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Rede Cuca 10 anos: os entornos e a vida entre a esperança e a insegurança
Reportagem Seriada

Rede Cuca 10 anos: os entornos e a vida entre a esperança e a insegurança

Último episódio da série sobre os dez anos da Rede Cuca se debruça nos entornos dos equipamentos e como seus frequentadores lidam com o medo dos conflitos entre facções criminosas
Episódio 3

Rede Cuca 10 anos: os entornos e a vida entre a esperança e a insegurança

Último episódio da série sobre os dez anos da Rede Cuca se debruça nos entornos dos equipamentos e como seus frequentadores lidam com o medo dos conflitos entre facções criminosas
Episódio 3
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O estabelecimento da Rede Cuca em 2014 foi um passo importante para a consolidação dos objetivos iniciais previstos para os equipamentos. Era preciso dar oportunidades aos jovens e servir como ponto de esperança para aqueles que enfrentavam dificuldades em regiões de vulnerabilidade socioeconômica. O que foi iniciado cinco anos antes, com a criação do Cuca Barra, se manifestou nas outras unidades.

Para além do público-alvo (a juventude), é possível dizer que os Cucas também atingiram demais moradores dos bairros onde se instalaram e até pessoas de outras regiões. Ao longo dos 10 anos da Rede Cuca, os equipamentos enfrentaram desconfianças, mas se firmaram como estruturas capazes de fortalecer a autoestima.

Como exemplo, matéria publicada no O POVO em 2015 já mostrava como o Cuca estava fazendo diferença na vida dos jovens da comunidade e do seu entorno. O centro urbano fazia parte do cenário de um local que "até pouco tempo só era lembrado pelo extinto aterro sanitário ou pela violência".

Vista aérea do Cuca do Pici, equipamento da Rede Cuca que este ano completa 10 anos(Foto: FCO FONTENELE)
Foto: FCO FONTENELE Vista aérea do Cuca do Pici, equipamento da Rede Cuca que este ano completa 10 anos

De uso da pista externa para caminhadas diárias a “sala de dança a céu aberto”, de “passarela para desfilar tendências da moda” a “polo de lazer para uma caminhada de fim de tarde”, os Cucas foram sendo reconhecidos ao longo desses anos como espaços que podem — e devem — ser ocupados de diferentes maneiras.

A partir de programas com serviços de saúde, orientação de empregabilidade, apresentações culturais e ações realizadas “fora dos muros” das unidades, os cinco Cucas visam reforçar vínculos e atender a moradores do entorno. Ainda assim, alguns desafios continuam, como lidar com a insegurança e a violência devido às disputas entre grupos criminosos que atuam em locais próximos.

No terceiro e último episódio da série de reportagens sobre os dez anos da Rede Cuca, os olhares estão voltados à extensão dos equipamentos: os entornos que se equilibram entre a esperança das oportunidades e o medo da violência territorial.

 

Linha do tempo da Rede Cuca no O POVO

 

 

Ações e vínculos com as comunidades

 

Desde a criação da Rede Cuca em 2014, foram realizados mais de 4,5 milhões de atendimentos nas unidades localizadas nos bairros Barra do Ceará, Jangurussu, Mondubim, José Walter e Planalto Pici. Os dados são da Secretaria da Juventude de Fortaleza e demonstram uma importante demanda pelos serviços dos equipamentos.

Para além da oferta de vagas em esportes e cursos em áreas como teatro, música, dança, tecnologia e educomunicação (nos quais as vagas têm como prioridade jovens de 15 a 29 anos), os Cucas realizam programas para ampliar o contato com os frequentadores das unidades.

Programa Cuca na Comunidade visa levar atividades e serviços a moradores dos entornos dos Cucas(Foto: Prefeitura de Fortaleza/Divulgação)
Foto: Prefeitura de Fortaleza/Divulgação Programa Cuca na Comunidade visa levar atividades e serviços a moradores dos entornos dos Cucas

Um desses programas é o Cuca na Comunidade. A iniciativa é executada fora dos muros dos equipamentos da Rede Cuca e leva serviços de saúde à comunidade como testagem rápida de HIV, Sífilis e Hepatite B e C, vacinação e aferição de pressão. Em abril, o bairro Vila Velha recebeu a visita do projeto.

Outras atividades do programa incluem serviços de orientação de empregabilidade e elaboração de currículos e inscrição no CadÚnico, contação de histórias, feira do livro, jogos e oficinas, aulão de dança, aula de artes marciais e apresentações culturais. A programação é realizada pelo setor de Direitos Humanos e visa fortalecer vínculos com jovens e famílias dos territórios no entorno dos Cucas.

No projeto Comunidade em Pauta, são realizadas reuniões mensais para ceder espaços dos Cucas para grupos da comunidade. Eles podem utilizá-los para ensaios, jogos, treinos, reuniões e exibições.

Educadores do Cuca Ambiental celebram o  Dia de Proteção às Florestas na Lagoa do Mondubim, no ano de 2023(Foto: Samuel Setubal)
Foto: Samuel Setubal Educadores do Cuca Ambiental celebram o Dia de Proteção às Florestas na Lagoa do Mondubim, no ano de 2023

Há também a iniciativa Cuca Ambiental, que visa desenvolver atividades ambientais a partir da juventude, disseminando o conhecimento sobre o meio ambiente e a importância do cuidado e defesa da natureza para a sociedade. Em 2023, por exemplo, voluntários plantaram árvores, doaram mudas e visitaram casas do entorno da Lagoa do Mondubim para conscientizar sobre o descarte indevido de lixo no local.

 

 

Feiras e comércios ao redor

 

Uma das formas de engajamento com a comunidade é a partir do setor de Trabalho e Empregabilidade. A Rede Cuca costuma realizar cadastro de empreendedores, fazer orientação de carreira, confecção de currículos, cadastros no Sistema Nacional de Emprego (Sine), bem como promover feiras e eventos.

Segundo a Rede Cuca, 500 empreendedores estão cadastrados no seu sistema e participam de feiras e eventos. Como consequência dessa iniciativa, Nete Sousa, 47, visita às quintas e sextas-feiras o Cuca Pici. Na unidade, ela coloca à venda itens como artigos de papelaria, blocos de notas e chaveiros.

 Nete Sousa, artesã, viu a renda aumentar com as feiras realizadas no Cuca Pici(Foto: FCO FONTENELE)
Foto: FCO FONTENELE Nete Sousa, artesã, viu a renda aumentar com as feiras realizadas no Cuca Pici

Há um mês no Cuca Pici, ela aproveita o movimento dos jovens que frequentam a unidade para apresentar seus produtos e, assim, conseguir incrementar sua renda. Em sua avaliação, “abrem-se as portas para empreendedores terem espaço e para terem vitrines com seus produtos”. As experiências são “positivas”: “Pretendo continuar no Cuca e manter essas portas abertas. Sou muito grata”.

Foi devido à instalação do Cuca Pici que o comerciante Rildo de Lima Alvarenga, 39, decidiu montar um ponto de venda de salgados no entorno da unidade. Há três anos com comércio próximo ao equipamento, ele percebeu melhora na segurança a partir da chegada da estrutura.

“Foi por causa do Cuca que vim para cá, porque antes era bem mais complicado aqui. Depois do Cuca melhorou a sensação de segurança. Até cavalaria eu já vi. Se não fosse o Cuca eu não estaria aqui, porque a criminalidade era muito grande”, indica. Seus principais clientes - os jovens frequentadores do equipamento - são “bastante engajados”, percebe.

Assim, ele compreende como positivos os impactos do Cuca Pici no entorno. Ele aponta a unidade como um lugar que proporciona “muitas oportunidades” para os adolescentes e a comunidade. “Eles quase vão buscar as pessoas nas suas casas”, acrescenta.

 

 

Velhos e novos espaços

 

Também comerciantes, mas nascidos e criados no Pici, Gleilson e Vânia Oliveira são irmãos e mantêm uma loja de venda de açaí próxima ao Cuca. Pela longa trajetória no bairro, eles conviveram com o espaço que antes era ocupado por um Centro Social Urbano (CSU). O equipamento oferecia atividades de lazer, cultura, formação profissional e atenção a saúde.

Ambos consideram o CSU “melhor do que o Cuca Pici”, pois a estrutura abrangia mais faixas etárias, incluindo crianças e adultos, e assim conseguiam participar com mais efetividade dos serviços prestados. Entretanto, é inegável como os jovens têm aproveitado o recente equipamento.

Embora população adulta não encontre muitas atividades na Rede Cuca, a maioria das pessoas ouvidas pela reportagem elogia o foco dados às crianças e aos jovens (Foto: FCO FONTENELE)
Foto: FCO FONTENELE Embora população adulta não encontre muitas atividades na Rede Cuca, a maioria das pessoas ouvidas pela reportagem elogia o foco dados às crianças e aos jovens

Eles levantam ressalva, porém, sobre a quantidade de vagas. “Não é todo mundo que consegue participar dos cursos, eles alegam que falta professores, aí uma pessoa faz um curso e, por estar ‘encaixada’ lá dentro, consegue fazer outro esporte, enquanto há pessoas de fora que não conseguem pela limitação de vagas”, afirma Gleilson.

Os comerciantes sugerem maior abrangência de público nas atividades para que mais pessoas da comunidade consigam participar e, assim, tanto adultos quanto crianças consigam se integrar mais ao equipamento. Atualmente, Vânia faz pilates no Cuca Pici.

 

 

Vivência de anos

 

Há 30 anos Raimundo Prudêncio de Sousa, 53, vive na Barra do Ceará. Testemunha ocular de diferentes eventos que marcaram o bairro, um deles foi a consolidação do Cuca Barra. Para ele, os impactos positivos se concentraram principalmente sobre os jovens da região, ao terem maior acesso ao lazer, a esportes e a cursos formativos.

Desde 2017, ele trabalha como vendedor logo na entrada do Cuca Barra. Raimundo vende itens como água, doces e bombons para quem frequenta o equipamento. As influências não se restringiram aos jovens, aliás. O bairro também “aproveitou”, de certa forma, os serviços oferecidos à comunidade, desde educação à saúde.

 Raimundo de Prudêncio de Sousa, vendedor,  diz ser testemunha das transformações sociais que a presença do Cuca proporcionou na Barra do Ceará (Foto: FCO FONTENELE)
Foto: FCO FONTENELE Raimundo de Prudêncio de Sousa, vendedor, diz ser testemunha das transformações sociais que a presença do Cuca proporcionou na Barra do Ceará

“O atendimento é bom”, afirma ao lembrar das vezes em que precisou de assistência médica rápida na unidade. O vendedor destaca os impactos positivos do Cuca, mas lamenta alterações significativas dos últimos anos — principalmente relacionadas à violência territorial. “Antes aqui era muito mais movimentado, mas diminuiu muito”, afirma.

O medo e a insegurança contribuíram para isso, em sua avaliação. Segundo o vendedor, houve até casos em que as atividades do Cuca precisaram ser encerradas mais cedo por ordem de criminosos. De fato, para moradores e jovens que frequentam o Cuca — não só o da Barra, mas das outras regiões — a violência tem sido marcante quando o assunto é o entorno dos equipamentos.

 

 

O entorno às voltas com a insegurança e o descaso 

 

No segundo episódio desta série de reportagens, um dos jovens frequentadores da Rede Cuca destacou como a insegurança é um dos desafios para os equipamentos. Isso se estende para o Cuca Pici, pois o bairro reúne áreas de conflito entre facções e, assim, moradores já deixaram de ir à unidade por medo da violência territorial.

O problema da violência não é recente e se alastra por Fortaleza. Em 2014, O POVO reportou que o Cuca Barra teria um Núcleo de Mediação de Conflitos diante do “descontrole da violência no bairro”. A ideia era estendê-lo aos próximos Cucas para a Prefeitura atuar “nos conflitos de natureza interpessoal”.

Em maio do mesmo ano, o jornal também destacou como os entornos dos três Cucas existentes na época apresentavam “sucessivos casos de violência”, incluindo assassinatos de dois jovens. Élcio Batista, na época titular da Coordenadoria de Juventude de Fortaleza, afirmou que a insegurança justificava a presença dos Cucas nessas regiões. Ele admitiu que as ações violentas afetavam o trabalho da rede, mas “que a questão da segurança não era apenas responsabilidade do governo”.

 Cuca Jangurussu contava com torre de segurança que foi desativada e tem impacto negativa nas redondezas (Foto: Prefeitura de Fortaleza)
Foto: Prefeitura de Fortaleza Cuca Jangurussu contava com torre de segurança que foi desativada e tem impacto negativa nas redondezas

Murilo Cavalcanti, estudioso do modelo de segurança de Medellín e Bogotá, indicou em entrevista ao O POVO em 2018 que para resolver o problema de segurança em Fortaleza seriam necessários “uns 20 Cucas”, devido ao objetivo dos equipamentos de atuar em regiões de vulnerabilidade socioeconômica.

Mesmo com gargalos, os Cucas têm influência importante na redução de crimes em seus entornos. A avaliação é de um coronel da Polícia Militar do Ceará (PMCE) que foi responsável pelo comando de operações de policiamento nos Cucas durante anos. Ele prefere não ser identificado.

O profissional elenca um trabalho conjunto entre a Guarda Municipal de Fortaleza (GMF) e a PMCE. Antes, sentia que havia maior integração entre essas forças. Cita o caso do Cuca Jangurussu, com uma torre da GMF ao lado do equipamento.

“Era muito usada para policiamento. Onde tinha aquilo as forças agiam com viatura e moto. Em um raio de dois quilômetros do Cuca diminuíam muito os roubos e os homicídios, então o Cuca acabou absorvendo essa juventude. Com o acirramento da rivalidade entre as facções a partir de 2012, o que aconteceu? O Estado e o Município foram relapsos”, introduz.

Em áreas mais vulneráveis como a que fica localizada o Cuca do Jangurussu, a situação de segurança do encontro do equipamento precisa de mais atenção dos poderes públicos(Foto: FABIO LIMA)
Foto: FABIO LIMA Em áreas mais vulneráveis como a que fica localizada o Cuca do Jangurussu, a situação de segurança do encontro do equipamento precisa de mais atenção dos poderes públicos

Ele prossegue: “Vou começar pelas torres. Hoje elas não fazem mais aquele policiamento de prevenção. Antigamente era muito mais para prevenção. Hoje, se o jovem é do Morro Santiago, controlado por uma facção, ele não pode cruzar a rua para ir ao Cuca Barra, porque se ele for ele pode morrer (pois o território seria controlado por outro grupo rival)”.

A insegurança de ir e vir não atinge apenas jovens que frequentam o Cuca. A situação se estende a moradores que tentam ir a postos de saúde e escolas localizados em territórios dominados por facções criminosas diferentes. O medo também alcança, agora, quem deseja ir aos Cucas - o que se reflete na frequência de jovens nas unidades.

Para o coronel, os Cucas acabaram tendo reduzidos os efeitos de formação social que possuíam no início devido ao acirramento dessa violência. O cenário é percebido tanto pelos jovens quanto por quem está de algum modo ligado aos Cucas, como no caso do vendedor Raimundo Prudêncio, que trabalha há sete anos na porta do Cuca Barra. Ele percebeu uma redução acentuada no número de jovens que comparecem ao equipamento devido à violência territorial.

Quais eram, então, as ocorrências recebidas pelo coronel no período no qual atuou à frente do comando dessas operações de policiamento? Ele recorda de casos mais simples, como “pichações” e “desordens”.

Jovens grafitam mural no Cuca Jangurussu em homenagem às vítimas da chacina da Messejana (Foto: FÁBIO LIMA)
Foto: FÁBIO LIMA Jovens grafitam mural no Cuca Jangurussu em homenagem às vítimas da chacina da Messejana

“Você via que era feito um policiamento comunitário. Quando a população via o Ronda do Quarteirão (que era o que tinha na época), ela criava esse elo com a polícia, então era uma coisa muito boa. Onde existiam as torres da GMF havia uma diminuição de roubos… Na época, fizemos uma estatística com a prefeitura que os homicídios foram reduzidos em 50%”, compartilha.

Entretanto, em sua avaliação, ao longo dos anos houve diferenças na permanência desse policiamento a partir das trocas de gestões. “A população não vê mais a quantidade de agentes de segurança de antigamente e vai perdendo a confiança. Esses espaços não admitem o vácuo: ou tem o Estado lá, com a presença da polícia, ou o chefe da facção manda no território. Eles não admitem neutralidade”, pontua.

Para o coronel, melhorias nessa situação poderão ser vistas a partir de maior diálogo entre Prefeitura e Governo do Estado no quesito segurança. Em sua análise, há um desentendimento entre as partes e quando “o governo do Estado era aliado da Prefeitura, tudo era facilitado”.

Hoje, porém, estaria ocorrendo um conflito devido a questões políticas — a exemplo das farpas trocadas entre Sarto e Elmano de Freitas no assassinato ocorrido no Instituto José Frota (IJF) em abril.

O coronel destaca a importância dos Cucas: “Vi jovens que estavam vulneráveis para servir ao crime virarem jogadores de futebol. Vi um rapaz que tinha irmão traficante e o outro havia sido assassinado, mas virou músico de uma banda. Vi um cara que estava em uma zona de vulnerabilidade, o pai era criminoso, e hoje é garçom de um restaurante. Isso é muito legal”.

Ele também enfatiza: “Tinha uma frase que eu adotava com meus policiais: ‘Não existe segurança pública sem polícia, mas também não existe só com a polícia’. Tem que ter esses projetos. Tira muita gente da criminalidade. É uma pena você ver a situação se deteriorando a cada ano que passa”.

 

 

“Só o trabalho da polícia não vai resolver”

 

Para abordar o assunto da insegurança nos entornos da Rede Cuca, O POVO buscou a palavra de Samuel Elânio, secretário da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará. Elânio é delegado da Polícia Federal e atuou em operações contra o crime organizado no Amapá, Ceará e Rio Grande do Norte.

Segundo o secretário, quanto aos números levantados pela Coordenadoria Integrada de Operações de Segurança (Ciops) há uma “redução das ocorrências” em áreas de até até 100 metros de distância da Rede Cuca "De acordo com a Polícia Militar do Ceará (PMCE), o patrulhamento no entorno dos Cucas é realizado pelo efetivo dos batalhões de policiamento ordinário de área. O entorno também conta com “saturações realizadas periodicamente pelo efetivo local e com o reforço do Comando de Policiamento de Rondas de Ações Intensivas e Ostensivas (CPRAIO), do Comando de Policiamento de Choque (CPChoque) e do Batalhão de Polícia de Trânsito Urbano e Rodoviário Estadual (BPRE)”." em 2024. Nesse escopo estão chamadas ligadas a homicídio, roubos ou lesões causadas por disparos de arma de fogo.

Samuel Elânio, secretário de Segurança do Estado.(Foto: FÁBIO LIMA)
Foto: FÁBIO LIMA Samuel Elânio, secretário de Segurança do Estado.

Conforme os dados da Ciops, não houve homicídio relatado em 2024 próximo aos Cucas. Houve registro de um assalto, bem como casos de disparos de arma de fogo (próximo ao Cuca Jangurussu) e de furto. “Com relação a ocorrências registradas, os números estão bastante reduzidos. Se por acaso existirem casos que não são notificados ao sistema de segurança, realmente foge ao nosso controle”, explica.

Por se tratar de um equipamento municipal, Samuel Elânio defende que “a segurança pública seja compartilhada com todos” — ou seja, incluindo a atuação da Guarda Municipal de Fortaleza (GMF).

“É imprescindível a presença da GMF, até porque a polícia militar não consegue ocupar todos os locais. A necessidade da presença da polícia é grande, então nesse momento é importante compartilhar a segurança pública com todos .A própria população tem como ajudar e o município de Fortaleza também deve atuar, mesmo que seja para resguardar o patrimônio público municipal. A partir do momento em que seja feito isso, o município também garante segurança pública, e isso não seria só papel do estado”, compreende.

Mas, afinal, há diálogo entre Polícia Militar do Ceará (PMCE) e a Guarda Municipal de Fortaleza? Elânio afirma que sim, “independentemente de posições e orientações políticas”, pois “é preciso trabalhar tecnicamente”. “O diálogo sempre houve, inclusive no sentido de pedir ao município que fizesse o básico, que é cuidar do patrimônio público municipal e, consequentemente, estar guarnecendo alguns locais e garantindo segurança pública para que a PMCE possa ocupar outros locais”, afirma.

Estatísticas de crimes a 100 m dos Cucas 

 

Entretanto, ele compreende que isso não tem sido feito, levando a Polícia Militar e a Civil “fazerem esse papel, inclusive com torres que foram construídas e passaram a ser usadas pela PM, porque a GMF deixou de utilizar”.

Mas, para além de policiamento, que estratégias estão sendo pensadas para garantir segurança aos jovens e às famílias que tentam frequentar os Cucas em meio às disputas territoriais entre facções criminosas?

Conforme Samuel Elânio, o serviço de inteligência da Secretaria de Segurança Pública tem feito trabalho prévio para “evitar possíveis ações de grupos criminosos”, como proibir a circulação de pessoas entre bairros tendo em vista as atuações desses grupos.

“Prisões estão sendo feitas, mas só o trabalho da polícia não vai resolver essa questão enquanto não tivermos ações de várias frentes no sentido de prestação de serviço público. Assim, ações sociais para que crianças e adolescentes saiam da criminalidade. A polícia terá o trabalho de tirar algumas pessoas de circulação, mas outras vão surgir para substituir. Temos que evitar que essas crianças e adolescentes vão para a criminalidade”, pondera.

 Vista aérea da Rede Cuca do bairro Prefeito José Walter. Atuação dos equipamentos da Rede Cuca funcionam como enfrentamento à violência na periferia de Fortaleza(Foto: FCO FONTENELE)
Foto: FCO FONTENELE Vista aérea da Rede Cuca do bairro Prefeito José Walter. Atuação dos equipamentos da Rede Cuca funcionam como enfrentamento à violência na periferia de Fortaleza

Como exemplos, cita o ingresso de serviços profissionalizantes, educativos, de saneamento básico, iluminação e limpeza urbana em áreas vulneráveis “para que jovens percebam que o crime não é o caminho”. “Enquanto não houver integração de várias frentes, não vai ser possível solucionar esse problema”, analisa.

Como exemplo da atuação do setor de inteligência, ele afirma que é possível acompanhar atuação ou intenção de grupos criminosos de praticarem crimes antes deles ocorrerem. Com a identificação prévia, é feito o encaminhamento para o policiamento para reprimir tais atos. Quando não são identificados, entra a Polícia Civil para investigar, identificar os autores e realizar as prisões.

A SSDPS possui um mapeamento com informações sobre as áreas com maior presença de grupos criminosos e quais são eles, mas não compartilha por se tratarem de dados “sensíveis”. “A inteligência está acompanhando de perto tudo isso e temos buscado agir de forma mais intensiva para conseguirmos evitar esse tipo de situação”, aponta o secretário.

 

 

O que diz a Guarda Municipal 

 

Quanto à presença da Guarda Municipal de Fortaleza nos equipamentos da Rede Cuca, a Secretaria de Segurança Cidadã (Sesec) afirmou em nota "O POVO tentou realizar entrevista por telefone diretamente com o inspetor Marcílio Távora, atual diretor-geral da Guarda Municipal de Fortaleza. Entretanto, a Secretaria de Segurança Cidadã (Sesec) preferiu emitir uma nota para se manifestar a respeito do tema da segurança no entorno dos equipamentos da Rede Cuca." que a GMF faz “rondas de patrulhamento, por meio de viaturas e motocicletas”, em todas as unidades. A Sesec também indicou que em alguns dos equipamentos há adições de estratégias de segurança.

Os Cucas Barra do Ceará e Jangurussu, por exemplo, são atendidos pelas Células de Proteção Comunitária dos Bairros, que ficam ao lado dos equipamentos. Quanto ao Cuca Mondubim, há efetivo fixo de dois agentes diuturnamente, além do videomonitoramento da Central de Operações Integradas da Sesec. Todas as unidades têm câmeras de vigilância interna e sensores de alarme.

A nota também menciona o concurso com mil vagas para a GMF realizado em 2023 “para ampliar o serviço prestado à população”. A nomeação da primeira turma do Curso de Formação, com 221 agentes, foi assinada em 2 de maio, e a segunda turma, com 250 alunos, está em preparação.

“Além disso, o Município adquiriu novos equipamentos, criou o Grupo Especializado Maria da Penha e está finalizando a construção da sede do Grupo de Operações Especiais (GOE) e reformando o prédio da nova sede Guarda Municipal”, acrescenta.

“A Guarda Municipal reitera a preocupação com a insegurança pública que afeta o bem-estar dos fortalezenses e dos cearenses, de forma geral, principalmente quando ameaça espaços de refúgio para a nossa juventude”, pontua.

 

 

Cuca - O mundo ao redor

 

Em 2015, o Vida&Arte publicou série de quatro reportagens, incluindo web documentários, sobre os Cucas. Foram apresentadas matérias sobre as três unidades existentes na época - Jangurussu, Barra e Mondubim. Os conteúdos abordaram temas como histórias de transformação a partir dos Cucas, relações dos equipamentos com o entorno e sentimento de insegurança.

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