O Ceará tem convivido nos últimos anos com índices assustadores de criminalidade, mas, ainda assim, continua dispondo de algumas “ilhas” que se mantêm distante dos conflitos de facções, execuções, latrocínios, feminicídios etc. Quase todos são municípios de população pequena, no Interior do Estado e com alta porcentagem de população rural.
Melhor exemplo disso é Baixio, terceiro menor município do Ceará, com 5.704 habitantes, conforme o último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Localizado na região Centro-Sul do Estado, já na divisa com a Paraíba, a 420 km de Fortaleza, Baixio não teve nenhum homicídio registrado no município desde 2013, ano em que a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Estado (SSPDS) passou a disponibilizar as estatísticas de criminalidade em seu site.
A SSPDS chegou a computar um homicídio como tendo ocorrido em Baixio, mas o crime que vitimou Samuel Victor da Silva Queiroz, em 26 de outubro de 2017, ocorreu, na verdade, em Barbalha, no Cariri Cearense. A informação foi retificada pela própria pasta.
Moradores de Baixio ouvidos por O POVO confirmam a tranquilidade do Município. A fisioterapeuta Giselle Ramalho, de 26 anos, que mora em Baixio desde que nasceu, diz que, sobre homicídios, os moradores só escutam falar pela televisão. Ela descreve que a violência em Baixio é "praticamente inexistente" e os moradores podem sentar-se nas calçadas e praças para conversar e se encontrar despreocupadamente. “Aqui é mais comum as pessoas morrerem por velhice ou doença”, diz.
Opinião semelhante tem a professora Isabelle Holanda, de 38 anos, que também nasceu e cresceu em Baixio. Ela destaca que, na cidade, as pessoas são “muito próximas umas às outras”, até pela população ser pequena. “Todo mundo tem uma certa familiaridade, sempre tem alguém que é primo do outro, amigo do outro, conhecido… Talvez, isso faça com que não tenha tanto caso de assassinatos”, diz Isabelle.
A professora ressalta, porém, que a estrutura de segurança pública do Município não é tão ampla, sobretudo, em relação ao efetivo. Isso a faz temer que, caso um dia venha a precisar, a população não conte com um suporte adequado. Baixio não tem delegacia. A unidade mais próxima da Polícia Civil fica em Ipaumirim, município vizinho e com população de 12.083habitantes, segundo o Censo.
Ao lado de Baixio, 31 municípios cearenses não registraram homicídios neste ano. Na lista, estão alguns dos municípios de menor população do Estado, como Granjeiro e Potiretama. Mas também estão municípios mais populosos, a exemplo de Lavras da Mangabeira e Ipu, este o maior da lista, com 41.081 habitantes, ainda segundo o IBGE.
O titular da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) Samuel Elânio comentou, em entrevista a O POVO, que, “historicamente”, há municípios no Estado que não registram assassinatos. Entretanto, neste ano, entraram na lista dos “sem homicídios”, cidades que, nos últimos anos, haviam registrado vários casos, como São Luís do Curu, Redenção e Uruburetama, destacou o secretário. (A entrevista foi feita no dia 14 de julho; de lá para cá, Redenção e São Luís do Curu registraram homicídios, um cada) Para ele, esse dado mostra que o trabalho “direcionado” das forças de segurança em grupos criminosos e homicidas têm surtido efeito.
“A gente se baseia nos levantamentos que a Supesp (Superintendência de Pesquisa e Estratégia de Segurança Pública) faz dos número de CVLIs (Crimes Violentos Letais Intencionais), nas prisões por tráfico e, a partir disso, há esse direcionamento”, afirma Elânio. “Temos núcleos de investigação de organizações criminosas e homicídios e, quando a gente percebe esse aumento, fazemos investigação do tráfico de drogas, de possíveis integrantes de organização criminosa que cometeram homicídios”.
Sobre a expansão do efetivo de agentes de segurança, o secretário diz aguardar os concursos que estão atualmente em andamento tanto na Polícia Civil, quanto na Militar. Ele fala sobre a determinação vigente no Governo do Estado para ampliar o atendimento a mulheres vítima de violência, o que inclui mais delegacias de Defesa da Mulher.
Cumprida essa meta, afirma, os agentes serão distribuídos em municípios que, porventura, precisem. “Mesmo com o aumento do efetivo, é preciso ver a viabilidade de se lotar em municípios que não tenham demanda. Melhor seria direcionar para municípios que tenham mais circulação de pessoas e criminalidade, se não, acaba ficando um efetivo subutilizado”. (Colaborou Gabriela Almeida)
Altaneira, Antonina do Norte, Ararendá, Araripe, Arneiroz, Baixio, Catarina, Catunda, Choró, Deputado Irapuan Pinheiro, Granjeiro, Groaíras, Hidrolândia, Ipaumirim, Ipu, Iracema, Itaiçaba, Jardim, Jati, Lavras da Mangabeira, Martinópole, Moraújo, Ocara, Palhano, Pires Ferreira, Porteiras, Potengi, Potiretama, Quiterianópolis, Uruburetama e Uruoca.
Se, de um lado, há 31 municípios que não registraram homicídios neste ano, por outro, há municípios cujos índices de violência assustam em 2023. Entre os “micromunicípios” — aqueles que têm menos de 20 mil habitantes —, destaca-se, mais uma vez, São João do Jaguaribe. Foram oito homicídios no primeiro semestre deste ano no município do Vale do Jaguaribe, que tem 5.855 habitantes, conforme o IBGE.
Com isso, a taxa semestral de assassinatos no Município é de 136,63 homicídios por 100 mil habitantes, a maior do Estado. São João do Jaguaribe já havia sido destaque nacional por essa taxa em 2022 quando o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) apontou que o municípios era o mais violento do Brasil. De 2019 a 2021, a taxa de homicídios no município foi de 224 por 100 mil habitantes, a maior entre os 5.568 municípios do País.
Na faixa de municípios que vão de 20 a 100 mil habitantes, chama a atenção os casos de Guaiúba e Pacatuba, que são vizinhos na Região Metropolitana de Fortaleza. Guaiúba registrou 15 homicídios, o que, diante de uma população de 24.217, representa uma taxa de 61,93 assassinatos por 100 mil habitantes. Já Pacatuba teve 30 assassinatos, uma proporção de 40,62 assassinatos por 100 mil habitantes, já que a população da cidade é de 81.238 pessoas.
Nos municípios com mais de 100 mil habitantes, aquele que apresenta a maior taxa de assassinatos é Maranguape (Região Metropolitana de Fortaleza), com 37,10 mortes por 100 mil habitantes — foram 38 assassinatos no ano. Fortaleza ficou com a segunda menor taxa de homicídios entre os municípios com mais de 100 mil habitantes (14,12 por 100 mil) — apenas Juazeiro do Norte tem índice menor (13 por 100 mil).
Levando em conta os homicídios ocorridos de 2013 a 2023, é possível ver alguns municípios que também se destacaram no ranking de assassinatos de 2023 — seja positivamente, seja negativamente. Entre os municípios com maior taxa de assassinatos desde 2013 no Estado estão, por exemplo, São João do Jaguaribe (líder do ranking, com uma taxa de 1673 homicídios por 100 mil habitantes no decênio) e Ibicuitinga (com uma taxa de 938,76 homicídios por 100 mil habitantes), ambos municípios que estão entre os mais violentos de 2023. Entre os menos violentos, repetem-se em ambos os rankings Baixio, Moraújo, Granjeiro, Alcântaras e Pires Ferreira.