O costume de celebrar a chegada de um novo ciclo no calendário existe há mais de 4 mil anos. O Ocidente, Brasil incluso, adota o calendário cristão, cujo marco inicial é o nascimento de Jesus, porém, outros povos e religiões adotam outras contagens e costumes diferentes.
"Usar roupa branca e pular sete ondas são legados das religiões afro-brasileiras"
O sincretismo religioso característico do passado histórico do País fez com que as comemorações adicionassem novos personagens, costumes e comidas às festas de Ano Novo. Uma das religiões que mais simbolizam essa mistura é a umbanda. A religião brasileira, nascida no ano de 1907, une elementos do candomblé, espiritismo e catolicismo. Seguidores de Iemanjá costumam passar o Réveillon no litoral para fazer oferendas ou pular as sete ondas, prática compartilhada em todo Brasil.
Entretanto, para a chefe de terreiro do centro espírita de Umbanda General de Brigada e Rainha Pomba Gira, Cirleide Rodrigues, mais conhecida como Mãe Bia, as tradições podem variar em cada terreiro. A rezadeira, curandeira e raizeira guarda em seu espaço pessoal diversas ervas e raízes para realizar os rituais, nos dias 30 e 31, de banhos de descarrego e prosperidade. “Algumas pessoas gostam de ir até o mar e jogar rosas para Iemanjá para fazer os seus pedidos, cada um tem o seu jeito. A nossa maneira é o banho”, afirma.
Segundo ela, os banhos de descarrego e prosperidade são feitos do pescoço para baixo e somente depois da alimentação dos caboclos e caboclas (linha de trabalho de entidades da umbanda que se apresentam como indígenas). “Depois da alimentação, nós fazemos os banhos, onde começamos a colocar a comida, acender velas, cantar e realizar nossos pedidos. Aqui a gente faz com ervas, como o guiné, sal grosso e alho roxo. Já no banho da prosperidade, botamos alecrim, erva doce, semente de anis e umas duas ou três colheres de açúcar”, dá a receita.
A famosa roupa branca também é um legado das religiões afro-brasileiras. De acordo com Mãe Bia, a veste na umbanda significa a paz. “ É onde a gente vai tá purificada para fazer nossos pedidos, até porque umbanda é uma fonte de energia, e a gente deve usá-la para adquirir coisas boas e pedir luz para amigos e fãs”, ressalta. A chefe também explica que outro costume é o pulo das sete ondas. “Também é um descarrego. Quando tudo tá muito ruim, você toma o banho das sete ondas sai e não olha para trás”, ensina.
No islamismo, o calendário é diferente do utilizado no ocidente, a data da comemoração nem sempre coincide. Ele é lunar, ou seja, móvel, diferentemente do calendário gregoriano “padrão”, que é solar. Segundo o Sheikh Jihad Hammadeh, vice-presidente da União Nacional das Entidades Islâmicas (UNI) e conselheiro religioso da Associação Nacional de Juristas Islâmicos (Anaji), o calendário islâmico marca o ano de 1441 e teve como marco inicial a migração do profeta Muhammad de Meca para Medina-hijra. “Foi um marco zero, porque depois disso foi instituído o poder islâmico em Medina. Diferente aqui do ocidente, nosso calendário é lunar, é mais curto, tem 29 ou 30 dias”, explica.
De acordo com Sheikh Jihad, embora participem das festividades no Brasil e restante do ocidente, os muçulmanos não possuem a passagem de ano como uma festividade religiosa. “Fazemos palestras, mas não uma festa. Porém, por estarmos no Brasil e numa sociedade com maioria não muçulmana, onde é uma comemoração comum, a gente aproveita o feriado, fala feliz ano novo, vê os fogos, porém como festividade e religiosa não a temos”, ressalta.
No judaísmo, a comemoração do ‘Rosh Hashaná’ acontece no primeiro e segundo dia do calendário judeu e, diferente do cristão, não se baseia no nascimento de Jesus Cristo. Em 2019, a celebração começou ao pôr do sol na véspera de 1º de Tishrei (29 de setembro de 2019) e terminou após o anoitecer em 2 de Tishrei (1º de outubro de 2019).
Segundo informações de fonte ligada à Sociedade Israelita do Ceará, os dias são feriados religiosos e possuem várias atividades. "Fazemos cerimonias nas sinagogas com leituras específicas. São dias alegres, de comemorações, refeições festivas e reuniões entre famílias", conta. Segundo as tradições judaicas, o momento marca o início de um período de dez dias, com fim no ‘Yom Kipur’ ou Dia do Perdão. Por esse período, os judeus devem refletir sobre o ato do perdão perante as pessoas e Deus.
O ponto principal do Rosh Hashaná é o toque do shofar (chifre de bode), que desperta as pessoas para o arrependimento. "Ele é um instrumento religioso muito antigo que era usado pra reunir o povo", explica.
Ainda que a religião budista tenha vários rituais diferentes da cultura ocidental, os praticantes comemoram as festas de Ano Novo normalmente. A data, inclusive, é muito importante para a religião, pois é quando os objetivos devem ser renovados no novo ano que se inicia.
No dia 1º de janeiro, os budistas realizam o Gongyo de Ano Novo (capítulo da sutra de lótus que os praticantes rezam todos os dias de manhã e à noite), que é um encontro onde os praticantes se reúnem para rezar e celebrar o novo ano.
Segundo a Associação Brasil Soka Gakkai Internacional (BSGI), os budistas avaliam o que foi feito no ano anterior para poder renovar os objetivos para o próximo ano. Na ocasião, são feitas escrituras em papéis e orações do mantra principal —Nam Myoho Renge Kyo— além de mentalização dos objetivos.