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Gen-Z: como se tocam os nascidos da geração touch screen?
Reportagem Seriada

Gen-Z: como se tocam os nascidos da geração touch screen?

Casamento, cybersex, monogamia, assexualidade... são alguns dos diversos termos marcam uma geração que odeia definições, embora tenha várias, mas, que no fim, só tem uma regra: ser feliz
Episódio 2

Gen-Z: como se tocam os nascidos da geração touch screen?

Casamento, cybersex, monogamia, assexualidade... são alguns dos diversos termos marcam uma geração que odeia definições, embora tenha várias, mas, que no fim, só tem uma regra: ser feliz
Episódio 2
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Era depois da missa, na praça em frente à igreja, que o casal de Baby Boomers "Pessoas nascidas entre 1945 e 1960"  se encontrava e ia se entreolhando. O namoro que era um ato privado se conduziu para o mundo público, foi realocado,  mas o encontro entre as pessoas permanece. Os jovens da geração X "Pessoas nascidas entre 1960 e 1985"  conversavam nas portas da frente e dançavam nos salões de festas. Depois, eram os jovens da geração Y "Também chamado de Millennials, são aqueles nascidos de 1985 até 1995" que ocupavam as últimas poltronas do cinema e bebiam escondido dos pais. Porém, todos esses dates se condensaram em uma tela, onde a Geração Z namora.  

 

De qual geração você é? Jogue e veja se você pensa como um Gen-Z!

Se para a Geração X, estar com 25 anos significava casamento e trabalho, sustentar a casa e criar filhos, parte da Gen-Z revira os olhos para isso, uma vez que um grupo considerável de pessoas dentro dos Z vê os relacionamentos com pragmatismo. “Casamento só serve para os benefícios da lei”, afirma Clarissa Moraes, 19, que é assexual e sente dificuldades em se relacionar com outras pessoas.

Clarissa Moraes é estudante de Biotecnologia na Universidade Federal do Ceará(Foto: Acervo Pessoal)
Foto: Acervo Pessoal Clarissa Moraes é estudante de Biotecnologia na Universidade Federal do Ceará

A estudante de biotecnologia é assexual e heteroafetiva. Ela se atrai afetivamente por homens, mas não pensa em transar com eles. Para Clarissa, “a sociedade fala que você tem que gostar de sexo. Tudo envolve isso. Tem música sobre sexo, filme… É um pouquinho difícil”, narra. Para a jovem, achar e entender a sua forma de se relacionar tinha o objetivo de fazê-la se sentir menos estranha.

Na comunidade LGBTQIAPN+ existem diversos grupos que acabam por englobar diferentes tipos de expressões e orientações sexuais, inclusive a da jovem.

Clarissa afirma que só conseguiu o reconhecimento de sua sexualidade devido à comunidade Aroace "A abreviação usada para se referir a pessoas que se identificam como arromânticas e/ou assexuais. Representada pela letra A em LGBTQIAPN+." . O mestrando pela Universidade Estadual do Ceará (Uece) com estudos direcionados às temáticas de juventude, cultura e periferia, Lucas Costa, explica que toda sexualidade dissidente enfrenta um entendimento ainda muito precário na sociedade. Para o sociólogo, “todas as forças anti-sistêmicas de se relacionar exigem uma desconstrução permanente dos padrões impostos pela heteronormatividade”, define.

“As pessoas têm muita dificuldade de separar o sexo do amor em si, um pouco disso me deixa com medo. Eu não consigo a parte do sexo, não consigo me imaginar, não sinto nenhum tipo de ligação sexual”, explica Clarissa Moraes. Ao não se encaixar nos padrões previstos por outras gerações que alimentam a expectativa de casamento e sexo, Clarissa optou por sua livre expressão de gênero e sexualidade.

“A geração Z nasceu e conheceu um mundo radicalmente transformado pela tecnologia. Mas também dentro de outro contexto econômico, social e político. Isso faz com que tenhamos novas experiências sobre relacionamentos e tenhamos liberdades que se adaptem às demais necessidades da nossa geração”, explica o sociólogo Lucas Costa. O importante é estar “de boas” consigo mesmo.

 

 

Amor livre existe?

O “Amor só dura em liberdade”, a frase de Raul Seixas, que não era da Geração Z, explica como Daniel Pontes, 20, se sente com os seus relacionamentos. Daniel é monogâmico, só consegue ficar com uma pessoa por vez e acha que ser livre é fundamental. “Eu pensava em casamento como divisão de bens, algo construído socialmente, a cerimônia não me apetecia, eu achava um negócio bobo. Mas hoje vejo que representa união, fidelidade, amor acima de tudo”, percebe o estudante de Moda.

Daniel Pontes é estudante de Design – Moda na Universidade Federal do Ceará(Foto: Acervo Pessoal)
Foto: Acervo Pessoal Daniel Pontes é estudante de Design – Moda na Universidade Federal do Ceará

Mesmo não namorando, Daniel Pontes afirma que no próximo relacionamento irá buscar compartilhar momentos e criar memórias. “Tive um relacionamento no ensino médio, a gente não se conhecia bem e foi muito problemático. Ela gostava de coisas que eu não gostava. A pessoa precisa se conhecer para estabelecer limites”, relembra. Para o estudante, “minha linguagem do amor é tempo de qualidade”.

As ‘linguagens do amor’ foi um conceito criado pelo escritor estadunidense Gary Chapman, que trabalha com aconselhamento matrimonial há mais de 40 anos e é criador do best-seller “As cinco linguagens do amor” - marco para a Gen-Z. O livro ajuda a classificar e entender as formas de ser e de se relacionar no mundo.

Filósofo, Chapman explica que cada indivíduo tem sua forma de identificar, receber e dar amor. Em seu best-seller “As cinco linguagens do amor”, palavras de afirmação, tempo de qualidade, presentes, atos ou gestos e toque físico são as formas citadas. Chamado de “doutor casamento”, o escritor percorre diversos países a fim de desafiar casais a buscarem a construção de um relacionamento saudável e permanente, viaja, também, na cabeça dos jovens que tentam entender mais e melhor suas amizades amorosas.

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Clarissa Moraes é assexual, Daniel Pontes monogâmico. Já Gabriel Sobrinho, 21, tem uma relação semiaberta. O estudante de psicologia é casado há mais de três anos e, para ele, casamento é concretizar uma união. Segundo o estudante, dentro do seu casamento, relações com outras pessoas podem se desenvolver no âmbito dos afetos, mas, caso se tornarem físico, ele e seu parceiro englobariam a terceira pessoa ao encontro íntimo.

Esse contrato de bem-estar, que é assinado na relação, aparece como segredo do conforto individual e coletivo de muitos da Geração Z. “Se a gente conversar, conseguimos consertar todos nossos problemas, podemos fazer um acordo e todo mundo pode ficar bem” afirma, Gabriel. O sociólogo Lucas Costa declara que a geração Z é uma geração de ruptura. “Isso significa que não temos compromisso com as imposições que conduziram a vida antes de nós conhecermos o mundo”, comenta o mestrando.

Na busca por conforto e experimentação, diferentes formas de se relacionar surgem. Nos anos 80, bem antes da geração Z pensar em transar poderia envolver ligações telefônicas eróticas. Serviço era realizado por telefonistas que ganhavam dinheiro para impressionar quem quisesse ouvir e imaginar o prazer do sexo. Com os avanços tecnológicos, a Gen-Z já nasceu inserida no mundo digital e uma simples chamada de voz ganha um acessório indispensável: a imagem. E o sexo que acontecia apenas por ligação, agora é em vídeo - o cybersex.

A psicóloga Luísa Freire, que atende a pacientes da geração Z, alerta, no entanto, que a prática pode ser  uma forma de se proteger. “Quando se está no off-line, você não lida com questões do corpo e autoimagem, que precisam ser desenvolvidas. No virtual, você pula essa etapa”. Com a pandemia, se comunicar presencialmente se tornou um desafio. As tecnologias que, supostamente, viriam para estreitar os laços presenciais, os substituíram. A psicóloga afirma ainda que mesmo com o isolamento social, os jovens entenderam que não era preciso estar em festa para socializar, e descobriram isso por meio da tecnologia.

 

 

>> Ponto de Vista

Demissexualidade: a jornada entre o autoconhecimento e o respeito sexual

Por Renato Hogilon M. Romualdo*

A imagem que nós construímos como seres humanos é instrumento de constantes modificações o tempo todo. O desenvolvimento individual é consequência das diversas experiências físicas e emocionais que o convívio em sociedade pode proporcionar, e ele toma um caráter ainda mais simbólico no período da adolescência até a juventude, quando nos colocamos a trilhar diversos caminhos que podem nos levar aos mais diferentes lugares, com as relações do ser humano diante de si e de sua sexualidade adentrando neste aspecto.

A vida sexual de uma pessoa pode ser um leque cheio de descobertas, em que cada um pode escolher como se dá a forma mais benéfica de manter as suas relações íntimas. Cada indivíduo possui suas opiniões pessoais sobre pensamentos monogâmicos e não-monogâmicos, há aqueles que defendem a solidez de um relacionamento monogâmico, que oferece o conforto e a comodidade de um parceiro único, e aos que defendem a poligamia como uma possibilidade de poder sempre usufruir de diversas fontes de afeto, partindo do pressuposto de que o amor (como um sentimento complexo e abstrado) se plorifera em diversas ramificações que podem abrir espaço para o envolvimento de terceiros, sendo baseado em sexo casual ou não.

Renato Hogilon é estudante de Letras na Universidade Federal do Ceará(Foto: Acervo Pessoal)
Foto: Acervo Pessoal Renato Hogilon é estudante de Letras na Universidade Federal do Ceará

De fato, até conseguirmos chegar a uma conclusão do que é ou não é cabível dentro da nossa individualidade, é preciso buscar o autoconhecimento pessoal em sabermos como funcionamos diante de tantas formas de se relacionar, assim como nas relações sexuais, quando para algumas pessoas é fácil manter essas relações com quem se mantém um vínculo afetivo ou não, para outras até mesmo a possibilidade de um contato físico ou romântico que demostre afinidade ocasiona em uma confusão de dilemas pessoais, podendo estar relacionado à autoestima, traumas, inseguranças, entre outras situações. Por isso, a busca por tratamento psicológico é sempre bem-vinda nessas situações.

No entanto, além da jornada identitária, é preciso atentar-se ao respeito diante da sexualidade humana. Muitas questões ligadas ao tema são tratadas de forma indigna e simplória, levando a considerar o sexo apenas um ato copulatório e biológico realizado por dois indivíduos heterossexuais, desconsiderando o sexo como uma atividade que também possui suas infinitas formas de ser construída, a partir de diversos fatores oriundos da vivência humana, tais como orientação sexual, relações pessoais, aspectos psicológicos, culturais, entre outros. Ou seja: atrelar um único significado sólido a uma esfera tão multifacetada como a sexualidade é limitar a nossa própria percepção acerca das possibilidades que nos aguardam.

*Renato Hogilon é estudante de Letras em Português, Literatura e Língua Estrangeira pela Universidade Federal do Ceará (UFC) e Gen-Z.

 

 

Confira uma lista de séries que abordam como essa geração se relaciona 


 
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