Muitas das grandes redes de supermercado que operam hoje surgiram como mercearias (ou, mesmo, bodegas) de bairro, nas quais o dono conhecia, pessoalmente, a maioria dos clientes. No Brasil, o primeiro estabelecimento do tipo foi inaugurado há menos de 70 anos, mais precisamente na cidade de São José dos Campos (SP), em 1953.
Atualmente, ao mesmo tempo em que essas empresas estão nos aplicativos de celular, inauguram lojas físicas gigantescas com uma série de espaços anexos prestando serviços que vão da padaria à venda de eletrodomésticos. Com a pandemia de Covid-19, tendências que vinham se desenrolando de forma muito gradual nesse segmento foram aceleradas.
O número de consumidores que adquiriram produtos de supermercado por meio do comércio eletrônico no Brasil, por exemplo, saltou de 2% para 15% de 2017 para cá, segundo estudo realizado pela Associação Paulista de Supermercados (Apas).
O presidente da Associação Cearense de Supermercados (Acesu), Nidovando Pinheiro, ressalta que com a tecnologia, o consumidor tem na palma da mão várias lojas ao mesmo tempo, com várias informações de produtos, de forma de pagamento, de tudo.
A especialista em inovação, marketing e varejo, Marília Marinho, lembra que, no Ceará, embora os supermercados não tenham fechado durante a pandemia, eles passaram a buscar mais fortemente, nesse período, a utilizar o comércio eletrônico como canal de vendas.
“Esses serviços não estavam ainda refinados e passaram a ser realmente uma opção que o próprio consumidor demandou. O supermercado tinha um aplicativo, mas tinha ali um cliente que queria comprar pelo WhatsApp. Outro já preferia usar plataformas consolidadas como o Ifood ou o Rappi. Então, na verdade, houve uma ampliação de serviços que os supermercados já estavam começando a disponibilizar antes”, destacou.
Para a administradora, durante a pandemia, essas novas formas de atendimento dos supermercados tiveram um papel crucial.
"Idosos, gestantes pessoas de grupos de risco para a Covid-19 não tinham outra opção naquele momento. Foi muito benéfico para a sociedade, como um todo, perceber que o supermercado, apesar de aberto fisicamente e com alta demanda, não se fechou para esse consumidor que não podia ir até lá"
Além da aposta nos canais online, os supermercados também têm investido fortemente em diversificação, quer seja no porte dos estabelecimentos como no tipo de serviço oferecido.
“Temos visto lojas de atacarejo surgindo com mais força, mas a gente vê lojas de bairro fazendo um trabalho, que envolve a comunidade, e se destacando com serviços de entregas, banco 24 horas, recebimento de contas. Então, o segmento vem agregando serviços e o cliente quando vai ao supermercado já quer resolver tudo onde vai fazer compras”, observa Nidovando.
Assim como ele, Marília também frisa o fortalecimento do modelo de lojas menores, sem que isso signifique o esvaziamento do formato de hipermercado, de forte inspiração norte-americana.
“Esse modelo resiste, principalmente na região Nordeste, tem um público específico, mas não é o que está se expandindo com mais velocidade atualmente. A gente vê que agora os bairros passam a contar com supermercados, como já vinham contando com farmácias. Eles passam a ter uma vizinhança mais próxima e agregar mais serviços”, enfatiza.
“Eu vejo muito caminhar nessa direção até pela questão do crescimento das cidades, da dificuldade de locomoção e da conveniência. Essa tem sido uma palavra muito forte no segmento, com uma busca muito forte do consumidor por tentar resolver o mais rapidamente possível, aquilo que ele necessita”, explica a especialista.
Nas lojas menores, contudo, exige-se uma gestão bem profissional. "Por quê? Porque elas têm espaços reduzidos e necessitam, consequentemente, de um mix de produtos reduzidos que atenda ao que o seu consumidor busca”, avalia Marília. (Colaborou Laura Beatriz)
O Ceará, além de também experimentar as transformações pelas quais passam o segmento de supermercados no Brasil e no mundo, passa por um momento de expansão, com a consolidação das grandes redes varejistas locais, mas também com a atração de grandes grupos vindos de fora do Estado.
“Em 2020, tivemos o cenário do segmento de supermercado com venda aquecida por conta do lockdown, mas em 2021 isso não se repetiu na mesma proporção, por conta de vários fatores, como a questão do auxílio, que teve redução; reajustes de combustível, muitos produtos tiveram alterações de preço. Ainda assim, tivemos um ano com mais de 100 lojas abertas."
Em 2022, a expectativa é de muitas inaugurações também. Talvez até superando 100 novas lojas. "E para o ano de 2023, ficamos na perspectiva de ter uma concentração de estabilidade”, projeta o presidente da Acesu, Nidovando Pinheiro.
Sobre essas movimentações, ele acrescenta que grandes redes têm buscado o Estado. "Aqui temos boas lojas regionais, mas o mercado é aberto. O Grupo Mateus, por exemplo, está vindo aí."
Inclusive, existem muito rumores sobre compras que ele possa fazer. "Mas a gente sabe que vai abrir outras lojas aqui, não sei se com a mesma facilidade que tiveram no Maranhão, porque as redes daqui são muito fortes e as associações também, mas estamos aqui para recebê-lo e desejar que todos possam ter sua clientela e seu faturamento para manter o porte dos postos de trabalho.”
O presidente da Acesu acrescenta que o segmento dos supermercados também acelerou o processo de associativismo localmente.
“As associações das redes, com certeza, são um destaque aqui do Ceará, porque elas se reúnem com vários varejistas e formam um modelo onde se tem uma compra bem forte. O Estado tem hoje mais de 20 associações de supermercado e isso tem sido muito importante, principalmente, para que o pequeno varejista possa ter um poder de negociação maior, quanto às taxas de serviços, entre outros aspectos”, cita.
O presidente dos Mercadinhos São Luiz, Severino Ramalho, 62, explica que o empreendimento tem recebido restaurantes, principalmente nas lojas novas. “Devemos ter umas sete ou oito unidades com restaurantes. É uma grande tendência de cada vez mais vendermos comida pronta.”
A comida pronta vai estar disponível para o consumidor fazer a refeição dentro do mercadinho, mas também com a opção de levar para casa. “É um serviço a mais que a gente presta para o nosso cliente ganhar tempo.”
Ramalho diz ainda que hoje a praticidade é buscada por todos e a estratégia é sempre atender as necessidades do cliente. “Nossa área de delivery tem aumentado bastante também, temos crescido muito tanto com o aplicativo quanto com novos parceiros.” (Laura Beatriz)
Uma forte característica do Grupo Mateus é a oferta de diferentes serviços e produtos, segundo Marcelo Korber, 33, responsável pelas relações com investidores na empresa. O principal formato da loja é o alimentar, mas possuem também lojas de eletro que, muitas vezes, funcionam até dentro do varejo alimentar.
“Todas as nossas unidades têm restaurante, açougue, padaria, peixaria, setor de hortifrúti e setor de frios. É uma linha que a gente pode chamar de serviços, dentro do varejo alimentar, bastante completa”. Marcelo pontua que essa é uma característica que o Grupo carrega já há um bom tempo e é um grande diferencial competitivo para o atacarejo, trazendo um nível de serviço mais alto.
Para ele, esse modelo de operação nas unidades da empresa se mostra muito acertado. “Usamos também alguns ‘dispositivos’ fora da loja, normalmente no estacionamento. Um deles se chama Boteco Gelado, mais uma forma de adicionar serviço, oferecendo cerveja gelada e alguns outros gêneros de bebidas destiladas.”
“Além disso temos o ‘Mix Mais’, que é a colocação de produtos como ferramentaria, agrícolas, de jardinagem, para pets e automotivos, tudo aquilo que tem um bom giro e que também tem um atendimento interessante de demanda”, complementa.
Marcelo observa ainda que a oferta desses serviços diferenciados é uma estratégia de mercado para criar um diferencial em relação à concorrência, já que no varejo alimentar o formato que mais cresce é o atacarejo. “Esse formato tem grande espaço para crescer na região Nordeste. Isso é o que a gente enxerga e é o que a gente quer explorar.” (Laura Beatriz)
Para Alexandre Pinheiro, 43, diretor-executivo comercial e de marketing do Supermercado Pinheiro, as lojas além de serem bem estruturadas e organizadas, oferecem uma grande variedade de produtos. “Hoje temos algumas sessões que são destaque no mercado. É o caso do nosso Fruta, Legume e Verdura. São frutas frescas e da estação”.
O diretor pontua ainda que a mercearia localizada nas unidades dos supermercados é um dos diferenciais da empresa. “Com adega e produtos saudáveis, uma das sessões que mais atraem os clientes é a parte da gastronomia. Temos uma excelente variedade de pães e de salgados, além de self-service desde o café da manhã até o jantar, com um cardápio variado durante todo o dia”, complementa.
Alexandre observa que o investimento no setor de gastronomia dentro dos supermercados, assim como o oferecimento de diferentes serviços, é uma tendência e estratégia de mercado no segmento.
“O cliente do ‘Bom vizinho’ sabe que a qualquer momento pode ir à loja e ter uma refeição pronta, da melhor maneira possível. Ele tem a segurança de que se não conseguir fazer alguma refeição em casa, pode ir na nossa loja. Inclusive com a pandemia precisamos nos adaptar, não somente fazer com que o cliente comece na própria loja, mas também proporcionar opções para ele levar a comida pronta para casa.”
Com dezesseis lojas em oito municípios do Ceará, sendo oito lojas em Fortaleza e oito no Interior, os serviços citados por Alexandre estão em todas as unidades. “Na Capital temos uma central gastronômica que produz as comidas e envia para as lojas. E, no Interior, para ter uma comida mais fresquinha, cada loja produz a sua”, finaliza. (Laura Beatriz)
Em Fortaleza, a primeira unidade a ser convertida para o modelo G7 foi a loja Pão de Açúcar Náutico, em novembro de 2021. Além dela, a rede possui mais doze lojas na capital cearense.
E quem passa pelo Extra Hiper do Shopping Iguatemi já vê o recado: "Esta loja continua aberta. Em breve um novo Pão de Açúcar para você". A nova unidade vai contemplar o conceito G7 também.
Entre as novidades do modelo estão o layout das lojas, que foram totalmente reformulados para ajustar o fluxo de compras. Um exemplo são as categorias de padaria e frios, e açougue e peixaria, que foram realocadas para otimizar a compra de produtos em combinação.
O novo layout agrupa também os produtos da seção de frutas, legumes e verduras (FVL) em gôndolas mais baixas para ampliar o campo de visão do cliente.
As unidades do Grupo também contam com o Espaço Café, incorporando pratos rápidos, como tapioca, sopas e omeletes para comer no próprio local, além dos salgados, doces e cafés do menu. Além da adega com vinhos e cervejas, padaria e outros serviços. (Laura Beatriz)
A estratégia atual da marca Supermercados Guará, como outras redes também já fazem, é apostar em abrir em shoppings. No primeiro semestre deste ano vão inaugurar unidade no Iguatemi, em Fortaleza, no Ceará, e para 2023 vão se fixar no Terrazzo Eusébio, outro centro comercial.
Érica Catunda, analista de Marketing da empresa, diz que se o cliente sair de casa para fazer "outras coisas", o Guará vai estar lá. Mas não basta se fazer presente, ela diz que há o investimento na experiência de consumo e que a pandemia acelerou tendências.
Ela explica que apesar de as pessoas gostarem mesmo é de ir ao supermercado escolher o produto, o supermercado trabalha com diversidade na venda. Possuem aplicativo próprio desde 2019, mas a pandemia intensificou seu uso, bem como do Pick up Store. Sistema em que você compra a distância e dá somente uma "passadinha lá" para buscar.
"É um espaço totalmente reservado onde tem locks (cadeados) com códigos e você abre a porta com o celular. Somente tem na loja da Aldeota, onde tem o maior fluxo, mas o seu uso se intensificou com a pandemia. Com a retomada gradual, não se perdeu. As pessoas voltam do trabalho e já passam lá e pegam as compras feitas pelo celular nos armários. É um espaço que ajudou muito a questão do distanciamento social na pandemia", explica.
Já na entrega em casa com a compra pelo aplicativo, o Guará acelerou o tempo. "Os clientes gostam de receber o quanto antes", diz. Então há prazos que vão de 1 hora, quando são 15 produtos, 2 horas, até 60 itens, e a opções de agendar o recebimento para até três dias.
O uso maior da tecnologia permitiu ainda o Guará a se aprofundar mais no perfil do consumidor. No aplicativo, a idade dos usuários é em grande parte de pessoas de 35 a 50 anos. "O idoso mesmo procurou instalar e quando não sabe mexer liga e a gente ensina", detalha Érica.
Ela diz que a rede de supermercados caminha agora para ter cashback, e hoje já tem um sistema de descontos com o programa Sou + Guará. Se você é cadastrado, recebe desconto na hora do pagamento no caixa. E o sistema da empresa utiliza inteligência de dados para personalizar as ofertas, para que não ocorra, por exemplo, abatimento de preço ou envio de SMS com aviso sobre carne para um vegano. (Beatriz Cavalcante)