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Câncer infantil: o diagnóstico precoce salva!
Reportagem Especial

Câncer infantil: o diagnóstico precoce salva!

O câncer infantil é a primeira causa de morte por doença em crianças, mas com o diagnóstico precoce a chance de cura chega a 70%.

Câncer infantil: o diagnóstico precoce salva!

O câncer infantil é a primeira causa de morte por doença em crianças, mas com o diagnóstico precoce a chance de cura chega a 70%.
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No Brasil, a primeira causa que leva alguém a óbito são os acidentes de trânsito, a segunda é o câncer. Mas quando falamos do público infantil, essa doença passa a ocupar o topo das principais causas de mortes desses pequenos. E essa é uma realidade cada vez mais presente.

A estimativa do Instituto Nacional do Câncer (Inca) é que, no período 2023/2025, teremos uma média anual de 7.930 novos casos de câncer em crianças e jovens de 0 a 18 anos. Em Fortaleza, o Hospital Infantil Albert Sabin (Hias) realizou 230 diagnósticos positivos só em 2023.

 

Os sintomas de câncer mais comuns em crianças e adolescentes

Mas, por outro lado, quando o assunto é cura os resultados são mais esperançosos, podendo chegar hoje até a 70%. O Setembro Dourado deste 2024 veio alertando sobre a importância do diagnóstico precoce, visto que os sintomas podem se misturar aos das doenças e ferimentos típicos da infância.

A oncologista pediátrica Sandra Prazeres explica que os sintomas podem variar entre perda de peso inexplicada, febre persistente, cansaço excessivo, fraqueza, dores nos ossos ou articulações, dores de cabeça intensa ou persistentes, vômitos, inchaços, palidez, manchas roxas, aumento no volume abdominal e alterações na visão ou nos olhos.

 

Diagnóstico do Câncer Infantil

 

“Esses sinais não necessariamente indicam câncer, mas a presença persistente de qualquer um deles justifica uma consulta médica para uma avaliação mais detalhada. O diagnóstico precoce é essencial para aumentar as chances de cura”, alerta a doutora.

Leucemias — especialmente a leucemia linfoblástica aguda (LLA) —, tumores do sistema nervoso central (SNC) — como o meduloblastoma e os gliomas — e linfomas, incluindo linfoma de Hodgkin e linfoma não-Hodgkin, são os principais tipos de câncer que representam uma grande parte dos casos diagnosticados entre esses jovens.

 

As três neoplasias malignas mais frequentes em crianças

 

“O desenvolvimento de câncer em crianças, ao contrário dos adultos, não está geralmente associado a fatores de risco relacionados ao estilo de vida; mas sim a genéticos ou alterações ao acaso nas células em crescimento”, explica Sandra. Síndromes hereditárias, mutação genética espontânea, exposição a radiação e infecções virais são exemplos que contribuem para o surgimento dessas doenças.

“Infelizmente não há métodos eficazes e comprovados para prevenir o câncer infantil, mas, algumas medidas gerais de saúde podem ajudar, como evitar exposição desnecessária à radiação e manter as vacinações contra certas infecções em dia. O mais importante é diagnosticar precocemente e garantir o tratamento adequado”, destaca a oncologista.

 

Fatores que podem levar ao câncer infantil

 

 

 

Uma vida de constante mudança

Em 2020, com apenas um ano e oito meses, a pequena Maria Sophia recebia o seu primeiro diagnostico de câncer. O tumor era nos rins, um tipo bem raro que se manifestou aos oito meses com um inchaço na barriga. Nessa época, a mãe, Mayara Gonçalves, procurou um médico que lhe passou um remédio para verme. O tumor, entretanto, cresceu rapidamente e chegou a 20 cm.

Mayara Gonçalves e a sua filha Maria Sophia de 5 anos (Foto: Rafael Santana )
Foto: Rafael Santana Mayara Gonçalves e a sua filha Maria Sophia de 5 anos

“Eu morava no Paraná, e lá deixaram ela na fila de espera alegando que não tinha outro jeito, embora o caso dela fosse urgente. Vim para Fortaleza, fiquei na casa de alguns familiares e ela fez a quimioterapia e a retirada de um rim, ela estava finalmente curada”, relata a mãe, recordando que só veio receber uma ligação do hospital de seu estado natal dois meses depois.

O que a dona de casa não esperava era que a sua filha ainda iria vivenciar mais desafios. “Já tinha se passado três anos, quando em dezembro do ano passado o tumor voltou novamente para o mesmo lugar. Nessa época, eu estava grávida de oito meses, então o susto foi maior ainda, principalmente por eu saber como o tratamento era longo”, relembra a mãe.

A oncologista pediátrica Sandra Prazeres alerta que, com o diagnóstico precoce, o paciente tem melhores chances de tratamento; além de uma diminuição dos efeitos colaterais, uma menor dispersão da doença e a redução do impacto emocional e financeira para o indivíduo e sua família.

“O tratamento depende do tipo específico de câncer, do estágio da doença e da idade da criança. As crianças, comumente, são tratadas com uma combinação de terapias, que podem incluir quimioterapia,  cirurgias, radioterapia,  imunoterapia e o transplante de medula óssea (Transplante de Células-tronco)”, afirma.

 

O tratamento do câncer infantil

Importância do Diagnóstico Precoce

 

A especialista destaca que a eficácia dos tratamentos depende do tipo de câncer e da resposta a essas terapias. “Devido aos efeitos colaterais que podem surgir a longo prazo (crescimento, desenvolvimento cognitivo, fertilidade, etc.), é crucial o acompanhamento contínuo das crianças que sobrevivem para tratar e prevenir complicações futuras”, atesta.

Mayara Gonçalves deu à luz ao seu filho  em Fortaleza. Atualmente, a pequena Maria Sophia está com 5 anos e está na fase final dos exames, pronta para seguir em frente. “Viu alguma coisa diferente, vá atrás! Com o diagnóstico rápido, o tratamento é mais rápido também. É difícil, eu sei, mas a chance da melhorar de seu filho é muito maior”, finaliza.

 

 

A saúde mental e os desafios rotineiros

Era o terceiro dia de janeiro, a grande maioria das pessoas ainda se encontrava viajando e curtindo os festejos do ano novo. Entre elas estava a adolescente de 16 anos Bruna Stefany, que começou a sentir uma dor muito forte de repente, chegando a imaginar que poderia ser apendicite, mas não foi encontrado nada pelo médico local. 

Bruna Stefany e sua mãe Geane dos Santos(Foto: Arquivo Pessoal )
Foto: Arquivo Pessoal Bruna Stefany e sua mãe Geane dos Santos

De volta a Fortaleza, ela procurou outro hospital, agora especializado em oncologia pediátrica, e logo foi identificado um possível teratoma. Feito a cirurgia, a jovem se viu em outra situação difícil: a de escutar que ia precisar ficar lá pelo fato do tumor ser maligno.

“Era um teratoma de ovário e o tumor se espalhou para o fígado, fazendo minha barriga inchar muito e deixando eu sem andar. Eu estava pesando 100 kg só de líquido. Passei dias na UTI, e o meu cabelo começou logo a cair. Fiz algumas cirurgias, com algumas complicações e hemorragias, além de até ter convulsões”, diz Bruna.

A estudante relata que acabou se afastando de muita gente por conta da nova realidade. Patrick Camêlo, psicológo do Centro Pediátrico do Câncer e com atuação na Associação Peter Pan — Uma ONG que acolhe jovens diagnosticados oncologicamente — explica que existem estrategias focadas na saúde mental dos pacientes, que visam humanizar esse período de recuperação.

“Quando o paciente recebe o diagnóstico há uma mudança muito grande em sua vida. Ele perde a chance de ir para escola, de conviver com outros jovens, e fica cercado de cuidados que muitas vezes o impede de se desenvolver plenamente. Isso acaba acarretando uma série de consequências para a saúde mental, tanto no campo da socialização, como o afetivo”, afirma Patrick.

 

Probabilidades de cura por tipo de câncer infantil

 

O psicólogo pontua que esses fatores têm o risco de contribuir no desenvolvimento de transtornos mentais. “O nosso trabalho de humanização é dado desde o momento em que o diagnóstico é comunicado, com uma escuta empática e uma tentativa de diminuir um pouco à ansiedade e gerar um senso de esperança, tanto aos responsáveis como para esses jovens”, conclui.

Geane dos Santos, mãe de Bruna Stefany, relata que enfrenta diversos desafios no processo de recuperação de Bruna, como a questão de transporte, por exemplo. “Somos pais, e tem dias que não temos R$ 1 no bolso para comprar nem uma água, imagine para trazer a criança para fazer o tratamento todo dia. Já tive que pedir esmola para levar ela ao hospital”, desabafa. Segundo ela, o benefício recebido não cobre todos os custos. 

 


Ações solidarias que salvam vidas

Para além do diagnóstico precoce e do zelo com saúde mental, a solidariedade e o acolhimento são fundamentais para a recuperação desses pequenos. Foi com essa missão que a Irmã Conceição, apelidada de “Irmã Sorriso”, se dedica por três décadas ao acolhimento de crianças com diagnóstico de câncer.

Irmã Conceição se dedica há mais de três décadas a essa causa (Foto: Rafael Santana Rafael Santana )
Foto: Rafael Santana Rafael Santana Irmã Conceição se dedica há mais de três décadas a essa causa

Atualmente, ela é presidente do Lar Amigos de Jesus, um lugar sem fins lucrativos que acolhe pacientes e suas famílias que estão pela capital cearense fazendo tratamento oncológico. O espaço, que tem parceira direta com o Hospital Infantil Albert Sabin, a associação Peter Pan e o Centro Pediátrico do Câncer, e oferece apoio e assistência social a essas pessoas.

Atividades pedagógicas, terapia ocupacional, festividades, lazer, alimentação e transporte ao hospital são exemplos de práticas que ocorrem no lar. “São 47 voluntários, 30 funcionários e cinco religiosas que estão aqui para humanizar esse processo, com amor, fé e carinho. Para além disso, o nosso trabalho é oferecer superação e transformação a essas famílias”, afirma a Irmã.

O lar já recebeu diversas premiações e é referência no Nordeste. Só em 2023, foram acolhidas mais de dois mil e trezentas crianças e adolescentes. “Existe esse elo de solidariedade, essa rede de apoio com a sociedade. É uma ajuda que acontece de lá para cá, através das doações e ações que ajudam a manter o lugar funcionando”, destaca a presidente do lar.

Esse impacto positivo foi sentido por Cleylton Goveia, agricultor e pai da Natacha Souza, atualmente de 19 anos. Ela foi diagnosticada com câncer quando tinha 15 anos, e depois disso sua vida mudou completamente. Tudo começou com dores de cabeças, febre e vômitos, e com a procura de investigar a razão dos sintomas foi descoberto um nódulo na cabeça.

Natacha Souza, atualmente com 19 anos, no Lar Amigos de Jesus (Foto: Rafael Santana )
Foto: Rafael Santana Natacha Souza, atualmente com 19 anos, no Lar Amigos de Jesus

Residentes em Redenção, interior do Ceará, o pai relata que para salvar a sua filha, ele teve que vir para Fortaleza. Natasha foi submetida a um tratamento de muito risco, com muitas cirurgias e chegando a contrair infecções. Por diversas vezes se viu entre a vida e a morte. Ficou em coma por alguns meses, não conseguia mais andar, falar e se alimentar pela boca.

“Quando chegamos aqui, a gente nem sabia que existia o Lar. O acolhimento deles me ajudou muito durante o tratamento. Me apaguei na fé que tinha em Deus e no apoio que recebi para ter forças para prosseguir”, relembra Cleylton. Natasha segue se recuperando positivamente e vem a capital somente para o acompanhamento medico, onde fica hospedada no Lar com a sua família.

No mesmo espaço se encontra Elisfabia Ximenes, mãe da Maria Geovanna de 5 anos, que já finalizou o tratamento e está pronta para voltar para casa. A pequena foi diagnosticada com um tumor no rim, e teve que sair de sua cidade — Guaraciaba do Norte — para o tratamento em Fortaleza.

“Aqui a recepção foi de grande ajuda, porque a gente fica em um estado vulnerável e de apreensividade, já que no decorrer do tratamento existem muitos altos e baixos. A troca de interação com quem trabalha aqui e o convívio com as outras mães, influencia positivamente no nosso psicológico”, relata Elisfabia.

Aceitação, tratamento, apoio, solidariedade e fé são os pilares fundamentais para a recuperação desses jovens, que desde muito cedo se veem superando desafios e lutando para continuar vivos. O diagnóstico precoce pode salvá-las, contribuindo esperançosamente em um novo amanhã para esses corações tão jovens.

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