses personagens, que acabam nos dando muitas ideias de fotos também", diz Hélio, ressaltando o aprendizado de via dupla.
Observando a linguagem fotográfica que é praticada por uma nova geração de artistas cearenses, Hélio destaca a influência e a sucessão dos olhares que lhe antecederam.
"O que vejo é que somos uma continuidade de pessoas que já plantaram essa ideia de fotografia e produção audiovisual no Estado. Bebemos sempre dessas fontes de fotógrafos e documentaristas que nos antecederam no Ceará. Vejo uma continuidade, e não propriamente uma diferença", explica.
Mais informações: @helinhofcg
Retratar o outro
Já para Elena Hilário, por muitos anos, a câmera era um objeto empoeirado no armário do pai. Foi em 2021, por uma necessidade de conteúdo para uma marca em que trabalhava, que ela teve de aprender os conceitos básicos para fotografar algumas peças, e nunca mais parou.
Hoje, aos 21 anos, enquanto cursa Publicidade e Propaganda, a fotógrafa concilia uma agenda de shootings para marcas que buscam autoralidade em suas campanhas.
Com um portfólio que varia entre redes de hotéis, marcas consagradas e coleções de artistas emergentes, Elena foi construindo uma linguagem fotográfica baseada em uma iluminação onírica e difusa, que se tornou sua marca registrada.
"A iluminação muitas vezes dita o tom da imagem, podendo comunicar desde algo super dramático e impactante até uma imagem suave e delicada. Na moda, temos a possibilidade de controlar bem a iluminação para atingir o resultado proposto e comunicar o que aquela marca busca, seja algo mais comercial ou conceitual", explica.
Na prática, a fotógrafa também desenvolveu um tratamento de imagem característico, e explica que a pós-edição é ferramenta certeira para quem deseja firmar um estilo e um olhar.
"Acredito que a pós complementa o olhar do fotógrafo para além da hora do clique, pois é onde ele também terá a possibilidade de brincar com a tonalidade da foto e o que ela comunica. Gosto de remeter à fotografia analógica, adicionando textura, ruído, tons mais quentes", detalha.
Apesar do caráter comercial que, por vezes, está embutido em seu trabalho, Elena também desenvolve projetos autorais e ressalta as peculiaridades de fotografar o outro, com seus trejeitos e singularidades.
"O fotógrafo precisa estabelecer um tipo de conexão com quem está ali, o que pode ser um desafio. Deixar a situação menos impessoal e mais humanizada: se apresentar, explicar como você trabalha, ir direcionando durante os cliques e fazer pausas durante a sessão são boas formas. O segredo é realmente estar presente e dar atenção àquela pessoa", afirma.
Inspirada por nomes cearenses como Thomas Weinreich, Cadu Franco e Matheus Queiroz, ela afirma buscar referências em filmes, revistas, exposições e no próprio Instagram. Para Elena, com a difusão das redes, um nicho fotográfico que pode ser árduo e competitivo passa a ter novos contornos.
"É um mercado concorrido e fechado, muitas marcas e agências gostam de trabalhar sempre com os mesmos profissionais. Mas vejo que diariamente surgem novas tendências e olhares. Vivemos em uma época em que a mudança é constante e em que a informação é facilmente difundida. Isso é uma vantagem para quem quer crescer nesse meio, e o mais importante é acreditar no seu trabalho, ir entendendo o seu estilo e divulgar isso", finaliza.
Mais informações: @elenahilarioo
Retratos da Fotografia no Ceará
Esta matéria integra a série sobre novos olhares na fotografia cearense. Acompanhe a continuação nas edições de terça e quarta-feira.