A lacuna deixada pelo abandono paterno causa um impacto profundo nos lares brasileiros. No episódio 1 desta série de reportagens, O POVO+ revelou que milhões de famílias são chefiadas por mães solo e que inúmeras crianças são registradas sem o nome do pai, realidade que toca de perto a vida de muitos brasileiros. Mesmo assim, homens que cresceram nesse contexto compartilham suas histórias, abraçando a ideia de se tornarem a figura paterna que lhes faltou na juventude.
Agora, ao falar de "ausência de referência paterna", também é possível perceber uma escassez de bons referenciais bibliográficos que retratem uma figura paternal positiva a ser alcançada. Seja na religião, na filosofia ou na academia, o vácuo é evidente. Muitos dos grandes nomes do pensamento ocidental nunca experimentaram o exercício da paternidade, enquanto outros exemplificam o extremo oposto do que um pai deveria ser.
O escritor brasileiro Marcos Piangers faz um convite para refletir sobre essas questões em uma viagem pelo tempo e pelas mentes responsáveis por grande parte das ideias que moldam a nossa cultura e sociedade. Ao abordar uma das religiões mais conhecidas e influentes do mundo, Piangers destaca que o catolicismo, sobretudo no Velho Testamento da Bíblia, retrata Deus como uma figura "autoritária" e "controladora".
“Deus diz a Abraão: ‘Mate seu filho, quero ver você semeando’. Ele complica a vida de Jó: ‘Quero ver se você me ama’. Ou seja, temos esse Deus, que para muitos é o arquétipo de pai, como uma figura frequentemente autoritária, distante e que estabelece uma relação bastante problemática”, evidencia Piangers. O raciocínio é compartilhado na palestra “A transformação da paternidade”, disponível no YouTube.
Durante a apresentação, Piangers também explora a Mitologia Grega, destacando que Zeus, o pai de todos os deuses, não é exatamente um modelo de figura paterna amigável. Ele comenta uma versão do mito de Hefesto (deus do metal e do fogo), que teria sido lançado do alto do Olimpo como punição por proteger sua mãe, Hera, que havia sido aprisionada por Zeus. Ao libertá-la, Hefesto despertou a ira de seu pai, que o castigou severamente.
"Então esse é o exemplo de pai que temos do passado. Essa é a construção da religião, que é mãe da filosofia e que, por sua vez, é mãe da ciência"
Para Piangers, todo o arcabouço simbólico do pai participativo ainda está em construção. Afinal, quem são as grandes figuras paternas na cultura pop, no mundo empresarial, na academia para tomar como parâmetro? Piangers observa que as figuras paternas presentes no imaginário popular são limitadas e, muitas vezes, problemáticas, a exemplo de Homer Simpson e Steve Jobs.
A relação de Homer com o filho Bart é marcada por comportamentos agressivos, como o ato de esganá-lo, imagem facilmente encontrada na internet.
Um arquétipo de sucesso no século XX, Steve Jobs nomeou um de seus computadores de Lisa, o mesmo nome da filha que ele abandonou.
De acordo com Piangers, esses casos ilustram a falta de grandes exemplos de paternidade na sociedade contemporânea, seja na vida real, seja na ficção, indicando que essa capacidade de ser um pai presente e participativo ainda está em processo de desenvolvimento.
Além disso, ao refletir sobre os grandes pensadores da história, o escritor destaca filósofos como Platão, Nietzsche, Schopenhauer, Kant, Hobbes, Locke, Kierkegaard, Sartre, Foucault, Adorno, Karl Popper e Espinoza, observando que todos eles compartilham uma característica em comum: nenhum teve filhos.
Essa constatação é usada para reforçar sua crítica de que mesmo as mentes que moldaram o pensamento ocidental não experimentaram a paternidade, revelando uma lacuna significativa na construção de modelos paternos na história do pensamento.
Dos únicos exemplos de pensadores que tiveram filho ele aponta Jean-Jacques Rousseau, que teve cinco filhos. Mas pondera: “Ele abandonou os cinco filhos. Não sabia o nome de nenhum deles, entregou para o orfanato. E esse foi o autor que escreveu um livro sobre educação, que é ‘Emílio’.
"O que nos formou reflete um distanciamento do masculino da família, seja na religião, seja na filosofia. Mas agora a ciência está mostrando novos caminhos: que o homem também 'engravida', que existem transformações biológicas no homem enquanto a esposa está grávida, como o aumento do nível de cortisol, e que o homem tem importância também na formação dos filhos."
Para saber mais sobre os benefícios da paternidade na vida dos filhos, clique aqui.
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Em uma sociedade onde os papéis de gênero estão sendo redefinidos e a busca por figuras paternas inspiradoras se torna cada vez mais urgente, Marcos Piangers surge como uma voz potente nessa discussão. Influenciador digital e autor do best-seller "O papai é pop", ele também é palestrante, abordando a paternidade com a sensibilidade e profundidade que o tema exige. Em entrevista exclusiva ao O POVO+, Piangers compartilha uma visão humanizada e transformadora da paternidade.
Pai de Anita e Aurora, Piangers reflete sobre as dificuldades que os homens enfrentam ao tentar se conectar com suas emoções e exercer uma paternidade mais presente e afetuosa. Ele destaca a necessidade de se reavaliar o conceito de masculinidade, ainda muitas vezes vinculado a comportamentos rígidos e distantes, que impedem os homens de se reconectarem com sua própria sensibilidade.
Para o pensador, a paternidade é uma oportunidade de cura, tanto para os pais quanto para as crianças, além de ser um processo de redescoberta das emoções mais genuínas e da construção de laços afetivos duradouros. Suas palavras são um chamado à ação, tanto para pais quanto para legisladores, na construção de um futuro onde a paternidade seja vista como parte essencial e valorizada da vida familiar.
O POVO - Em suas palestras, você menciona que as referências de paternidade ao longo da história são escassas. Quais são algumas maneiras práticas pelas quais os pais podem buscar e encontrar referências positivas para exercerem uma paternidade mais afetiva e envolvida?
Marcos Piangers - Vamos voltar no tempo e analisar o conceito de paternidade e família ao longo da história. Quando falamos sobre patriarcado e o impacto cultural que a figura paterna tem em nossas vidas, podemos olhar para a mitologia grega e perceber como ela ainda nos influencia. Esse impacto se intensificou especialmente após a psicologia de Sigmund Freud, que escolheu mitos gregos, como o de Édipo, para descrever a relação entre pai, mãe e filho. Ou seja, a construção da família começou a ser problematizada ali na psicologia.
Além disso, temos mais de 40 histórias dos Irmãos Grimm que também exercem um grande impacto no nosso imaginário cultural. Nessas histórias, o rei e seus filhos, os príncipes, disputam o trono, e esses príncipes lutam entre si pelo poder. Mais uma vez, o pai é retratado como uma figura de autoridade que deve ser superada para que os filhos alcancem a felicidade e o poder.
Também vemos influências culturais na própria etimologia da palavra “família,” que vem do latim “famulus”, significando “escravo doméstico”. Quando falamos em família e olhamos para o passado, percebemos que, no imaginário cultural, a família era composta pelo pai como dono de uma propriedade, onde a casa, os bens, a mulher e os filhos eram considerados sua posse.
Essa construção imaginária e cultural é equivocada e reflete vestígios culturais que ainda influenciam a formação familiar nos dias de hoje. Contudo, nos últimos cem anos, as mulheres desafiaram o estabelecimento desse conceito de família, particularmente a ideia de que mulheres e filhos são propriedade do homem. E isso é mais do que justo, pois estamos evoluindo para uma sociedade cada vez mais humanista, que valoriza as liberdades individuais.
Nesse contexto, as mulheres conquistaram sua liberdade no mercado de trabalho, e as crianças passaram a ser protegidas, afastadas de ambientes adultos, cigarros, álcool e trabalho infantil. Aos poucos, percebemos que mulher e filhos não são propriedade do homem, mas o contrário. Uma família feliz precisa contemplar a individualidade de cada um.
Assim, chegamos ao pai moderno, que não se encaixa mais na família atual se ainda mantiver o comportamento do passado, nem se afastar de seu papel. A solução não está em manter-se como o pai antigo ou em abandonar o barco, mas em descobrir qual é o papel do homem em 2024. Esse é o grande desafio, pois precisamos de bons exemplos de paternidade do passado, e alguns deles podemos encontrar na própria mitologia grega, como a relação entre Ulisses e Telêmaco, nas histórias dos Irmãos Grimm, nos desenhos da Disney e na literatura.
Esses exemplos, embora escassos, são valiosos e precisam ser reforçados. É fundamental que valorizemos e promovamos, especialmente nas redes sociais, que hoje são o principal meio de divulgação de ideias, o conceito de um pai presente, amoroso e harmonioso, que não transforma a casa em um campo de batalha, mas sim em um ambiente de paz e afeto. Essa construção é muito mais saudável e adequada aos dias de hoje.
O POVO - Você também aborda a importância de quebrar estereótipos e normas tradicionais de gênero na paternidade. Quais são os passos que os pais podem tomar para desafiar essas normas e criar um ambiente mais igualitário e saudável para seus filhos?
Marcos Piangers - Vale a pena que o homem também analise quais emoções lhe foram permitidas ao longo da vida. Infelizmente, o homem passa por um processo muito violento em que não pode demonstrar tristeza, nojo, medo e, muitas vezes, nem mesmo alegria. Isso acontece porque, quando ele demonstra muita alegria, sua masculinidade é frequentemente desafiada pelos amigos, que podem questionar essa expressão de felicidade, insinuando que ele está "alegrinho demais".
Assim, o homem sente que precisa ser sério, durão, pois esse é o símbolo da masculinidade ideal, uma masculinidade que, na verdade, é doentia. Todos os homens são incentivados a se comportar de uma forma doentia, o que não é surpreendente quando observamos que a maioria dos homicídios, das violências domésticas, dos acidentes de trânsito, dos detentos nas penitenciárias, dos moradores de rua e dos suicídios é cometida ou sofrida por homens. Os homens se suicidam quatro vezes mais do que as mulheres, o que evidencia que esse comportamento é, de fato, doentio.
Mas como curar esse comportamento? A resposta está em olhar para dentro de si e reconhecer que o homem possui outras emoções e que é necessário reconectar-se com sua sensibilidade. É preciso retirar essa armadura que nos foi imposta como símbolo de masculinidade e entender que um homem não é menor por sentir tristeza, medo, nojo e alegria. Pelo contrário, ao lidar com essas emoções de maneira saudável, ele se torna um homem maior, não um homem covarde.
Esse é um processo desafiador para o homem moderno, que foi ensinado a ser doentio e agora precisa descobrir como ser saudável. Essa jornada passa pela paternidade, por descobrir que, sendo um bom marido e pai, ele será muito mais feliz. Com uma família equilibrada, conectada e harmoniosa, ele encontrará maior felicidade. Participando de forma equilibrada e amorosa dentro de casa, cuidando dos filhos e olhando para si mesmo com amor, ele alcançará a felicidade.
Apesar de terem dito a ele para se odiar, beber excessivamente, usar drogas, ser violento, não aceitar desaforos e adotar comportamentos autodestrutivos, o homem precisa reconhecer que esses comportamentos o destroem. O antídoto para isso é se comportar de maneira contrária: preservar-se, amar-se, amar aqueles ao seu redor e reconectar-se com seus afetos, que lhe foram arrancados durante a juventude e o início da fase adulta.
Todo homem chega ao mundo com bondade, todo menino vem ao planeta com pureza, e é esse lado que deve ser resgatado.
O POVO - Muitas vezes, os homens enfrentam dificuldades em expressar suas emoções devido a normas culturais e sociais. Como você sugere que os pais comecem a se abrir emocionalmente e se tornem mais vulneráveis com seus filhos?
Marcos Piangers - A chegada de uma criança é a oportunidade para que o homem descubra que ele pode chorar, amar, dizer "eu te amo" e expressar suas emoções. Ele passa a ter a obrigação de buscar harmonia dentro de casa, o que envolve conversar mais, especialmente sobre suas emoções e gatilhos, respeitar sua esposa e entender a criança. Esse processo de reconexão com a criança que ele foi um dia é muito bonito, pois permite que o homem resgate o que há de melhor dentro de si, aquela inocência e pureza que ele teve na infância.
José Saramago costumava dizer: "Tentei não decepcionar a criança que fui um dia." Essa frase é linda, pois reflete a importância de manter a conexão com a criança que ainda vive dentro de nós. Da mesma forma, Carlos Drummond de Andrade afirmava: "O adulto que brinca com a criança, brinca com a criança nele mesmo." Ou seja, todos temos uma criança interior, genial, criativa, divertida e feliz.
Reconectar-se com essa felicidade infantil que um dia tivemos, e que desejava apenas o afeto de nosso pai, é uma possibilidade real. Quando o pai dá colo ao filho, ele não só cura a criança, mas também a si mesmo. Esse é um processo muito bonito que pode acontecer com os homens, e a paternidade pode ser a chave para libertá-los dessa prisão masculina, permitindo que se descubram no seu melhor.
O POVO - Você fala muito sobre a importância da conexão emocional entre pais e filhos. Quais atividades ou práticas diárias recomenda para fortalecer essa conexão e criar momentos significativos juntos?
Marcos Piangers - Quando os pais me dizem: "Ah, Piangers, a vida está tão corrida hoje em dia que não tenho como dar atenção aos meus filhos", eu sempre respondo: "Vamos começar com a regra dos dez segundos." Às vezes, um pai pode achar difícil dedicar mais tempo, mas dez segundos são uma quantidade mínima que ele pode conseguir.
A ideia é que, toda vez que o filho disser "pai, vamos brincar", o pai deve dar dez segundos de atenção. Se o filho pedir atenção enquanto o pai está fazendo outra coisa, como cozinhar, trabalhar no computador ou no celular, ele deve parar por dez segundos e se dedicar exclusivamente ao filho. Esses dez segundos podem ser o suficiente para o filho se sentir valorizado.
Imagine se, em vez de dez segundos, você pudesse dedicar um minuto completo ao seu filho toda vez que ele pedir. Se isso ainda parecer difícil, então proponha 20 minutos por dia. Durante esses 20 minutos, você deve se limitar a ouvir o seu filho e brincar com o que ele quiser, sem propor nada.
Dr. Daniel Amen, um renomado neurocientista dos Estados Unidos, autor de vários best-sellers do New York Times e que já escaneou mais de 220 mil cérebros, afirma que esses 20 minutos diários têm um impacto significativo no cérebro da criança e na conexão entre pai e filho. Ele explica que, durante esses momentos de brincadeira e carinho, os níveis de ocitocina aumentam tanto no pai quanto na criança, criando uma conexão profunda e positiva.
Esses 20 minutos são fundamentais e ajudam a construir memórias e fortalecer a conexão para toda a vida. A pesquisa científica mostra que pais que brincam e cuidam de seus filhos mantêm uma conexão forte com eles até depois da adolescência e na fase adulta. Isso é essencial, pois reflete nossa biologia e construção natural, mostrando que, se acertarmos esses primeiros dez anos, as preocupações nos anos seguintes serão muito menores.
O POVO - Como você vê o papel das políticas públicas e do ambiente de trabalho na promoção de uma paternidade mais presente? Que mudanças acredita serem necessárias para que os pais possam se envolver mais na vida de seus filhos desde o nascimento?
Marcos Piangers - Tem um pesquisador chamado James Heckman, que ganhou o prêmio Nobel de Economia, por demonstrar que o melhor investimento que um país pode fazer é investir na chegada de uma criança. Em vez de gastar com programas sociais como o Bolsa Família ou com o sistema penitenciário para lidar com crimes e delinquência, que muitas vezes são resultado de uma infância negligenciada, o retorno sobre cada real investido seria muito maior em áreas como um pré-natal bem feito, um parto de qualidade e políticas de licença parental.
Garantir uma família tranquila para receber e cuidar bem das crianças e proporcionar uma educação adequada para pais e mães resulta em benefícios significativos a longo prazo. Quando investimos nesses aspectos, colhemos frutos nas próximas gerações. Heckman, com seu Prêmio Nobel, provou que essa política pública é a mais eficaz. É por isso que tenho buscado mudanças na lei da licença paternidade em Brasília, dialogando com senadores e deputados.
Em 1988, o deputado Senir Guerra (PSDB-PE) tentou implementar uma licença paternidade no Brasil e foi ridicularizado. Chamado de “deputado grávido” por propor uma licença de apenas oito dias, sua proposta foi inicialmente recebida com risadas. Na época, a Suécia já tinha uma licença parental de 480 dias desde 1974. O deputado Guerra, que passava por dificuldades pessoais, com uma esposa na UTI e uma filha recém-nascida, defendeu apaixonadamente a licença paternidade.
Após seu discurso emocional, ele recebeu o apoio unânime para a proposta. Infelizmente, após a aprovação inicial, a licença paternidade no Brasil foi reduzida para cinco dias e não foi regulamentada adequadamente.
Atualmente, o Brasil tem uma das menores licenças paternidade do mundo, e, ironicamente, a licença é menor que o período do Carnaval. Isso envia uma mensagem de que a participação do homem não é necessária, desconsiderando a importância do pai. Para as mulheres, isso sugere que toda a responsabilidade recai sobre elas, e para os casais, pode parecer que o homem pode se afastar facilmente.
No Brasil, há quase 6 milhões de crianças sem o nome do pai no registro de nascimento e 49% dos partos realizados pelo SUS são de mulheres sozinhas. É essencial que mudemos as políticas públicas e aumentemos a licença paternidade. Isso servirá como um sinal para que os homens se vejam como cuidadores importantes.
Além disso, é fundamental educar os homens para que se percebam como bons cuidadores. Um pai presente é crucial para a criança, para a mulher e para o próprio pai, contribuindo para seu crescimento pessoal e bem-estar.
A evolução do conceito de paternidade, que antes se limitava à imagem do provedor severo e distante, está finalmente rompendo com estereótipos antigos. À medida que o papel do pai se transforma, no entanto, surge uma tendência de rotulá-lo com uma série de adjetivos: "superpai", “paizão”, "pai cuidadoso".
Mesmo bem-intencionada, essa prática de atribuir qualidades a figura paterna carrega em si uma expectativa velada de que ser pai envolve um esforço extraordinário – algo além do que seria esperado, por exemplo, de uma mãe.
Para Tuany Abreu de Moura, especialista que estuda as novas configurações da paternidade, a insistência em adjetivar o papel dos pais é sintomática de uma transição social que ainda está em curso.
Doutoranda em estudos sobre parentalidades na Universidade Federal do Ceará (UFC), ela comenta que, ao adjetivar o pai, é evidenciada uma tentativa de destacar comportamentos que deveriam ser considerados normais como se fossem exceções.
“A gente vê muito essa necessidade de rotular o pai que cuida dos filhos, mas por que precisamos especificar? Por que não podemos simplesmente chamar essas atitudes de paternidade, sem usar adjetivos?” questiona Tuany, que é autora do artigo “Paternidade ativa: A lógica das redes sociais”.
A necessidade de adjetivar revela, portanto, uma lacuna na forma como a sociedade ainda enxerga o papel do homem no âmbito familiar. Tuany argumenta que, enquanto o simples fato de uma mãe ser carinhosa e cuidadosa é visto como parte intrínseca do que é ser mãe, o pai que desempenha um papel similar frequentemente é exaltado como se estivesse fazendo algo extraordinário.
“O ideal seria que paternidade e maternidade fossem vistas como funções igualmente naturais e fundamentais, sem essa diferenciação que coloca o pai em um pedestal por fazer coisas que, na verdade, são apenas parte de ser um bom cuidador.”
A discussão traz à tona ainda a ideia de que a paternidade precisa ser ressignificada, onde ser pai não demande necessariamente adjetivos que glorifiquem comportamentos que deveriam ser parte integrante desse papel. A busca, segundo Tuany, é para que o termo "pai" por si só já seja suficiente para englobar tudo aquilo que esperamos de uma figura parental: amor, cuidado, presença e responsabilidade.
"Precisamos caminhar para um momento em que o simples fato de ser pai já implique todas essas qualidades, sem a necessidade de adornos linguísticos"
Série mostra os traumas da ausência do pai e como um grupo de homens desafia ciclos de abandono que marcaram suas infâncias para montar o quebra-cabeça da paternidade na vida adulta