Ter uma boa memória é fundamental para o cotidiano, principalmente no trabalho ou na vida acadêmica. Contudo, no avançar da idade, muitos pessoas podem apresentar sintomas de declínio cognitivo e o comprometimento da memória. Especialistas apontam que a escolha de alimentos específicos pode impactar positivamente a função cognitiva, ao prevenir doenças neurodegenerativas e contribuir para a qualidade de vida.
Certo declínio cognitivo com o processo de envelhecimento é natural, de acordo com Adalberto Studart Neto, do Departamento Científico de Neurologia Cognitiva e do Envelhecimento da Academia Brasileira de Neurologia (ABN). “Obviamente, o desempenho de memória de uma pessoa de 80 anos não é igual ao de uma pessoa de 50, que também não é igual ao de uma pessoa de 20”, expõe.
Segundo o especialista, assim como qualquer órgão, o cérebro passa por alterações anatômicas, como a redução do volume cerebral. Há também uma diminuição das conexões entre os neurônios. “O cérebro tende a reduzir de tamanho, sofrendo atrofia. Os neurônios, que são as células que formam o cérebro, têm conexões que possibilitam a execução de diversas funções mentais, e esse processo também resulta na redução dessas conexões”, comenta o médico.
Envelhecimento também envolve a diminuição das conexões entre os neurônios. No entanto, conforme explica Adalberto Studart, é crucial que esse efeito não interfira na capacidade do indivíduo de realizar suas atividades cotidianas. “Esse declínio não deve atrapalhar na capacidade do indivíduo de ser independente e autônomo. Trata-se de uma condição patológica e que pode até levar ao que chamamos popularmente de demência ou às doenças vasculares cerebrais. Isso não é considerado um envelhecimento normal”, frisa.
O especialista da ABN destaca que diabetes, hipertensão, tabagismo, além de um estilo de vida sedentário, são considerados fatores de risco para doenças vasculares cerebrais.
A nutricionista Simone Fiebrantz Pinto, especialista em gerontologia e presidente do Departamento de Gerontologia da Sociedade Brasileira de Geriatria (SBGG), aponta que a maneira como comemos está diretamente ligada à nossa função cognitiva. Alguns alimentos, inclusive, têm o poder de aprimorar a memória e até mesmo prevenir distúrbios neurológicos.
“O cérebro necessita de uma variedade de nutrientes para se manter de maneira otimizada. Portanto, destacam-se o ômega-3, que é essencial para a saúde cerebral, e antioxidantes. Além disso, a vitamina C desempenha um papel relevante. Outro componente vital são as vitaminas do complexo B (B-12, B-6, B-2). Esses nutrientes desempenham um papel fundamental na produção de neurotransmissores”, informa.
Quando o assunto é saúde cognitiva, o grupo das
“Consumir castanhas diariamente também contribui para a redução do risco de depressão. Isso é especialmente relevante para uma população bastante suscetível à essa doença, principalmente agora após a pandemia, que tornou os idosos ainda mais vulneráveis”, pontua a nutricionista.
Embora no campo da botânica o amendoim não seja considerado uma oleaginosa, mas uma leguminosa, também é recomendado o consumo regular. Ele figura na lista desse tipo de alimento por causa da composição nutricional bem similar a das sementes.
As oleaginosas possuem um tipo de gordura considerada saudável para o cérebro. O órgão utiliza essa gordura como fonte de energia, o que contribui para a diminuição do processo inflamatório. “As oleaginosas também contém ômega 3 e micronutrientes importantes, como selênio e magnésio. Essas sementes também são ricas em zinco, o qual contribui para a imunidade. Pensando nos idosos, esse micronutriente é especialmente importante, pois a imunidade deles é mais vulnerável em comparação com a dos adultos", acrescenta Simone Pinto.
Apesar de garantir ótimos efeitos nos idosos, o consumo de oleaginosas também é recomendado para pessoas mais jovens como uma medida preventiva. “Por exemplo, se um adulto já apresenta hipertensão, glicose elevada ou triglicerídeos alterados, essas sementes podem ser incorporadas à alimentação diária para auxiliar no controle desses fatores de risco, que podem interferir na função cognitiva. Dessa forma, ao longo do tempo, o indivíduo poderá beneficiar-se com uma melhora na saúde cerebral”, pontua a nutricionista Simone Pinto.
Mas é necessário cautela, com uma pequena quantidade ao longo do dia já conseguimos atender às nossas necessidades desses nutrientes, segundo Simone. A castanha-do-Pará, rica em selênio, requer cuidado especial. “Em excesso e durante muitos dias seguidos, o selênio pode se tornar tóxico e causar alterações cardiovasculares. Por isso não se deve ingerir cinco ou oito por dia. A quantidade de duas castanhas por dia já é suficiente”, explica.
As oleaginosas também são ricas em gorduras que, apesar de fazerem bem para nosso organismo, são calóricas. Assim, em grande quantidade podem contribuir para o ganho de peso.
“Por serem ricas em óleos, também soltam o intestino. Isso é bom para quem tem prisão de ventre, por exemplo, mas ruim para as pessoas que têm o intestino mais solto, pois correm o risco de desenvolver diarreias e, por consequência, podem ter prejuízos na absorção de outras vitaminas e minerais devido ao aumento da frequência intestinal.”
Há mais de quatro anos, as sementes e oleaginosas fazem parte da rotina alimentar de Maria Assunção dos Santos, moradora da Barra do Ceará, em Fortaleza. Tudo começou ao realizar exames de rotina, quando ela foi informada de que estava com um nível de colesterol acima do recomendado. Por isso, recorreu a um profissional de nutrição. “Ela explicou pra mim a importância de comer bem e mudou totalmente a minha alimentação. Hoje eu tenho 66 anos e eu evito muito frituras e doces. Mas, em especial, consumo com frequência a castanha-do-Pará e a do caju.”
Maria explica que, para ela, a adição das sementes no dia a dia foi algo simples. “Geralmente gosto de comer castanhas durante o dia, umas quatro ou cinco, como um lanche no meio da manhã. É bom para acalmar a fome e não recorrer a outras ‘besteiras’ quando estamos com pressa”, relata.
Outros alimentos que fazem parte da dieta dela são as sementes integrais, como a farinha de linhaça, chia e gergelim. “É impressionante como isso melhorou minha saúde. Eu estava com o colesterol alto e hoje normalizei, também não tenho a diabetes descontrolada. Todo ano eu volto ao médico para fazer meu check-up. Mesmo com a melhora, não deixo de manter a dieta”, explica.
Apesar de ser aposentada, dona Maria diz que continua a trabalhar como cuidadora de idosos. “Minha memória, ainda bem, está ótima e consigo fazer tudo! Espero que continue assim por muito mais tempo”, ela ressalta, rindo.
A alimentação natural e saudável tem sido uma constante na vida de Alzira Alice Rocha Pereira, moradora do bairro Cocó, também em Fortaleza. Médica aposentada, ela explica que cresceu consumindo arroz, feijão e comidas mais simples, porém nutritivas. “Eu já cheguei a procurar um nutricionista. Na época, meu IMC estava normal, mas queria perder um pouco de gordura, especialmente após a menopausa, quando é comum ganhar peso na região abdominal. Também tenho hipotireoidismo e triglicerídeos elevados, que é uma predisposição familiar.”
Alzira relata que, quando foi se consultar com a nutricionista, a profissional mostrou pesquisas sobre os benefícios de boas gorduras na saúde vascular e também na melhoria da memória. “Eu uso suplementos de ômega-3, que é essencial para a saúde cerebral, e também a nutricionista incorporou alimentos ricos nesse nutriente, como castanhas e nozes em minha dieta diária”, diz.
Apesar de aposentada aos 60 anos, Alzira continua com seus trabalhos na área da medicina. Ela conta que, ao longo dos anos, adotou uma abordagem mais saudável em relação à alimentação, mas que não segue uma dieta restritiva. “Cozinhar em casa me permitiu criar refeições saborosas e nutritivas. Além disso, compartilho essa abordagem com minha família, especialmente com a minha filha e também com a minha mãe, que é idosa e também está se tratando de um câncer”, conta.
Ao receber a equipe do O POVO em casa, Alzira preparou uma receita que costuma preparar para ela e sua família: um bolo de nozes e frutas vermelhas. “Minha mãe é diabética, então quando faço um bolo para ela, uso aveia, nozes, castanhas e frutas para adoçar, como tâmaras. Além de gostoso, fica bem saudável e todo mundo ama!”, conclui.
De acordo com o nutricionista cearense Rangel Filho, apesar de terem o preço mais elevado, o consumo das oleaginosas em menor quantidade pode facilitar em incluir esses alimentos na rotina. “Podemos consumir um mix de castanhas em um lanche prático, juntando com frutas secas para complementar a alimentação com uma combinação equilibrada de carboidratos e fibras. Também podemos combinar com banana e outras frutas.”
O nutricionista explica que a criatividade desempenha um papel fundamental na exploração das formas de utilização de determinados produtos na nutrição. Assim, uma sugestão é utilizar as oleaginosas como ingredientes na preparação de bolos e outras receitas. “Isso é uma das leis fundamentais da nutrição: a importância da variedade. Nenhum alimento possui todos os nutrientes essenciais sozinho. Isso significa que é essencial incluir as castanhas, mas também nutrientes provenientes de alimentos como arroz, feijão, carne e frango em dias alternados. Dessa forma, garantimos uma complementação adequada.”
Além do mix de castanhas, de acordo com Rangel Filho, outra opção para baratear a aquisição das oleaginosas é procurar pelas sementes vendidas em pedaços ou em forma de farinhas. Procurar estabelecimentos que vendem a granel também pode ser uma solução mais acessível.
“Aqui no Ceará temos frutas ricas em vitamina C e, portanto, indicadas para melhorar a saúde cognitiva, como a acerola e o caju. Também moramos em uma região de sol abundante, que ativa a vitamina D. Além disso, em relação a outros estados, a castanha de caju é mais barata e pode ser incluída na rotina”, aponta.
Um estudo realizado pela Universidade de Maastricht, na Holanda, divulgado em julho de 2023, informa que consumir com frequência oleaginosas pode afetar beneficamente a função vascular cerebral de idosos. A pesquisa avaliou 28 voluntários, que foram orientados a manter uma alimentação saudável, além de consumir 60 gramas de oleaginosas no período de 16 semanas, sendo:
Como resultado, foi avaliado que o consumo de oleaginosas a longo prazo aumentou significativamente o fluxo sanguíneo cerebral e nas regiões do cérebro associadas ao desempenho cognitivo. Isso se deve a nutrientes encontrados nas oleaginosas, como os polifenóis, que aumentam a produção de óxido nítrico no corpo e otimizam a circulação sanguínea no cérebro.