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Depois do 90, tanta coisa se inventa
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Vida & Arte

Depois do 90, tanta coisa se inventa

Ao viverem assim suas próprias vidas, eles nos mostram que, de fato, somente termina quando acaba — se é que um dia acaba
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A atriz Fernanda Montenegro (Foto: EDUARDO NICOLAU/AE)
Foto: EDUARDO NICOLAU/AE A atriz Fernanda Montenegro

Adélia Prado, majestosa em sabedoria e simplicidade mineiras, acaba de chegar aos 90 anos. O aniversário dela foi em 13 de dezembro. Do mesmo modo, Raduan Nassar, na paz de seu retiro voluntário, "noventou" no final de novembro, precisamente no dia 27.

Em outubro, nossa grande diva do cinema e do teatro, Fernanda Montenegro, fez os 96 — que ela ostenta lindamente — e, no mesmo mês, cantamos os parabéns pelos 93 de minha mãe. Em março, Ruth Rocha completou os seus invejáveis 94. E faltam poucos dias para o maestro Isaac Karabtchevsky soprar com vigor até apagar as velinhas do número 91 no centro do bolo confeitado.

Fora o óbvio, a idade na casa dos 90, eles têm em comum a energia vital que lhes permite realizar sonhos e projetos. Estão em plena atividade. Adélia lançou neste ano "O jardim das oliveiras", já um sucesso editorial. Fernanda, entre comerciais narrados ou atuados, sempre emocionantes, e a presença na TV e no palco, grava "Velhos Bandidos", sob a direção do filho, Cláudio Torres.

No elenco, Bruna Marquezine, Vladimir Brichta, Lázaro Ramos e Ary Fontoura — aos 92, outro belo representante dessa feliz espécie "homo viventis". O filme deve entrar em cartaz nos cinemas em 5 de março de 2026. Ruth publicou, no começo de 2025, um livro em parceria com ninguém menos que Mauricio de Sousa, que dispensa apresentação.

"Encontro de histórias" é também um encontro de nonagenários, pois, em outubro, Mauricio entrou para essa turma, além da sua anterior, a da Mônica. Isaac continua à frente de importantes instituições musicais. É o Diretor Artístico da Orquestra Sinfônica Heliópolis e o regente da Orquestra Petrobras Sinfônica.

Mamãe desconcerta os médicos quando sobrepõe aos seus exames rotineiros a carteira de identidade. Eles desconfiam do RG, "não pode ser", afirmam no propósito de mexer com a sua vaidade, enquanto a imagem na tela vai revelando um coração de jovem, em medidas, aspecto, características.

Talvez resida justamente aí o segredo: no coração jovem de mamãe, no sorriso adolescente de Adélia, no olhar aceso de curiosidade infantil de Fernanda, no convívio de Ruth e de Mauricio com as crianças, seu principal público leitor, na habilidade para se reinventar diante da câmera para as postagens na Internet que celebrizaram ainda mais o formidável Ary, na vibração dos sons, músicos e instrumentos, comandados pela batuta de Isaac.

Ao viverem assim suas próprias vidas, eles nos mostram que, de fato, somente termina quando acaba — se é que um dia acaba. E que, antes do último fechamento das grossas cortinas de veludo vermelho, há tanta coisa a inventar, a conquistar, a celebrar.

Por isso, antecipo a beleza de festa que será a comemoração do centenário de Ariano Suassuna. Para quem não sabe ou não se lembra, daqui a dois anos, ele fará 100 anos. Ariano, é claro, continua entre nós, vivíssimo.

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