A Conferência da Cidade de Fortaleza realizou neste sábado, 25, intensas discussões temáticas, etapa crucial antes da votação final do projeto de lei do Plano Diretor Participativo e Sustentável (PDPS). O evento, que ocorre no Centro de Eventos do Ceará, reuniu 596 delegados e 60 observadores para analisar artigo por artigo da minuta do plano, que possui 621 artigos.
Este sábado foi dedicado aos Grupos de Trabalho (GTs), onde representantes do poder público e da sociedade civil aprofundaram o debate sobre o anteprojeto de lei. Foram seis GTs, que hoje estão restritos aos delegados eleitos e observadores, envolvendo a discussão e votação de emendas para aperfeiçoar, acrescentar ou suprimir partes do texto.
Os artigos que não receberem destaque nas discussões que se iniciaram ainda na sexta-feira, ou aqueles cuja manutenção do texto original for aprovada, serão considerados automaticamente válidos. A agenda de trabalho culmina neste domingo, 26, com a plenária final para a apresentação e votação dos destaques e a aprovação do projeto de lei que será enviado à Câmara Municipal de Fortaleza (CMFor).
Os delegados — que têm direito a voz e voto — levaram as demandas de seus grupos ou territórios, interagindo ativamente nos debates temáticos. Entre as temáticas abordadas, alguns pontos centrais geraram mais polarização no debate.
O debate ambiental trouxe visões diferentes entre representantes da sociedade, como o presidente do Instituto de Pesquisa e Planejamento de Fortaleza (Ipplan), Artur Bruno, e o ambientalista e vereador de Fortaleza, Gabriel Aguiar (Psol).
Artur Bruno defende que a proposta é "bastante equilibrada e bastante harmônica". Segundo ele, a minuta buscou conciliar os legítimos interesses da sociedade, garantindo que a cidade cresça e tenha mais construções, mas com equilíbrio e focada em áreas onde há infraestrutura.
Bruno afirma que o novo Plano Diretor tentou preservar a maior quantidade de áreas verdes possível, superando, inclusive, o plano anterior. Ele destacou ainda a criação de instrumentos urbanísticos para que as construções busquem ser mais sustentáveis, utilizando, por exemplo, energias renováveis e o IPTU Verde.
No entanto, o vereador Gabriel Aguiar, focado no Grupo de Trabalho de Meio Ambiente e Paisagem, classifica a minuta como tendo tanto "avanços históricos" quanto "retrocessos inaceitáveis".
O vereador reconhece a conquista de algumas Zonas de Proteção Ambiental (ZPAs), como as dunas do Cocó e da Cidade 2000, o vulcão do Ancuri e o Morro de Santa Teresinha. Ele também cita a inovação com a criação de zonas especiais de comunidades tradicionais e zonas de vulnerabilidade climática.
A principal angústia reside no que foi retirado na reta final, em comparação com o que havia sido consenso entre a participação social, segundo o parlamentar. Aguiar aponta uma redução drástica das áreas verdes, estimando uma queda de 500 para 100 nas ZPAs inicialmente propostas. Áreas como o Refúgio das Jandaias e o Serrado dos Correios foram retiradas da classificação ZPA, cita.
Aguiar também alertou para uma grave insegurança jurídica causada por um artigo da minuta que permite que autorizações de desmatamento emitidas antes da aprovação final do plano sigam válidas, mesmo que a área se torne ZPA, colocando todas as zonas de proteção ambiental em risco. Além disso, ele questiona o fato de muitas Áreas de Preservação Permanente (APPs), exigidas pelo Código Florestal (como brejos, lagoas, nascentes e riachos da “Floresta do Aeroporto”), não terem sido classificadas como ZPA no plano, liberando-as para construção.
O vereador concluiu que há uma ligação direta entre esses retrocessos ambientais e a pressão da construção civil. “Não há nenhuma dúvida que foi essa força que retrocedeu todas essas zonas de proteção ambiental. Havia uma expectativa de 58% de aumento de ZPAs, como foi dito no início, isso caiu para 20% ou menos. Então, foram muitas áreas importantes perdidas e as que foram conquistadas, como as Dunas, a gente fica preocupado por conta daquele artigo. Pode ser que, 30 segundos antes de o prefeito assinar, pode ser emitida uma licença e a ZPA vai pro brejo”, explicou.
A questão da construção civil é central, uma vez que o Plano Diretor define o que pode ser construído, quantos andares um imóvel pode ter e como a cidade deve crescer.
Artur Bruno detalhou a estratégia para a expansão urbana. “Nós organizamos, nesse plano diretor, uma cidade policêntrica que vai crescer mais nas regiões onde tem polos, onde tem eixos de transporte, áreas onde tem uma boa infraestrutura terá um poder construtivo maior”, explicou ao O POVO.
Ele explicou o instrumento da Outorga Onerosa do Direito de Construir, que já existia, mas teve alterações significativas na minuta.
O ex-deputado explicou que é esse aumento dos valores da outorga o motivo de questionamentos por parte de representantes do setor de construção civil, mas defendeu que o aumento é favorável, pois cumpre a função social da cidade, permitindo que "quem tem mais pode pagar mais para que a gente possa usar recursos para aqueles que têm menos, que mais precisam".
O Plano Diretor prevê o prazo de um ano para a criação do Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano, que definirá como esses recursos serão utilizados.