Para Beatriz Souza, a fotografia era a ferramenta que a mãe usava, enquanto registrava os momentos de convívio no bairro Vila Velha e o crescimento de Bia ao longo dos anos.
Foi quando, aos 16, a jovem iniciou o curso de fotografia básica com o celular, na Rede Cuca, e a hora de fotografar se tornou a maior espera em seus dias.
“Quando comecei, não tinha nada, nenhum equipamento. Fazia os cursos na Rede Cuca e só tinha acesso àquilo durante as aulas. Fazia pela manhã um curso no Cuca da Barra e, à tarde, já estava na Cuca do Jangurussu. Cruzava a cidade para fazer o mesmo curso duas vezes. Era cansativo, mas chegava sempre muito realizada com o que aprendia”, relembra.
Seis anos depois, por meio da fotografia de rua, a jovem é uma das responsáveis por cartografar a cidade em seus diferentes bairros, contextos e realidades.
“Percebi que o meu trabalho poderia ser um olhar não só para mim, mas para outras pessoas que moram em periferias e favelas e sabem que a realidade é diferente. Desde o começo, meu trabalho foi fotografar esse outro lado de Fortaleza. Ele vai além da fotografia e tem como base as vivências e todos aqueles que me rodeiam”, conta.
Aos 21 anos, a jovem comanda o Favelarte, empreendimento independente que tem como escopo divulgar a produção de Bia e capacitar jovens na área de fotografia. É por meio dele que, de forma autônoma, a artista percorre diversas comunidades e projetos sociais em Fortaleza, comprovando que a essência da fotografia independe de recursos e grandes equipamentos.
“Ministro cursos gratuitos, aulas e oficinas para pessoas da comunidade e da favela que têm interesse e estão buscando novas experiências. Muitas delas são com os celulares, pois comecei com um que não tinha muita qualidade e, mesmo assim, conseguia capturar fotos boas. O olhar é muito sensível e é o que mais impacta”, defende.
Dentre os trabalhos de destaque da artista está “Se essa casa fosse minha”, ensaio coletivo resultante de uma semana de formação com crianças das comunidades do Poço da Draga e da Graviola.
“No final, elas ganharam uma exposição fotográfica na BECE. Foi importante para mim e para elas, por conta do ensino, da aprendizagem e por verem o resultado do próprio trabalho em prática”, afirma.
Entre os planos futuros, além de captar recursos e expandir a atuação do Favelarte, Beatriz desenvolve um projeto de museu fotográfico comunitário para o bairro Quintino Cunha, onde reside atualmente.
“Pretendo conseguir recursos e me organizar bem para dar cada vez mais cursos. Sempre trabalho nas minhas oficinas tanto a fotografia digital quanto a fotografia impressa, com a qual, desde pequena, fui apegada. Mesmo que não consiga levar muitas câmeras e equipamentos, sempre levo várias fotos impressas, para que eles vivam essa experiência”, diz.
Ao pensar no futuro dos inúmeros jovens que encontra em suas oficinas, Bia acredita que o presente seja frutífero para a nova geração, com mais oportunidades de acesso e inovação por meio da tecnologia.
“Acredito que Fortaleza tem um grande potencial para o surgimento de novos fotógrafos dessa nova geração. Sou uma dessas jovens e sou fruto de cursos gratuitos na cidade. Ainda há muito a se desenvolver, e espero que isso aconteça rápido, pois temos muita gente chegando ao audiovisual. Desejo que Fortaleza seja não só referência na fotografia, mas que os jovens daqui sejam valorizados e que sua arte se expanda para vários lugares”, finaliza.
Retratos da Fotografia no Ceará
Esta matéria encerra a série sobre novos olhares da fotografia cearense, iniciada na segunda-feira, 6. Confira as demais reportagens publicadas.
Beatriz Souza
Fotógrafa, cineasta e educadora visual de Fortaleza. Sua produção alia memória, resistência e transformação social, utilizando fotografia e audiovisual para retratar o cotidiano das comunidades.