Da mocinha Luana de “O Rei do Gado” (1996) à vilã Flora de “A Favorita” (2009), Patrícia Pillar é figura marcante nas produções audiovisuais brasileiras. Com mais de quatro décadas de carreira, a atriz vem construindo, ao longo dos anos, carreira sólida na teledramaturgia. Nesta quinta-feira, 11 de janeiro, a artista brasiliense celebrou 60 anos de vida e, em entrevista do Vida&Arte, reflete sobre sua e analisa as novas perspectivas do consumo de telenovelas no Brasil.
O POVO - Você começou sua carreira no teatro com a peça “Os Banhos” em 1981, na adolescência. O que mais mudou em você pessoalmente dessa sua estreia profissional até os dias de hoje?
Patrícia Pillar - Logo quando comecei a estudar teatro, criamos um grupo em que montávamos nossos próprios projetos, baseados em autores como V. Maiakovski, Bertold Brecht e Fernando Arrabal. Montando esses espetáculos, aprendi a trabalhar em grupo e a participar de todas as etapas do processo: discutir cada ponto do roteiro, ajudar na bilheteria, martelar pregos no cenário e fazer costuras no figurino. Assim continuo até hoje. Gosto da troca, do ensaio, da preparação. Gosto de fazer projetos que tenham um conteúdo a ser discutido. Gosto de questões ligadas à nossa história e ao comportamento humano e de poder refletir sobre a realidade e o futuro.
OP - Quais foram, nesses 43 anos de carreira, os personagens que mais te marcaram da sua carreira televisiva? E os mais desafiadores? Por quê?
Patrícia - A televisão me proporcionou grandes desafios. Alguns pontos foram muito marcantes pra mim, como pessoa e como artista. O “Rei do Gado”, como todos os textos de Benedito Ruy Barbosa, fala das histórias do nosso Brasil. Homens e mulheres fortes que ajudaram a construir esse país. A minha personagem, Luana, era uma cortadora de cana. Uma menina sem família que é obrigada a construir seu próprio destino, com toda sua força. Essa novela levou à mesa das famílias brasileiras um tema tabu, que até hoje não conseguimos resolver: a reforma agrária. A série “O Rebu” também foi um desafio grande, pois ela se passava em praticamente 24 horas. Uma festa, um assassinato e uma investigação dentro de um único dia. E a Flora, da novela “A Favorita”, foi um dos personagens de maior complexidade que interpretei. Ela era insanamente livre. Portanto lhe cabia qualquer tom, da perversidade ao humor ou da ternura fingida à extrema violência.
OP - Quando se trabalha como ator/atriz e se tem muita repercussão nacional, que é o seu caso, as pessoas acabam lembrando de você por personagens que você fez. Além de Patrícia, por quais outros nomes você já responde na rua?
Patrícia - Que lindo você mencionar a questão dos nomes! Já fui Ana, Teresa, Isabel, Emerenciana, Luana, Angela, Flora, Constância, Cássia… É uma sensação muito gostosa a de ter deixado todas elas passarem por mim. Ficaram marcas e aprendizados que até hoje carrego comigo. Posso dizer que Luana e Flora são as mais lembradas pelo público nas ruas até hoje.
OP - Você acredita que as novas redes sociais e os streamings mudaram as formas de consumo da produção audiovisual brasileira? Se sim, sentiu que isso mudou os rumos ou impactou sua carreira?
Patrícia - Sim, mudaram bastante. Atualmente, temos o conforto de poder assistir à programação que quisermos, quando e onde quisermos. Isso trouxe benefícios, mas também perdemos algo muito valioso: saber que todos estão assistindo simultaneamente àquele capítulo ou àquela cena da mesma novela. Produções como “Roque Santeiro”, “Vale Tudo” e “Avenida Brasil” pararam o país, como um jogo da Copa do Mundo, e isso era lindo! Agora está cada vez mais improvável de voltar a acontecer. Por isso, o encontro ao vivo no Teatro tem sido tão prestigiado no período pós-pandemia, com salas lotadas e peças maravilhosas em cartaz. O cinema tem se ressentido dessa realidade, mas ir ao cinema, para mim, ainda é “a melhor diversão”.
OP - Que conselho você daria a jovens que estão começando sua vida nas artes cênicas e se inspiram em sua trajetória? Você fazia algo de diferente?
Patrícia - Não faria nada diferente, pois tudo é caminho, tudo é aprendizado. Diria que o melhor da profissão é contar nossas histórias e construir personagens que possam, de alguma maneira, tocar as pessoas e melhorar o mundo. E se isso servir de inspiração para seguir a carreira, tende a ser um trajeto para uma grande realização; mas se for sucesso e dinheiro, talvez não seja a melhor escolha.
OP - Dos prêmios que você já ganhou, qual foi o mais emocionante de receber? O que ele representou naquele momento da sua vida?
Patrícia - Alguns prêmios me deram muita satisfação, pois eles são o reconhecimento de um trabalho sério. Prêmios como da APCA, Troféu Imprensa e Melhores do Ano são muito significativos para nós, artistas. Mas um prêmio que não ganhamos foi, talvez, o mais emocionante: concorremos ao Oscar de melhor filme estrangeiro com o filme “O Quatrilho”. Foi uma aventura e tanto!