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Nem gorda nem magra: o que é o movimento midsize?
Reportagem Especial

Nem gorda nem magra: o que é o movimento midsize?

Medidas do corpo como fator de identidade. Para quem não se enxerga como gorda ou magra, chegou o "movimento" midsize

Nem gorda nem magra: o que é o movimento midsize?

Medidas do corpo como fator de identidade. Para quem não se enxerga como gorda ou magra, chegou o "movimento" midsize
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Midsize, tamanho médio ou meio termo em português, é um termo têxtil voltado para roupas e para moda. É usado, inicialmente, como uma nomenclatura para numeração/tamanho de vestimentas, referindo-se a medidas que são utilizadas por mulheres que não se consideram magras ou gordas, que não vestem medidas estabelecidas como “padrão” ou plus size. Seguindo a lógica da tradução: um meio termo entre os dois tamanhos.

Contudo, o objetivo da criação e do uso do termo não veio somente para abrir espaço para uma nova categoria a qual as mulheres fazem uso na hora de encontrar tamanhos de roupas. Tem mais a ver com um “lugar” onde muitas conseguem se sentir encaixadas e representadas.

A categoria midsize surgiu por meio da comediante americana Amy Schumer, que em 2016 falou na mídia sobre não se sentir representada pela moda plus size ou pelo “padrão” magro. A partir disso, o termo rapidamente foi adotado por mulheres que, finalmente, sentiram que haviam encontrado seu espaço, lugar de fala e entendimento de que existe, sim, uma medida para lhes servir. Mas o chamado movimento midsize só começou a ganhar força, principalmente na internet, no ano passado.

Segundo a designer e coach de imagem e estilo, Andrea Cerqueira, que usa midsize e se sente representada por essa categoria, o ser humano está o tempo todo procurando um lugar para se encaixar. “O mid vem para libertar um pouco a gente dessa coisa tanto do ‘padrão’ de não estar no 38 ou 40, mas também de não estar do 50 em diante. Você fica naquele meio termo, sem saber o que exatamente pode ou não vestir. Eu acredito que isso nos ajuda muito a ter uma percepção mais exata do próprio corpo e usufruir melhor da informação desse termo com relação a estilo pessoal e imagem”, explica a designer.

A partir do surgimento do midsize como medida e forma de representatividade, o mercado feminino, que por muitas vezes “excluía” a mulher mediana, passou a voltar um pouco mais a atenção para este novo segmento.

Andrea Cerqueira, 37 anos, estilista e consultora de imagem e estilo com foco na mulher comum
Andrea Cerqueira, 37 anos, estilista e consultora de imagem e estilo com foco na mulher comum

Afinal, qual o tamanho midsize?

Nos Estados Unidos, onde o termo surgiu, as numerações para o midsize costumam ficar entre 44 e 56. No entanto, não se pode usar corpos de mulheres americanas como base de medidas para outros lugares, como, por exemplo, países asiáticos, onde a maioria das mulheres costuma ter corpos bem mais magros.
No Brasil, a medida tem sido utilizada por mulheres que possuem curvas mais acentuadas, mas que não são plus size. As numerações vão, geralmente, do 42 ao 48, sendo comumente usadas por mulheres que não se consideram gordas, mas que também não possuem uma estrutura corporal dita como “padrão”.

O mercado midsize: um segmento ainda pouco explorado

Raquel Medeiros, dona do @vemlimonar, diz que o mercado ainda não conseguiu enxergar que o midsize seja algo rentável. “Eles preferem inserir o midsize dentro de uma marca voltada para o slim ou para o plus size do que ter uma marca voltada somente para este segmento, o que seria incrível”, explica a designer de moda, que também faz consultoria de negócios para marcas de roupa.

@midsizecollective é perfil dos Estados Unidos que mostra moda para corpos de todos os tipos e tamanhos
@midsizecollective é perfil dos Estados Unidos que mostra moda para corpos de todos os tipos e tamanhos

As opções no mercado seriam muitas, mas o movimento midsize ainda precisa ser enxergado como um segmento que trará lucro para haver real investimento. “É possível ter uma marca midsize que trabalhe o tamanho junto com um estilo mais despojado. Mas também é possível ter uma marca midsize que trabalhe com esse mesmo tamanho, mas voltado para a mulher mais clássica, vendendo blazer e roupas de escritório. Não é apenas sobre tamanho, mas o estilo próprio da mulher”, acrescenta Raquel.

É muito importante que as marcas especializadas no midsize façam propagandas de suas roupas por meio de mulheres com medida reais. O uso de modelos com curvas acentuadas, o normal de um corpo mediano, ainda gera impacto ao ir na contramão daquilo que a sociedade está tão habituada a ver, que é a mulher excessivamente magra posando em fotos ou desfilando em passarelas.

“A mulher, quando em processo de aceitação do próprio corpo, dificilmente vai procurar saber se determinada marca vende tamanho 48. Quando ela vê uma foto de uma mulher magra, ela já vai identificar que aquela marca não serve para ela. Então, a marca precisa comunicar isso através de fotos em redes sociais e em catálogos”, complementa a designer e coach de imagem e estilo, Andrea Cerqueira.

 

 

Perfis como @meucorpomid mostram dicas e inspirações de looks que podem e devem ser usados por qualquer tipo de tamanho
Perfis como @meucorpomid mostram dicas e inspirações de looks que podem e devem ser usados por qualquer tipo de tamanho
Na Capital

Poucas marcas brasileiras trabalham somente com tamanhos midsize e plus size, deixando de fora o “padrão”, que já possui opções de sobra na indústria da moda. Exemplos não somente nacionais, mas de Fortaleza, são a Beetop - Curves e a KN - Bonito é Ser Real, especializadas apenas nos dois tipos de categorias.

“Corpo dos sonhos” distorce auto aceitação

O aceitável e o usável não é só o que a modelo esbelta e magra veste, mas o que a modelo mediana e gorda também usa. Tem como ter estilo não sendo magra, e há uma variedade de silhuetas que vão muito além do corpo “tradicional”.

Na internet, a maioria das digital influencers femininas prega, por meio das redes sociais, uma ideia distorcida, irreal e inalcançável de perfeição (sem gorduras localizadas, sem estrias, sem celulites, cinturas ultrafinas etc). Isso acaba destruindo a auto aceitação de algumas mulheres com o próprio corpo. Procedimentos estéticos e plásticas são entendidos como uma obrigação para se alcançar o “corpo dos sonhos”.

Influenciadora brasileira @nannoca aborda corpo midisize
Influenciadora brasileira @nannoca aborda corpo midisize

Mas há páginas e influencers que trabalham com a realidade do que é ser mulher em cada mínimo detalhe, ajudando no processo de auto aceitação e de amor próprio. Um exemplo é o @midsizecollective, perfil americano que mostra que a moda é para todo tipo de corpo e tamanho, trazendo imensa representatividade e espaço para corpos reais.

Além dele, há perfis brasileiros que trazem a mesma mensagem, incluindo dicas e inspirações de looks que podem e devem ser usados por qualquer tipo de tamanho. Nessa proposta, há o @meucorpomid, além de influenciadoras brasileiras como a @nannoca e a @pollycasoti, que abordam sobre moda midsize e mostram que é possível, sim, se amar e ser estilosa sem ter um corpo “padronizado”.

 

 

Outro lado: plus size X midsize

O plus size marca o espaço que pessoas gordas passaram a ter no mundo da moda, permitindo-as também se sentirem representadas em marcas que as fazem encontrar roupas em suas medidas, sem perder o estilo e o conforto. Com o surgimento do midsize, no entanto, ser mediana e não usar plus size pareceu ser recebido como motivo de comemoração para muitas mulheres pelo mundo. Como se ser gorda e usar plus fosse uma sentença, algo ruim e inaceitável.

Elaine Quinderé, que usa plus size e é consultora de estilo, enxerga o midsize como um movimento de representatividade extremamente válido. No entanto, reconhece que o termo tem ganhado força para que mulheres possam dizer que o próprio corpo é mid, o que pode ser uma questão problemática se observada do ponto de vista de uma mulher gorda.

Perfil @pollycasoti aborda beleza e estilo sem se enquadrar em padrões
Perfil @pollycasoti aborda beleza e estilo sem se enquadrar em padrões

“A culpa nunca vai ser da pessoa ou da mulher. A culpa é do sistema que faz com que as pessoas se sintam inadequadas pelo corpo que possuem, sentindo-se erradas por não serem o ‘padrão’ da mídia, da revista, da passarela, da moda, da numeração 34 ou 36, que não tem barriga e nem gordura”, defende.

Mulheres que achavam se encaixar no plus size migraram para o midsize com "alívio" não por se sentirem representadas por uma categoria, mas pela perspectiva de a sociedade e a indústria da moda não as considerarem mulheres "acima do peso". “A minha questão com o termo midsize, com a força que passou a ter nas redes sociais, é que muita gente encontrou a sua ‘turma’ e pensou ‘graças a Deus que eu sou midsize e não sou plus size’. De certa forma, isso acaba por inviabilizar pessoas gordas”, alerta a consultora.

Apesar de todas as questões envolvidas, ela acredita que o midsize chegou mais para agregar do que para desunir. “O midsize tem mais coisas boas do que ruins, porque muita gente se encontrou, e isso é muito bom. Muita gente abraçou a causa, muita menina que gostava de moda passou a produzir conteúdo voltado para isso. Isso é muito bom, pois tinha um meio ali que não conseguia se encaixar em canto nenhum”, finaliza Elaine.

 

 

>>Bate-pronto com Andrea Cerqueira

"Nunca tive raiva nem ódio do meu corpo"

Andrea Cerqueira, 37 anos, estilista e consultora de imagem e estilo com foco na mulher comum
Andrea Cerqueira, 37 anos, estilista e consultora de imagem e estilo com foco na mulher comum

O POVO - Como era a sua relação com seu corpo?

Andrea Cerqueira - A minha relação com o meu corpo sempre foi muito difícil, mas nunca foi venenosa. Sempre foi uma relação de muita gratidão, porque eu fui educada sendo elogiada, sabendo o quanto eu era importante para os meus pais. Eu percebo que essa relação de ódio com o corpo começa muito cedo, na infância. A partir do momento que a criança engorda um pouco e a mãe começa falar sobre o assunto, isso pode gerar muitos problemas. Acho que mais do que tirar alguns costumes da criança, como comer doce numa festa e engordar um pouco mais quando está em fase de crescimento, é a família inteira se envolver e educar no exemplo, na mesa de refeição. Então, eu tive muito amor nesse sentido, mas percebo que muitas pessoas não têm.

O POVO - Como você se sente representada pelo midsize?

Andrea - Eu nunca tive raiva do meu corpo, nem ódio e nem problema com ele. Mas a partir do momento que eu fui tendo mais consciência disso, lógico que foi me ajudando. A partir do momento que eu fui vendo mulheres como eu nas mídias sociais e nas revistas, com certeza me trouxe uma força maior de ser quem eu podia ser. Hoje, temos muito mais acesso a isso, mas, quando eu era adolescente, era diferente. As revistas que eu tinha acesso eram de meninas que venceram o concurso da Capricho, medindo 1m75cm e vestindo 36. Para mim, aquilo era algo completamente distante e absurdo, mas era aquele padrão que tínhamos acesso. Hoje, graças a Deus que temos muito mais informação.

O POVO - Qual o seu conselho para as mulheres que ainda não aceitam o próprio corpo?

Andrea - O que eu sempre peço para as pessoas é para elas se fotografarem, se gostarem e contribuírem para o nosso banco de imagens de pessoas normais e reais. Assim, a gente consegue visualizar melhor. Inclusive, eu incentivo muito as minhas seguidoras e clientes a buscarem influência em pessoas que tenham o corpo parecido com o que elas têm, porque isso possibilita que elas se enxerguem melhor.

 

 

Confira os tamanhos de referência, da marca texana Calitta, conforme comercializado no Brasil:

  

 

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