No Centro de Fortaleza, residências que somam mais de um século resistem às mudanças da sociedade e às tentativas de apagar a história. Inaugurado em 1871, o Palacete Senador Alencar já foi espaço para a Assembleia Legislativa Provincial, Faculdade de Direito, Tribunal de Contas, Academia Cearense de Letras, Biblioteca Pública e Instituto do Ceará.
Tombado em 1973 pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), o local é residência do Museu do Ceará desde 1990. Primeira instituição museológica do Estado, o equipamento que abriga parte do patrimônio cultural e reconta a trajetória dos cidadãos cearenses está fechado para visitação pública desde abril de 2019.
Localizado entre as ruas Floriano Peixoto, General Bezerril e São Paulo e a Travessa Morada Nova, o Museu do Ceará teve atividades interditadas para a realização de reforma e reestruturação do prédio. Conforme informações da Secretaria de Cultura do Ceará (Secult-CE) ao Vida&Arte, a obra encontra-se com 70,46% de execução.
A previsão de conclusão da reforma era anteriormente marcada para 2 de novembro deste ano, um domingo, mas devido à descoberta de "novos cenários e, para garantir a entrega de uma edificação segura, preservando o patrimônio histórico e cultural que o Museu do Ceará representa", a data de entrega foi atualizada para 2 de janeiro de 2026.
Em resposta aos questionamentos do Vida&Arte no último dia 15, a pasta estadual detalha que "foi identificado um problema estrutural na coberta de madeira da sala de exposições do segundo piso", ocasionando a alteração no cronograma. "As inspeções realizadas no decorrer da obra evidenciaram comprometimentos nos elementos da estrutura, não detectados nas fases iniciais", explica.
Ainda de acordo com as informações fornecidas pela secretaria, a obra está sob execução do Consórcio Cetro/CHC, que trabalha neste momento na estrutura de suporte de forros amadeirados e de gesso, instalações prediais, dos equipamentos de climatização, aplicação de revestimentos, restauro de esquadrias e realização de pintura.
No texto enviado à reportagem, a Secult ainda pontuou que as medições de valor, atualmente, estão acumuladas em "R$ 4.016.727,45 de um total contratado de R$ 5.700.419,20. O valor inicialmente licitado foi de R$ 4.729.973 e o aditivo financeiro foi de R$ 970.446,20".
Segundo a pasta, está sendo providenciada a "elaboração de um projeto específico de recuperação, de forma a assegurar a estabilidade da edificação e a correta execução das etapas seguintes da obra".
Na tarde de segunda-feira, 20, o Vida&Arte foi ao local acompanhar e verificar o status em que se encontra o Museu do Ceará. Em meio à movimentação rotineira do Centro, trabalhadores contratados para a obra seguiam com o serviço e foi possível identificar materiais de construção, bem como ar-condicionados ainda empacotados e cinco janelas já reformadas. A equipe de reportagem não recebeu autorização para entrar nas dependências do museu - ficando circunscrita ao entorno.
Das novidades estruturais antecipadas pela Secult-CE, o equipamento cultural deve receber, quando reaberto para visitação, no primeiro semestre de 2026, "réplicas completas" de peças em serralheria que estavam em "avançado estado de deterioração", além de um novo projeto de subestação, este sob aprovação da Enel.
"A obra visa modernizar o museu, atualizando os espaços de exposição e implementando melhorias de acessibilidade. (...) Essas melhorias buscam preservar a memória histórica do Ceará, oferecendo aos futuros usuários um espaço renovado que atenda às demandas contemporâneas de acessibilidade, tecnologia e comunicação, sem comprometer a integridade do patrimônio arquitetônico e cultural do antigo Palacete Senador Alencar", explica o texto da pasta gerida por Luisa Cela.
Com direção da historiadora Raquel Caminha, o equipamento é abrigo oficial de cerca de 13 mil peças, organizadas nas coleções Dias da Rocha, Thomaz Pompeu Sobrinho, Numismática, Iconográfica, Bibliográfica e Histórica e outros arquivos.
Devido à obra, o acervo do museu hoje está hospedado no Anexo Bode Ioiô, localizado na Praça do Ferreira. Recebendo em torno de mil visitantes mensais, como informa a Secult-CE, o local "continuará sendo utilizado para reserva técnica e outras atividades administrativas" mesmo após a reabertura do Museu do Ceará no primeiro semestre de 2026.
Em julho de 2021, ao O POVO, Raquel revelou que, com a reforma, era esperado a manutenção de "suas características originais, fortalecendo a estrutura, esperamos também a requalificação do prédio para atender de uma melhor forma os seus usuários".
Visando o centenário do Museu do Ceará, que ocorre em 2033, o espaço está em "contínuo processo de revisão e atualização da documentação do acervo", como reforça a secretaria, acrescentando que devem ser incorporados novos itens para expansão das coleções.
Comitiva
Durante visita do Vida&Arte aos arredores do Museu do Ceará, no dia 20 de outubro, a equipe esbarrou com uma comitiva do Instituto Mirante de Cultura e Arte, liderada por Tiago Santana, diretor-presidente da organização social (OS), e Iana Soares, diretora-executiva, além de outros agentes que saíam do prédio em reforma.
Questionada sobre a presença expressiva dos agentes culturais no local em obras, a assessoria do Mirante declarou que a instituição foi convidada devido à parceria com a Secult-CE na "gestão de outros equipamentos culturais, que também integram a Rede Pública de Espaços e Equipamentos Culturais do Estado do Ceará (Rece)", sendo a passagem algo "comum e rotineiro entre as instituições".