Johannes Van Almeida (Chico Diaz) é um pintor de mulheres sem aceitação no mercado; um artista obsoleto. Com a visão deteriorada e à beira de um colapso nervoso, encontra em Florence Lizz (Samantha Heck Müller), uma atriz em crise diante do seu filme mais desafiador, a inspiração para realizar sua obra prima. Antoinette (Maria Fernanda Cândido) é uma influente marchand que fareja o valor de obras de arte quando histórias de inspiração viram obsessão entre pintores e modelos.
Esta é a sinopse de Vermelho Monet, mais novo filme do cineasta cearense Halder Gomes. Famoso por dirigir comédias, como Cine Holliúdy (os dois filmes e a série de TV), O Shaolin do Sertão 1 e 2 e Os Parças, Halder enfrenta agora o desafio de realizar um drama, em grande estilo. Mais que isso, realiza o sonho de unir duas de suas grandes paixões: o cinema e as artes plásticas. Pouca gente sabe, mas Halder pinta desde criança e há décadas é um consumidor compulsivo de livros sobre História da Arte.
O curioso é que ele já havia feito essa proeza com suas duas outras paixões: O Fortaleza Esporte Clube (Loucos de Futebol) e as artes marciais (Sunland Heat – No Calor da Terra do Sol e os dois Shaolin, claro).
Diretamente de Lisboa, em Portugal, onde o filme está sendo rodado, Halder falou com exclusividade ao O POVO Online. Na entrevista, o cineasta revela como nasceu a ideia do projeto, a preparação para o roteiro (que também leva sua assinatura, assim como o argumento), como se deu a escolha do elenco principal e o que significa essa guinada estética em sua carreira. O POVO Online traz também com exclusividade uma foto-galeria com quadros pintados por Halder e outra com os testes de luz e maquiagem.
O POVO – Como você define Vermelho Monet?
Halder Gomes – É uma história que transita pelo paradoxo da relação da finitude do artista e a permanência da sua obra.
OP – Como surgiu a ideia desta história?
Halder – Este filme surgiu no inconsciente na mesma época em que Cine Holliúdy se formou no meu imaginário, na infância, no interior, na década de 1970. Adorava folhear enciclopédias e sempre me encantava com as imagens das pinturas clássicas que mais pareciam fotos. Desde então a pintura nunca mais saiu do meu imaginário e cotidiano. Pirava nos livros de história e não me saía da cabeça que tudo que o ser humano conhece visualmente da idade da pedra à popularização da fotografia, vem da retratação dos artistas. São milhares de anos representados por estas visões. É algo incrível de se pensar. E isso era o que mais me intrigava. Como desenho e pinto desde criança - e é o que mais gosto de fazer na vida -, o desejo de falar desse universo foi crescendo até o ponto de se tornar inevitável.
OP – Em que momento da produção se encontra o projeto?
Halder – Começamos a filmar nesta segunda-feira (23). É um projeto que passou anos “latente”, até que Mayra Lucas, a produtora, leu o roteiro e viu ali uma história potente, de pulsante autoralidade, que precisava ir às telas. Estamos filmando agora em Lisboa, mas também teremos sequências filmadas em Paris (França) e Londres (Inglaterra).
OP – O filme tem atores consagrados como Chico Diaz e Maria Fernanda Cândido. Como foi a escalação do elenco?
Halder – Foi um elenco desafiador, pois procurava um ator que também fosse pintor; e o Chico Diaz, além de um grande ator que todos conhecemos, é um exímio artista plástico. Era preciso conhecer a sensação de pintar com o desejo que os grandes pintores faziam. O filme traz também uma atriz estreante, Samantha Heck Müller. Foi uma grande pesquisa da produtora de elenco (Alê Tosi), onde, através de vários testes, encontramos a atriz com o perfil específico: ruiva natural, olhos verdes, sardas, pele cor de leite. É um ponto estético crucial no filme, portanto não poderia desistir ou tentar caracterizar. Insistimos até os 47 minutos do segundo tempo. E nesse processo de casting, Maria Fernanda Cândido leu o roteiro e ficou encantada. Eu estava em Lisboa vendo locações, e ela voou de Paris até lá para falarmos mais sobre o projeto; é num momento como este que passamos a ter noção do potência da história que escrevemos. São personagens complexos e desafiadores para qualquer ator/atriz. Além do elenco brasileiro, teremos também atores de Portugal, Angola e Cabo Verde.
OP – Você fez alguma preparação especial para escrever o roteiro?
Halder – É uma pesquisa ao longo da vida mesmo. Além de pintar desde criança, leio compulsivamente sobre pintores, pinturas, mercado de artes, etc. Vejo milhares de quadros por ano em visitas a dezenas de museus. É o que mais faço e onde passo a maior parte do meu tempo. Vou para lugares onde viveram pintores que me interessam para estudar a luz do local e entender o que eles viram e o que os inspiraram. Ano passado passei o réveillon absolutamente só – não havia um ser vivo nas ruas da cidade -, em Auvers Sur Oise (França), diante da igreja em que Van Gogh pintou em seus últimos dias. Já fui três vezes em Deflt (Holanda), a cidade de Johannes Vermeer. Um dos últimos tratamentos do roteiro me dei ao luxo de escrever nos cafés parisienses – em Montmartre e Montparnasse -, nas mesmas mesas onde estiveram Picasso, Modigliani, Suzanne Valladon, Soutine, Monet, Peggy Guggenhein, Gertrude Stein etc... São quase 10 anos maturando a história.
OP – Vermelho Monet é uma mudança radical em sua carreira. Pela primeira vez você dirige um projeto que é um drama, um estilo bem diferente dos trabalhos que o consagraram. Por que esta mudança?
Halder – Sim, é uma grande virada narrativa e estética; mas é um universo de grande zona de confiança, pois sob o aspecto artístico o mundo da pintura é minha grande paixão. Quanto a narrativa, nossas vidas em si não são apenas comédia; todos nós lidamos com o riso e a tragédia no cotidiano. A experiência do ofício de realizador nos dá o conhecimento para poder transitar por gêneros e estilos. Algo como um pintor que muda de fase e paleta, mas as tintas são as mesmas. É uma pequena pausa entre os filmes que costumo fazer. Pretendo encaixar mais filmes deste universo dentre os filmes mais comerciais.
OP – Como o filme foi viabilizado financeiramente?
Halder – É uma composição de Lei do Audiovisual, Fundo Setorial, recursos próprios e “tax rebates” de Portugal – co-realização Brasil/Portugal. No Brasil será distribuído pela Pandora Filmes.
OP – Quais suas expectativas para Vermelho Monet?
Halder – A maior expectativa é alcançar o desafio que impus no roteiro. É conseguir ver na tela o filme que se passa na minha cabeça, poder fazer o espectador vivenciar as experiências sensoriais e emocionais que o filme propõe. Se conseguir, sei que será um filme que poderá abrir novas possibilidades para falar mais desse mundo da pintura que tanto me fascina. Quanto ao mercado, é um filme que talvez se posicione no circuito dos filmes de arte; embora eu creio que tem amplo diálogo com um universo mais diversificado.
Veja galeria com quadros pintados por Halder Gomes:
Veja galeria com imagens dos testes de maquiagem e luz do filme: