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Mara Beatriz: TRANSformar-se
Opinião

Mara Beatriz: TRANSformar-se

Em artigo, a jornalista Mara Beatriz, voluntária na ONG Mães Pela Diversidade, descorre sobre o orgulho de ser mãe de uma menina trans
Edição Impressa
Tipo Notícia
Mara Beatriz é jornalista e integrante da ONG mães pela diversidade (Foto: Arquivo pessoal)
Foto: Arquivo pessoal Mara Beatriz é jornalista e integrante da ONG mães pela diversidade

O ano era 2017. Havia 12 anos eu tinha vivido o momento mais especial da minha vida, me tornado mãe. O que eu não sabia, até então, é que a maternidade ainda me reservaria tanta surpresa, medo, luta, orgulho e um amor tão grande que iria ultrapassar em muito a existência do meu próprio e único rebento pra alcançar tantas outras vidas. Numa conversa franca, meu filho abriu o coração e me disse que não era um menino, mas uma garota trans. Duas palavras resumem o que senti nesse momento: surpresa e medo.

A surpresa diante do novo que se apresentava: ele nunca tinha se mostrado como a sociedade rotula, “afeminado”. E o Medo, com M maiúsculo, da violência. Aquele ano foi um dos mais cruéis para pessoas trans, especialmente travestis. O ano em que brutalmente assassinaram Dandara, Érika Isidoro e tantas outras.

Peguei na mão da minha filha, uma menina que estava nascendo ali, na minha frente, me oferecendo uma maternidade nova, cheia de desafios e de muito, muito amor e orgulho. Não havia como não me emocionar diante de tanta coragem e brilho no olhar. Não cabia ali contestações, só apoio, respeito e uma certeza: seguiremos juntas!

Muitas etapas vieram. Contei à família e ao mundo, através das redes sociais, sobre a transição. Buscamos acompanhamento de vários profissionais, psicólogo, endocrinologista, advogado (para conhecer e fazer valer os direitos dela)... Traumas e lutas também fizeram parte da nossa história: uma expulsão da escola por transfobia, o caso ganhando os noticiários, a volta por cima com o apoio público e jurídico (mas também com muitas “pedradas virtuais”).

Fui acusada de coisas horríveis, xingada e até ameaçada, mas sempre soube que estava fazendo o que era certo. O que cabe a uma mãe senão o amor? Senti que eu era uma leoa, que mesmo às vezes cansada ou ferida, estaria sempre em guarda para defender sua cria. Tornei-me mãe de muitos outros ao me engajar no coletivo “Mães pela Diversidade”.

Minha filha fez de mim um ser humano melhor, mais empático, mais sensível, mais guerreiro. Todos os dias eu cresço e TRANSformo-me com ela. Às mães e pais que têm filhos que fogem à cisheterormatividade, digo: ignorem os rótulos, rasguem as cartilhas, descubram o amor irrestrito e transformem-se também.

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