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Como era a estratégia de combate de Lampião
Reportagem Seriada

Como era a estratégia de combate de Lampião

A longevidade de Virgolino como maior bandido dos sertões se explica em grande parte por estratégias que consistiam em lutar apenas quando em condições favoráveis, fugir quando o cenário se tornava desfavorável, esconder os rastros e manter ampla política de alianças. Métodos semelhantes às guerrilhas, mas desprovidas do caráter político
Episódio 5

Como era a estratégia de combate de Lampião

A longevidade de Virgolino como maior bandido dos sertões se explica em grande parte por estratégias que consistiam em lutar apenas quando em condições favoráveis, fugir quando o cenário se tornava desfavorável, esconder os rastros e manter ampla política de alianças. Métodos semelhantes às guerrilhas, mas desprovidas do caráter político
Episódio 5
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A rede de relações e as estratégias de combate são os principais fatores para explicar o sucesso tão duradouro de Lampião como maior criminoso dos sertões. Ele mantinha alianças que iam desde vaqueiros até importantes proprietários de terra, passando pela igreja, policiais e políticos importantes. Isso dava a ele importante barreira de proteção.

 

Todavia, os inúmeros combates diretos travados contra policiais e civis e os tiroteios ao atacar cidades e povoados mostram que Virgolino Ferreira da Silva precisou dominar a arte de guerrear. Ia muito além da força, da brutalidade e de saber atirar - atributos por certo indispensáveis, mas insuficientes.

Para o historiador Billy Jaynes Chandler, a forma de lutar se aproxima das estratégias de luta de guerrilha. Não no sentido clássico, relacionado à luta por motivação política. Mas, certamente, pelos canais usados.

Lampião se valeu de estratagemas que envolviam esperteza e método. O ponto de partida de tudo era a informação e conhecimento do campo de batalha.

Ao mesmo tempo em que ter informação era decisivo, evitar que o inimigo obtivesse também era. Atributo crucial era a capacidade de esconder os vestígios de por onde passaram. Não ser encontrado era elemento crucial.

Capa de Lampião, o rei dos cangaceiros, de Billy Jaynes Chandler(Foto: Reprodução)
Foto: Reprodução Capa de Lampião, o rei dos cangaceiros, de Billy Jaynes Chandler

A maneira de organizar a tropa era outro fator decisivo para o sucesso. O grupo se dividia para ter velocidade e despistar e se reunia para demonstrar força ou quando era conveniente à estratégia. Ilude-se quem pensa que Lampião era tipo do combatente que não abandonava uma briga.

Não teria sobrevivido por 16 anos no comando do crime dos sertões não fosse o fato de fugir quando em desvantagem. Nem entrava em confronto se as condições não estavam a seu favor e, quando o cenário se mostrava desfavorável, tratava de escapar. Não raro era tachado de covarde.

Além de despistar, minar os adversários e exaurir seus recursos foi outra receita do "rei do Cangaço.

O componente político e de relacionamento era complemento determinante nesse jogo estratégico no qual não lutar era melhor que lutar e fugir era melhor que morrer em combate. Havia muitos criminosos em posição de poder e prestígio para viabilizar o banditismo de Lampião.

 

 

13 curiosidades sobre Lampião

1. O governador Lampião

Talvez em certa bravata, Virgolino Ferreira da Silva dizia sonhar em ser governador de um novo estado sertanejo, formado com porções de Bahia, Pernambuco, Alagoas e Sergipe.

2. Homem de fé

Lampião era descrito como alguém profundamente religioso. Tinha respeito pelos padres, em particular Cícero Romão Batista. Rezava sempre ao meio-dia, relataram seus ex-colegas. Às sextas-feiras, praticava jejum. Na Semana Santa, não comia carne e suspendia as operações. Era uma religiosidade primitiva, mística, típica do catolicismo dos antigos sertões. Muito relacionada às forças sobrenaturais. O centro de sua fé era a crença no seu "corpo fechado".

3. Lampião contra o progresso

Virgolino Ferreira da Silva procurava combater ao máximo os avanços nos transportes e comunicações. Sua atuação dependia do isolamento, das dificuldades de deslocamento e da demora para as informações circularem nos sertões. Por isso, incendiava estações de trem, cortava fios de telégrafo. E investia contra construções de estradas. Em agosto de 1929, a construção de estrada entre Juazeiro e Santo Antônio da Glória foi suspensa temporariamente depois de ameaças de Lampião. Ele dizia que cortaria a cabeça do oficial e os pés dos trabalhadores. Em outubro, ao saber da retomada da obra, eçle atacou o local e matou nove trabalhadores.

4. Virgolino, o parteiro

A presença de mulheres no cangaço trouxe como problema a ser administrado pelo bando a realização dos partos. O próprio Lampião realizava os procedimentos. Havia sido vaqueiro quando criança e usava o aprendizado adquirido ao ajudar os animais a dar à luz as crias. Pelas circunstâncias, as mulheres não recebiam cuidados adequados nem durante nem depois do parto. Muito menos antes. Eram acostumadas a condições hostis. Como viram acontecer com suas mães, nem recebiam nem esperavam cuidados médicos.

5. Expedita, a princesa do cangaço

Em 1932, nasceu Expedita, filha de Lampião e Maria Bonita. A menina foi entregue a um aliado de confiança de Lampião, em Sergipe, com a orientação de a mandarem para João Ferreira, único dos irmãos Ferreira a não entrar para o cangaço. O parentesco da menina era "segredo de Estado". Após o parto, o destino a ser dado às crianças era outro problema a ser administrado no cangaço.

6. Quase cego de um olho

Lampião feriu gravemente o olho direito, em um galho ou espinho de árvore. Adquiriu um leucoma (opacidade branca), que se agravou com o passar dos anos, levando-o quase à cegueira total daquele olho. Apesar disso, a pontaria era certeira. Usava frequentemente óculos com lentes coloridas, tanto para esconder o defeito como devido a intolerância a luminosidade.

7. Como era Lampião

Na visita a Juazeiro do Norte, em 1926, repórter do jornal O Ceará descreveu Virgolino: magro, de estatura mediana, pele escura, cabelos fartos e pretos. Usava chapéu de feltro simples, sem os enfeites na aba virada para cima, usuais entre cangaceiros. Calçava alpargatas de couro, típicas de vaqueiros. Colocava lenço verde no pescoço, preso por anel de brilhante. Nos dedos, seis anéis de pedras preciosas - rubi, topázio, esmeralda e três brilhantes. Portava rifle, pistola e punhal de quase 40 centímetros de cumprimento.

8. Bebidas

Os cangaceiros consumiam álcool em grandes quantidades, sobretudo cachaça. Lampião preferia conhaque e não bebia muito.

9. Leitura

Lampião apreciava jornais, sobretudo quando falavam sobre ele, e revistas de Rio de Janeiro e São Paulo. Passava o tempo lendo ou ouvindo alguém ler para ele - provavelmente não tinha leitura fluente.

10. Perfumes

Os banhos eram escassos, sobretudo em épocas de seca. Por isso, usavam perfumes de forma abundante. A mistura da falta de banho, o perfume em excesso e a brilhantina com a qual untavam os cabelos davam cheiro característico que virou marca do cangaço. Há episódios nos quais davam banhos em cavalos e derramavam até nos animais os perfumes que roubavam.

11. Harém sertanejo

Em 15 de agosto de 1931, o Jornal de Alagoas publicou relato de um caixeiro-viajante segundo qual Lampião e seu bando mantinham espécie de harém, com 17 mulheres enfeitadas com jóias e vestidas com roupas finas. A história, contudo, não parece ter fundamento.

12. Poderes sobrenaturais

Um dos segredos do sucesso de Lampião era a capacidade de esconder seus rastros. Usavam vários estratagemas para disfarçar sinais de sua passagem. Apagavam pegadas, caminhavam para trás de forma a ocultar a direção. Para muitos soldados que o perseguiam, o cangaceiro parecia ter poderes sobrenaturais.

13. Harém sertanejo

Um dos maiores mistérios relacionados a Lampião era a fonte de suas munições. A origem do abastecimento nunca foi descoberta de forma a deixá-lo desprovido. Teria sido modo eficaz de combatê-lo. Sabe-se que a proteção de gente importante, entre fazendeiros, comerciantes e políticos, era indicativo dos caminhos da munição até ele.

 

 

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