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Será que sou uma pessoa gordofóbica?
Reportagem Especial

Será que sou uma pessoa gordofóbica?

O preconceito que as pessoas consideradas acima do peso sofrem na vida afetiva, social e profissional tem nome: gordofobia. Saiba como não passar adiante esse mau hábito que está enraizado na sociedade

Será que sou uma pessoa gordofóbica?

O preconceito que as pessoas consideradas acima do peso sofrem na vida afetiva, social e profissional tem nome: gordofobia. Saiba como não passar adiante esse mau hábito que está enraizado na sociedade
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O mais recente “Domingão com Huck”, exibido no dia 14 de novembro, foi cheio de significado para uma parcela considerável da população. Nele, o apresentador Luciano Huck pediu desculpas pelo comentário gordofóbico que fez na semana passada a respeito da cantora sertaneja Marília Mendonça, morta no início do mês. Huck também apresentou uma modelo plus size (modelo de medidas maiores) que será uma de suas assistentes de palco, a ativista de moda inclusiva Letícia Munniz. 

“Desde muito nova eu queria trabalhar com TV. Eu falo que meu único talento é falar. Mas eu sabia que eu tinha que ser como as mulheres da TV para eu conseguir chegar lá. Eu me maltratei muito, por 18 anos. Eu fiz coisas terríveis até chegar o momento em que eu falei: ‘Eu não aguento mais viver assim! Eu quero ser livre, eu quero ser feliz!’, Letícia falou para a plateia da atração dominical. “Virei influenciadora porque eu comecei a compartilhar meu processo de me libertar do padrão”, completou.

 

“Espero sinceramente que este episódio da gordofobia feita pelo Huck e a retratação dele, acompanhada de uma ação efetiva como essa, de contratar uma modelo como a Letícia, seja apenas o primeiro passo para uma grande transformação. E que as pessoas gordas, que não são minoria, em termos de números, possam se sentir mais representadas na televisão brasileira”, destaca a ativista paulista Fernanda Medeiros, de 27 anos.

 A ativista paulista Fernanda Medeiros (@eufernandalilian)(Foto: Acervo pessoal)
Foto: Acervo pessoal A ativista paulista Fernanda Medeiros (@eufernandalilian)

De fato, os números apontam que 26,8% dos brasileiros acima dos 21 anos foram considerados obesos, segundo os dados de 2019 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A pesquisa também mostra qual o percentual da população que não é considerada obesa, mas que tem sobrepeso ou excesso de peso. Ao todo, 60,3% da população de 18 anos ou mais de idade (96 milhões de pessoas) foram consideradas com excesso de peso, sendo 62,6% das mulheres e 57,5% dos homens.

Fernanda afirma que, nos últimos anos, as pessoas gordas têm buscado ser mais felizes, apesar do bombardeio diário para que elas cumpram os requisitos do que é ser uma pessoa “magra e saudável”, ainda que uma coisa não seja sinônimo da outra. Ela também critica os que sugerem que pessoas como ela, que é gorda e não se pune mais por isso, esteja “romantizando” a obesidade, condição que deveria, na opinião de muitos, ser tratada única e exclusivamente como se fosse uma doença. “É uma loucura essa acusação de que 'romantização' da obesidade, só porque estão vendo pessoas felizes e gordas. Nós não estamos vendendo a ideia de uma vida regada a refrigerante, má alimentação e sedentarismo. Existem sim pessoas assim, mas pra ter essa vida, não precisa ser uma pessoa gorda”, ressalta.

 

Malu Jimenez é professora doutora em Estudos de Cultura Contemporânea pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), pós-doutoranda em Psicossociologia na Universidade Federal do Rrio de Janeiro (UFRJ), palestrante e autora do livro “Lute como uma gorda: gordofobia, resistências e ativismos”, fruto da pesquisa de doutorado que virou livro e teve a 1ª edição esgotada — a publicação é considerada a única que tem a gordofobia como tema principal. A obra se dedica a desvendar o universo gordo na contemporaneidade e como esses corpos são concebidos institucionalmente, além de citar casos e exemplos de como as mulheres gordas aceitam ou resistem à gordofobia.

A filósofa também é idealizadora do projeto Lute como uma gorda, que tem como objetivo levar para além dos espaços acadêmicos a reflexão sobre a estigmatização do corpo gordo feminino em sociedade e as suas consequências. Malu estuda a gordofobia desde 2014 e atualmente está analisando no pós-doutorado a gordofobia médica e a patologização dos corpos gordos.

A filósofa e ativista Malu Jimenez(Foto: JUQRZ / Divulgação)
Foto: JUQRZ / Divulgação A filósofa e ativista Malu Jimenez

“Achei necessário estudar esse fenômeno porque o que está acontecendo na maioria dos consultórios é a associação dos corpos gordos à doença. Questiono na pesquisa o IMC (padrão para avaliar o grau de sobrepeso e obesidade que é calculado dividindo o peso pela altura ao quadrado), que é utilizado para associar o corpo gordo à doença e o magro à saúde, sendo que a gordofobia é um estigma estrutural, ou seja, está na forma como a sociedade se organiza”, destaca.

“O discurso gordofóbico é desrespeitoso, cruel e violento. Basta ver os comentários, notícias e falas de anônimos e gente da mídia logo após a morte da Marília Mendonça, que foi alvo do preconceito e da ignorância mesmo depois de morta. Um ícone do sertanejo e uma profissional celebrada da música, a cantora foi lembrada tantas vezes mais porque foi gorda do que por causa da história dela como cantora, e isso é um absurdo”, conclui.

 

 

Cinco frases e expressões gordofóbicas para tirar do seu vocabulário

Pode ser sem querer, mas muitas das frases que são faladas no dia a dia podem ser consideradas gordofóbicas. Para não cometer erros e não parecer uma pessoa preconceituosa, é importante escutar, conversar e ler sobre o assunto, a fim de rever o seu vocabulário e entender de forma completa o que cada frase pode significar.

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