Os sonhos não realizados esperam com paciência pelo momento certo. Começo a acreditar nisso, porque tenho bons motivos.
Meu livro de estreia, "A sala de aula e outros contos", traz na capa um barquinho de papel conduzido por um garoto, que usa um lápis como remo, na representação onírica de revoltas ondas de folhas de caderno.
Belamente ilustrado por Ana Maria Moura e lançado em 2012 pela Scipione, a publicação me deu a alegria de integrar o catálogo de Bolonha de 2013.
Foi a primeira vez que sonhei com essa cidade, famosa não somente pelo molho à base de carne moída, tomate e sal, mas também por sediar a maior Feira Internacional do Livro Infantil e Juvenil.
Na época, pensei como seria a emoção de localizar as histórias que escrevi na prateleira de um dos stands do evento. Fiquei apenas na imaginação. Não fui, não foi possível, mas o livro viajou por mim. Estava de bom tamanho.
Eu não poderia prever que surgiria outra chance em 2017, quando "A menina dos sonhos de renda", publicado pela Moderna no ano anterior, também entrou para o referido catálogo. Desejei muito a experiência de caminhar pelos corredores da feira até meus olhos reconhecerem a capa azul com as fachadas de Aquiraz recriadas em brancos pontos de renda na linda ilustração de Marcella Riani. De novo, o livro foi, eu não.
Não exigi de um barquinho de papel robustez para a aventura de uma travessia oceânica ou que a linha de uma renda gigante fosse longa o suficiente para eu deslizar por ela do Novo ao Velho Mundo. Tudo bem.
Eis que meu livro "Salvaterra", breve romance de coragem, publicado pela SM em 2024, após vencer a 20ª Edição do Prêmio Barco a Vapor, foi premiado como Melhor Livro para Jovem 2025 pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil, seção brasileira do International Board on Books for Young People - IBBY.
Desde 1974, a FNLIJ participa da Feira do Livro de Bolonha. A Feira, por sua vez, inaugurada em 1964, é o ponto de encontro da "família IBBY".
Agora se trata de um búfalo da ilha de Marajó — o animal de estimação da protagonista. E o bicho é exímio nadador. Além disso, tem a força bubalina para carregar no dorso o peso dos sonhos adiados. Coincidência ou não, meu filho Matheus foi aceito pela Universidade de Bolonha, a mais antiga do Ocidente — Instituição pública, datada de 1.088 — para a qual ele aplicou sem nada nos dizer.
Ele fará lá o último semestre do seu curso, no Alma Mater Studiorum, referência na formação em Medicina, no período — adivinhem só — em que ocorrerá a Bologna Children's Book Fair 2026. Enquanto aguardo a confirmação se verei Salvaterra no stand da FNLIJ, vou alimentando o búfalo o melhor que posso. Quem sabe, na primavera do ano vindouro, visitarei dois filhos, acolhidos em terras italianas, um deles, literário?