Completa um ano nesta sexta-feira, 31, triplo homicídio que vitimou pai, mãe e filho no bairro Jacarecanga. O inquérito que apura o caso, porém, segue em andamento. A suspeita é de que o crime tenha relação com dois outros homicídios, ocorridos também no dia 31, mas no bairro Barra do Ceará; e no dia 3 de fevereiro de 2019, no bairro Planalto Ayrton Senna. Hipótese levantada pela Polícia Civil é de que os três crimes tenham sido cometidos por um suposto grupo de extermínio, a que policiais militares fariam parte.
Por esses dois últimos crimes, um soldado da PM foi acusado. Luis Mardônio Moraes da Silva é réu pela acusação de matar Samuel Peixoto de Moraes. A vítima foi morta após ser abordada no momento em que entrava em um motel, com mais quatro pessoas, no Planalto Ayrton Senna. Conforme denúncia do Ministério Público Estadual (MPCE), os assassinos se identificaram como policiais civis, pediram celular e documento do grupo e cometeram o crime após uma das vítimas pedir o aparelho de volta. Uma outra pessoa foi baleada, mas sobreviveu.
No último dia 12 de dezembro, o MPCE ofereceu denúncia contra o PM referente à morte de Adenilton Gadelha dos Santos, crime ocorrido em 31 de janeiro de 2019. Conforme a acusação, a vítima estava em casa, junto com sua família, quando, por volta das 5 horas, cerca de cinco homens encapuzados invadiram a residência e o mataram a tiros. Antes da execução, um deles teria dito "tu responde a homicídio". Antes de empreenderem fuga, um dos autores pegou o celular da vítima e gritou: “aqui é CV”, em referência à facção criminosa Comando Vermelho.
Este último crime ocorreu cerca de 20 minutos antes do triplo homicídio na Jacarecanga. Conforme a Polícia Civil, neste crime, vários homens encapuzados e com coletes à prova de bala invadiram a casa onde as vítimas se encontravam e passaram a efetuar disparos de armas de fogo. As vítimas foram identificadas como Francisco Adriano do Nascimento Gregório, de 37 anos; Janaína Carneiro da Silva, de 32 anos; e Adriandeson Mendes Gregório, de 19 anos. Na hora do crime, duas crianças estavam no local. Elas foram trancadas em outro cômodo pelos assassinos.
As assassinos ainda fizeram pichações na casa que mencionavam a facção Guardiões do Estado (GDE) e prometiam novas ações ("Vai ter mais"). Na região do crime, havia várias pichações em referência ao CV. Francisco Adriano havia saído há pouco da prisão e era monitorado por tornozeleira eletrônica.
As curtas distâncias entre os locais (cerca de 4,5 km) e os horários dos crimes, assim como o modus operandi semelhante, levaram a Polícia Civil a suspeitar da ligação entre os crimes da Barra do Ceará e da Jacarecanga. Ligando os dois casos ao assassinato no Planalto Ayrton Senna está um exame de comparação balística, que apontou que disparos que mataram Adenilton são compatíveis com a arma encontrada com Luis Mardônio. O PM havia sido preso em flagrante ao ser encontrado com o carro que flagrado pelo Sistema Policial Indicativo de Abordagem (Spia) como tendo sido usado no assassinato do Planalto Ayrton Senna. “As investigações [...] acenaram para a possível existência de um grupo de extermínio, do qual o denunciado faz parte", indica, em relatório, a delegada Patrícia Lopes Aragão, da 9ª delegacia do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP).
Outra prova que liga o triplo homicídio a policiais militares é os testemunhos de fontes contempladas pelo Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas. Dois PMs chegam a ser qualificados nos depoimentos. É citado ainda que, dois dias antes do crime, policiais estiveram na casa das vítimas. Além disso, a Polícia Civil cita em inquérito que pessoa “em atitude suspeita” compareceu ao DHPP durante a oitiva das testemunhas protegidas. A pessoa, ainda não identificada, se apresentou na recepção da DHPP como PM.
Apesar disso, ninguém foi indiciado ainda pelo triplo homicídio. Em janeiro último, o MPCE pediu mais 60 dias para conclusão do inquérito. O caso tramita em segredo de Justiça.
Adenilton Gadelha dos Santos é assassinado a tiros dentro de casa. A vítima foi morta na frente da mãe e dos irmãos, de 10, 12 e 16 anos. Testemunha ouvida no inquérito disse que os homens haviam entrado, momento antes, na casa dela, onde fizeram buscas. Câmeras da torre de vigilância da Guarda Municipal no bairro registraram um comboio de quatro veículos circulando na região — inclusive, dois Corsas Classic.
Francisco Adriano do Nascimento Gregório, Janaína Carneiro da Silva e Anderson Mendes do Nascimento são mortos a tiros dentro de casa. Exame de comparação balística não encontrou relação entre a pistola apreendida com Mardônio e os projéteis encontrados no local do crime. Proximidade dos crimes e modus operandi semelhante, porém, ligam caso ao assassinato ocorrido na Barra do Ceará
Samuel Peixoto de Morais é morto a tiros em frente a um motel. Conforme denúncia do MPCE, a vítima estava com outras quatro pessoas em um carro de aplicativo, quando o veículo foi parado por três homens que usavam balaclava. Eles se identificaram como policiais civis e passaram a revistar os ocupantes do carro. Também perguntaram se alguém do grupo tinha antecedentes criminais. Samuel disse que respondia a uma receptação e uma tentativa de assalto, "mas que já tinha acertado com a Justiça", conforme disse uma das testemunhas.
Segundo a defesa de Luis Mardônio há uma "falha grave" no exame de comparação balística usado como prova contra ele. Também são rebatidos o reconhecimento que testemunhas teriam feito e que a própria Perícia Forense já atestou não haver como precisar se o carro usado no assassinato de Samuel Peixoto de Morais é o mesmo usado no crime que vitimou Adenilton Gadelha dos Santos.