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Por que o Ocidente está em guerra contra o chinês TikTok
Reportagem Especial

Por que o Ocidente está em guerra contra o chinês TikTok

Os legisladores, tanto republicanos quanto democratas, acusam o TikTok de ser usado como uma ferramenta para que Pequim espione e manipule os americanos

Por que o Ocidente está em guerra contra o chinês TikTok

Os legisladores, tanto republicanos quanto democratas, acusam o TikTok de ser usado como uma ferramenta para que Pequim espione e manipule os americanos
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O TikTok perdeu uma batalha em Washington e sua proibição nos Estados Unidos é cada vez mais provável, embora o governo vá precisar de cautela para banir a popular plataforma, que tem 150 milhões de usuários no país.

Shou Zi Chew, CEO do TikTok, aplicativo de vídeos curtos que pertence à empresa chinesa ByteDance, foi submetido a um interrogatório incomumente intenso por parte de congressistas. Ele enfrentou enxurrada de ataques de um poderoso comitê do Congresso americano no último dia 23 de março, sem realmente ter a chance de responder.

O Tik Tok, aplicativo que se popularizou durante a pandemia, é um dos que podem ser banidos nos EUA.(Foto: Beatriz Boblitz)
Foto: Beatriz Boblitz O Tik Tok, aplicativo que se popularizou durante a pandemia, é um dos que podem ser banidos nos EUA.

Os legisladores, tanto republicanos quanto democratas, acusam o TikTok de ser usado como uma ferramenta para que Pequim espione e manipule os americanos. 

As restrições ao aplicativo, enquanto isso, alastram-se por países ocidentais do Hemisfério Norte. O mais recente foi a Suécia, que proibiu que integrantes do Exército usem TikTok em dispositivos móveis profissionais, por razões de segurança. A mesma medida foi aplicada a servidores públicos de França, Reino Unido, Bélgica, Canadá e das principais instituições da União Europeia (UE), a Comissão Europeia, Executivo da UE, o Conselho Europeu, que representa os países, e o Parlamento Europeu.

O caminho também foi adotado pelos parlamentos de Dinamarca e Nova Zelândia. Nos Países Baixos, o governo fez recomendação aos funcionários públicos e trabalha em "solução estrutural" para configurar os telefones profissionais dos funcionários para que apenas aplicativos ou funcionalidades previamente autorizados possam ser instalados e usados.

Na Itália, o problema do TikTok vai além da privacidade e vigilância. A polícia abriu investigação pela veiculação de vídeos de jovens fazendo automutilação. 

Made with Flourish

Rumo à proibição

 

A audiência no Comitê de Energia e Comércio da Câmara dos Representantes terminou em um "desastre" para o TikTok, opinou Dan Yves, da Webdush Securities, que espera um aumento de "pedidos de legisladores e da Casa Branca para proibir o TikTok nos Estados Unidos se o aplicativo não se desvincular da ByteDance".

"O TikTok provavelmente estará proibido até o fim do ano" nos Estados Unidos, a menos que a ByteDance encontre um comprador americano em "três a seis meses", avaliou.

Karine Jean-Pierre, porta-voz da Casa Branca, falou sobre "as negociações em andamento com a ByteDance" e explicou que o governo Joe Biden "apoia firmemente" o Restrict Act, um dos projetos de lei que pedem a proibição do TikTok no país.

O texto, debatido pelos senadores este mês, dá ao Departamento de Comércio novos poderes para proibir tecnologias que ameaçam a segurança nacional.

Chew, ex-banqueiro formado em Harvard, de 40 anos, tentou em vão por horas desativar uma ameaça existencial para o TikTok. O aplicativo tenta sobreviver a um ultimato da Casa Branca, que exige que a ByteDance o venda para evitar seu banimento nos Estados Unidos.

CEO do TikTok, Shou Zi Chew, em duro depoimento no Comitê de Energia e Comércio da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos(Foto: OLIVIER DOULIERY / AFP)
Foto: OLIVIER DOULIERY / AFP CEO do TikTok, Shou Zi Chew, em duro depoimento no Comitê de Energia e Comércio da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos

Na sessão do Comitê de Energia e Comércio da Câmara dos Representantes, os legisladores não deram trégua a Chew e, com frequência, lhe negaram a possibilidade de se estender em suas respostas ou de promover a popularidade mundial da plataforma entre os jovens.


 

"Erro de cálculo"

Na manhã de 24 de março, o jornal New York Post colocou o debate sobre a plataforma no Congresso na primeira página, com uma foto dos pais de um adolescente morto, presentes na audiência da véspera.

Os pais processaram recentemente o TikTok, acusando a plataforma de bombardear o filho com vídeos sobre suicídio.

"Sua empresa destruiu a vida desses pais", acusou o congressista Gus Bilirakis, dirigindo-se a Shou Zi Chew.

"São americanos sobre os quais o Partido Comunista Chinês pode coletar informações confidenciais para, no fim, controlar o que veem, ouvem e acreditam" Cathy McMorris Rodgers, presidente do Comitê de Energia e Comércio da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos, sobre os 150 milhões de usuários americanos do TikTok

Reclamações contra o TikTok

Confidencialidade dos dados do usuário, moderação de conteúdo liderada pelo Partido Comunista Chinês (PCC), desinformação, vícios, desafios perigosos, riscos à saúde mental e física de crianças e adolescentes: a lista de reclamações dos legisladores sobre o TikTok é longa.

A plataforma tentou antecipar-se à pressão política e midiática lançando uma campanha, antes da audiência, destacando a popularidade nos Estados Unidos, como um "erro de cálculo" que "reforçou o argumento" dos congressistas, segundo a analista Jasmine Enberg, da Insider Intelligence.

Os 150 milhões de usuários do TikTok nos Estados Unidos "são americanos sobre os quais o PCC pode coletar informações confidenciais para, no fim, controlar o que veem, ouvem e acreditam", disse Cathy McMorris Rodgers, presidente do comitê.

O TikTok também convocou os influenciadores a defender o serviço que os fez famosos.

Mas, "destacar o impacto econômico do TikTok também é uma estratégia complicada, já que seu crescimento ocorreu em parte às custas de empresas americanas como a Meta. Instagram e YouTube seriam os primeiros beneficiários" de uma proibição nos EUA.

Em um momento da audiência no comitê na Câmara dos Representantes, Chew se viu obrigado a reconhecer que alguns dados pessoais dos americanos ainda estavam sujeitos à lei chinesa, mas insistiu que isso mudará em breve.

CEO do TikTok, Shou Zi Chew, ao se preparar para depor perante o Comitê de Energia e Comércio da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos(Foto: TASOS KATOPODIS / Getty Images via AFP)
Foto: TASOS KATOPODIS / Getty Images via AFP CEO do TikTok, Shou Zi Chew, ao se preparar para depor perante o Comitê de Energia e Comércio da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos

Cálculo político

Os Estados Unidos já tentaram americanizar ou banir o TikTok: o ex-presidente Donald Trump (2017-2021), irritado principalmente com o conteúdo dos usuários que o ridicularizam, procurou banir o aplicativo em nome da segurança nacional, sem sucesso.

Desta vez, as fortes tensões atuais com a China unem republicanos e democratas. Mas ONGs de defesa da liberdade, alguns legisladores e muitos especialistas argumentam que o TikTok apresenta essencialmente os mesmos problemas do Facebook, Twitter e outras redes sociais.

"Do ponto de vista da segurança, certamente poderíamos encontrar uma solução que minimizasse os riscos percebidos", disse Michael Daniel, diretor da Cyber Threat Alliance, uma ONG de segurança cibernética.

"Mas isso seria satisfatório para os políticos? Essa é outra questão", acrescentou.

Uma proibição seria um ato sem precedentes para uma empresa de mídia nos Estados Unidos e deixaria sem acesso ao TikTok 150 milhões de usuários mensais no país, sobretudo jovens.

Uma proibição significaria que "os Estados Unidos, uma democracia, estão tomando medidas que restringem a capacidade dos jovens eleitores (usuários do TikTok) de se expressar e ganhar a vida", analisou Sarah Kreps, professora de direito e diretora do Tech Policy Institute na Universidade de Cornell.

"Em função dos custos de tal decisão e seus benefícios limitados, os legisladores devem primeiro considerar leis eficazes de proteção de dados e estratégias de controle de risco, como o 'Projeto Texas'", promessa proposta pelo TikTok para proteger os dados americanos.

"Estamos comprometidos em fornecer uma plataforma segura e inclusiva", tuitou Vanessa Pappas, diretora de operações do TikTok. "É uma pena que a conversa de hoje pareça emanar da xenofobia".

 

 

Por que o medo do TikTok

Uma lei chinesa de 2017 obriga as empresas locais a entregarem às autoridades, mediante pedido, dados pessoais que tenham a ver com questões de segurança nacional.

Como a plataforma tem milhões de usuários, isso pode constituir um enorme banco de dados para o governo da China sobre a sociedade de vários países. Poderia dessa forma controlar o que as pessoas assistem e influenciar como pensam e se posicionam.

Sob pressão nos Estados Unidos, a China declarou, no dia seguinte à audiência em Washington, que não está pedindo às suas empresas que entreguem dados coletados no exterior. 

Pequim "nunca pediu e não pedirá a empresas ou indivíduos que coletem ou entreguem dados de países estrangeiros de uma forma que viole a lei local", disse Mao Ning, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, em entrevista coletiva.

Manifestação em defesa do TikTok em frente ao Capitólio, enquanto CEO da plataforma chinesa, Shou Zi Chew, prestava depoimento(Foto: BRENDAN SMIALOWSKI / AFP)
Foto: BRENDAN SMIALOWSKI / AFP Manifestação em defesa do TikTok em frente ao Capitólio, enquanto CEO da plataforma chinesa, Shou Zi Chew, prestava depoimento

 

 

Reação do TikTok

O TikTok iniciou um grande esforço para acalmar as preocupações das instituições e líderes da União Europeia (UE) sobre a segurança e integridade dos dados de seus usuários.

A empresa anunciou que já havia começado a trabalhar, com uma empresa de segurança europeia, para supervisionar e verificar como os dados dos usuários da UE são tratados.

As informações coletadas serão armazenadas a partir de 2023 em centros na Irlanda e na Noruega.

O TikTok afirmou que este projeto também reduziria o acesso de seus próprios empregados às informações dos usuários.

O vice-presidente de políticas públicas do TikTok para a Europa, Theo Bertram, evitou identificar a companhia associada, durante uma chamada de vídeo. Entretanto, ele informou que o projeto tem um custo de 1,2 bilhão de euros (cerca de R$ 6,5 bilhões). A cooperação começou há seis meses, acrescentou.

O aplicativo já possui um acordo parecido nos Estados Unidos com um gigante do mundo digital, para manter os dados dos usuários americanos no país.

Como parte da tentativa de acalmar as preocupações, o consultor jurídico do TikTok, Erich Andersen, iniciou uma série de visitas a várias capitais europeias. 

 

A batalha do TikTok nos EUA em 3 tópicos 

 

 

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