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Novo jeito de ser pai: como o envolvimento ativo ressignifica o papel paterno
Reportagem Especial

Novo jeito de ser pai: como o envolvimento ativo ressignifica o papel paterno

Símbolo paterno se dá por mais presença dos homens no cuidado com os filhos e se desvincula da imagem do pai provedor, o que impacta positivamente no desenvolvimento de crianças e adolescentes

Novo jeito de ser pai: como o envolvimento ativo ressignifica o papel paterno

Símbolo paterno se dá por mais presença dos homens no cuidado com os filhos e se desvincula da imagem do pai provedor, o que impacta positivamente no desenvolvimento de crianças e adolescentes
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A figura do pai vem mudando com o passar do tempo, e essa nova construção da paternidade ativa se funda nos vínculos de afeto, no qual o símbolo paterno se dá por mais presença no cuidado com os filhos. É dessa figura que a sociedade começa a perceber pequenos passos de uma ressignificação da paternidade que vem se desvinculando da imagem do pai provedor.

O novo modelo tem como principal aspecto o desejo de que o envolvimento do cuidar dos filhos seja maior do que o simples fato de cumprir um papel. O processo leva ao conforto e à confiança na relação com as crianças ou adolescentes. Para os adultos, esse contato presente pode ser transformado em uma rede de apoio.

No entanto, como esse processo de maior aproximação ou envolvimento de pais com seus filhos, de fato, começou a dar pequenos passos? O psicoterapeuta Gustavo Martins explica que o processo dessas relações vem sendo caracterizado de forma cultural e por meio das transformações sociais.

“Nós temos conseguido ver que alguns homens têm se sensibilizado e prestado mais atenção de que eles precisam desempenhar um papel ativo na criação dos filhos, seja no cuidado básico diário, brincando e não auxiliando a mãe a cuidar, mas que ele também tenha um lugar afetivo no desenvolvimento daquela criança”, avalia o especialista.

Ainda segundo Gustavo, outro fator desse processo pode estar inserido na redução de preconceitos sociais, como estereótipos de que homens não podem demonstrar afeto, emoções e se mostrar vulneráveis. “Nós temos diferentes movimentos sociais que reconstroem essa visão de paternidade e que facilitam a construção de um outro processo mental nos homens. Tem sido uma evolução, apesar de pequena”, pontua.

Para a especialista em terapia analítica comportamental Beatriz Sampaio, a sociedade precisa entender, atualmente, que pai não é apenas um provedor, seja de necessidades ambientais ou naturais, mas, sim, um personagem e um símbolo importante no desenvolvimento das habilidades socioemocionais de uma criança.

A especialista avalia também que a sociedade tinha uma ideia muito diferente do que era ser pai e, hoje, com o tempo, os novos perfis de pais vêm crescendo gradativamente, o que interfere de forma positiva na criação dos filhos. “Quanto mais cuidadores dedicados e amorosos uma criança tem, mais possibilidade de um desenvolvimento pleno seguro e afetuoso essa criança vai ter”, explica.

A presença ativa de um pai também interfere em filhos adultos. Eles também podem sentir a necessidade da aproximação da figura paterna. Apesar de ser um processo diferente quando se trata de crianças e adolescentes, quando há a presença de um pai ativo nessa fase adulta, os efeitos podem estar relacionados, principalmente, à construção de uma rede de apoio da figura paterna com os filhos já crescidos.

“A gente fala muito sobre cuidado na vida infantil porque nós, como seres humanos, somos a espécie que mais precisa de cuidado no início da vida. Mas, na vida adulta, a gente também precisa de cuidado. É nesse momento em que vamos encontrar não só um um cuidado para as necessidades, mas também uma parceria de pessoas com quem a gente pode dividir e com quem a gente pode dar e contar suporte”, esclarece Beatriz.

A relação mais pura que já tive

“A relação mais pura que já tive”, é assim que o estudante Breno Rocha, 24, define sua relação com o filho Zion Ares Rocha, de 1 ano e dez meses. Para o estudante, estar presente na vida do filho é, além de um desejo, a sua principal prioridade. Ele entende que a presença ativa na relação vai impactar positivamente no desenvolvimento do filho.

“Eu sempre tive consciência do papel presente de um pai, mesmo não tendo um presente na minha vida, mas sabia o quanto isso seria importante para o meu filho, principalmente na fase da primeira infância. Sempre pensei que eu ia poder ser o melhor amigo do meu filho, dando conselhos e sendo uma rede de apoio”, comenta Breno.

No processo de construção da paternidade ativa, o estudante nunca entendeu o que era, de fato, essa presença, em virtude da ausência do próprio pai. Segundo ele, apesar de entender a situação, o afastamento afetuoso paterno fez com que ele tentasse fazer diferente na relação com Zion. “Amor nunca é demais, e acho que isso é um dos motivos também de eu ser assim com meu filho”, reflete.

No cotidiano, Breno cita que as atividades com o filho vão de brincar até os cuidados básicos, como limpar e alimentar. No começo, o estudante teve receio no primeiro contato com Zion. “Quando ele nasceu, achei que o vínculo que a gente ia ter ia ser um pouco difícil para estabelecer, mas eu me esforçava. Sempre buscando estar junto, brincando e estimulando ele em diversas atividades, como no toque e no olhar, assim como é hoje”, destaca.

Na compreensão de especialistas, os pais, assim como qualquer outra figura de cuidador, devem criar uma rede de apoio que demonstre disposição a ouvir, acreditar e proteger as crianças e adolescentes. A especialista em terapia analítica comportamental infantil Beatriz Sampaio, explica que essa rede impacta diretamente na saúde da harmonia da família, principalmente no desenvolvimento da criança.

“Quando a gente tem uma presença de um cuidador mais ativo com uma postura carinhosa e interessada, esse ambiente se torna mais propício para o aprendizado, não só de habilidade socioemocionais, mas de habilidades educacionais e cognitivas. Essa criança vai conseguir desempenhar muito melhor todos os aprendizados que ela tem pela frente”, explica Beatriz.

Ser pai presente é uma obrigação

O jornalista Marcelo Bloc, 42, compartilha que o envolvimento ativo com os filhos, João Bloc, 10 anos, e Luiza Bloc, 5 anos, não é uma qualidade da figura paterna, mas sim uma obrigação. “Ser pai presente é uma necessidade e uma obrigação. Estou sempre presente na vida dos meus filhos, levando e buscando na escola, na terapia, esportes, inglês e no que for preciso eu estou presente”, destaca.

Para ele, algumas iniciativas do desejo de estar presente partiram desde o nascimento dos filhos, como em atividades que o jornalista sabia que tinha que aprender, como dar banho e trocar fraldas. “Desde o começo, já procurava ajudar a dar banho, trocar roupas e ajudar à noite, pegando quando acordava e levando para colocar no peito da sua mãe”, lembra.

Ele acredita que uma boa relação vai ajudar no desenvolvimento das crianças. Por estar mais presente em casa, acaba também tendo uma troca maior com os filhos. “Com João, já começou a tirar dúvidas de crianças maiores, por exemplo. A Luiza é neuroatípica, o tempo é diferente, mas eu me vejo presente em todos os momentos”, diz.

Marcelo conta que, apesar de a presença materna dele ser mais forte em casa, isso não foi motivo para estar menos presente na vida de João e Luiza. Ele revela que, no momento em que soube que ia ser pai, teve a consciência de que queria construir uma relação ativa com seus filhos.

“Quero ter uma relação muito próxima e de confiança”, lembra o jornalista. Para ele, a paternidade é sua maior aventura e traz os melhores momentos da sua vida. “Eu vivo muito feliz, por mais que tenha dificuldades e desafios, a gente tem muitas compensações de amor e de carinho”, comenta.

Apesar de perceber uma pequena mudança de novos perfis de pais, o cenário da paternidade ainda preocupa. O quão essencial é a participação da figura paterna no crescimento do filho para evitar, principalmente, problemas de saúde? De acordo com a mestre em psicologia pela Universidade de Fortaleza (Unifor) e psicanalista Thais Leite, pais que abandonam seus filhos deixam marcas emocionais que podem percorrer uma vida inteira.

“Essa criança vai viver em um ambiente carregado emocionalmente, com uma mãe ou um pai sobrecarregado, com muito afazeres, por exemplo. Vai existir a não vinculação com pai, onde a criança vai ver a figura do pai como algo negativo. Essas marcas vão impactar em outros relacionamentos dos filhos, como em amizades e relacionamentos amorosos”, analisa.

Essa ausência dos pais ainda traz fortes impactos na vida das crianças, como no surgimento de doenças na infância. A falta da figura, segundo a psicóloga Beatriz Sampaio, pode acarretar problemas de baixa autoestima, ansiedade, insegurança, problemas de agressividade, diminuição do rendimento escolar e problemas com obesidade.

Fonte: Cartilha para Pais: Como Exercer uma Paternidade Ativa, divulgada em 2018 pelo Ministério da Saúde, e psicoterapeuta Gustavo Martins.

Infográfico: Mirla Nobre.

Reconhecimento da paternidade é passo importante, mas cenário preocupa

Para além da presença ativa do pai com os filhos no dia a dia, um dos primeiros passos para construir essa relação é fazer o registro após o nascimento. O cenário desse reconhecimento, no entanto, ainda preocupa.

No Ceará, mais de 69 mil crianças nasceram nos primeiros sete meses deste ano. Desse total, apenas 603 foram registradas com o nome do pai e 5,1 mil não receberam o registro paterno, sendo registradas apenas com o nome da mãe.

No balanço dos últimos dois anos, o cenário não teve evoluções. Em 2021, foram 120 mil nascimentos, sendo 438 crianças com paternidade reconhecida e 8 mil com pais ausentes. No ano seguinte, o Estado teve 114 mil nascimentos de crianças, com mil sendo reconhecidas e oito mil que receberam apenas o nome da mãe.

Os dados estão registrados no Portal da Transparência do Registro Civil, administrada pela Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil). A plataforma reúne informações referentes aos nascimentos, casamentos e óbitos registrados nos cartórios de Registro Civil do Brasil.

Registro de paternidade no Ceará

Made with Flourish

O cenário no Ceará sobre registro de paternidade reforça um drama brasileiro: temos muitos homens tornando-se pais, mas poucos exercendo uma paternidade ativa. O psicoterapeuta Gustavo Martins avalia que esse cenário é preocupante porque está associado ao abandono paterno e o abandono afetivo.

“São pais que estão casados, mas, muitas vezes, estão apenas ali. Eles não têm uma dedicação de tempo, de brincadeira e não possuem memórias afetivas positivas”, comenta Gustavo. O especialista destaca que ainda é preciso evoluir em todo o processo da paternidade ativa, começando pelo reconhecimento dos filhos. 

O procedimento de reconhecimento pode ser feito diretamente em qualquer Cartório de Registro Civil. De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), quando a mãe vai realizar o reconhecimento de paternidade e seu filho tiver menos de 18 anos, é preciso comparecer ao cartório levando a certidão de nascimento do filho.

Quando a iniciativa do reconhecimento é do próprio pai, basta que ele compareça ao cartório com a cópia da certidão de nascimento do filho, sendo necessária a aprovação da mãe ou do próprio filho, caso ele seja maior de idade. Nos casos do filho ser menor de idade, é necessário aprovação da mãe.

Ainda segundo o CNJ, quando o pai não quer reconhecer o filho, a mãe pode fazer a indicação do suposto pai no próprio cartório, que comunicará aos órgãos responsáveis para que seja iniciado o processo de investigação de paternidade.

De acordo com a Lei nº 8.560/1992, que regula investigação de paternidade dos filhos gerados fora do casamento, a investigação de paternidade oficiosa é o processo administrativo que envolve todas as etapas de apuração das informações fornecidas pela mãe em relação ao suposto pai.

A investigação é um procedimento obrigatório, uma iniciativa do Estado que assegura a todos o direito à paternidade, mesmo que apenas em forma de documento, na certidão ou registro de nascimento.

Cartórios em Fortaleza

Cartório Botelho - Registro Civil das Pessoas Naturais 5ª Zona
Onde: Avenida Desembargador Moreira, 1000 B - Aldeota 

Cartório do Registro Civil da 3ª Zona
Onde: Rua Castro e Silva, 121 Lj 97-101 - Centro 

Cartorio do Registro Civil das Pessoas Naturais do Distrito de Parangaba-Ceara
Onde: Rua Sete de Setembro, 160 - Parangaba

Cartório do Registro Civil de Messejana
Onde: Rua Coronel Joaquim Bezerra, 79 - Messejana 

Cartório do Registro Civil de Mondubim
Onde: Rua Clemente Silva,251A - Mondubim 

Cartorio Registro Civil da 4ª Zona
Onde: Rua Castro e Silva Nº 38 - Centro

Fortaleza Primeiro Oficio de Registro Civil
Onde: Rua Major Facundo, 705 - Centro 

Jaime Araripe Serviço Registral - Registro Civil das Pessoas Naturais 
Onde: Avenida Mister Hull, 4965 - Antonio Bezerra 

Registro Civil da 2ª Zona de Fortaleza
Onde: Rua Major Facundo 709 - Centro 

Registro Civil Distrito Mucuripe
Onde: Avenida Senador Virgilio Tavora 318 Lj 01 - Meireles


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