Ana Márcia Diogénes é jornalista, professora e consultora. Mestre em Políticas Públicas, especialista em Responsabilidade Social e Psicologia Positiva. Foi diretora de Redação do O POVO, coordenadora do Unicef, secretária adjunta da Cultura e assessora Institucional do Cuca. É autora do livro De esfulepante a felicitante, uma questão de gentileza
Caso de menino brasileiro que perdeu duas pontas dos dedos mostra que essa dor é potencializada por escola que não protege e pelo crescimento da violência contra o imigrante
Se dói imaginar uma pessoa sofrendo por um desses efeitos, imaginem quando todos esses efeitos juntos acontecem com uma criança de nove anos. E pode ser pior: os agressores também são crianças e a tragédia acontece na escola.
Há alguns espaços na sociedade em que nos sentimos, pelo menos para a maioria das pessoas, mais seguros do que em outros. Dentre eles, nossa residência, templos das várias religiões e escolas. Mas, isso não acontece nas escolas em que educadores, ao invés de investigarem quando uma criança reclama ter sofrido bullying, dizem que ela está mentindo.
Entre setembro - quando entrou na Escola Básica de Fonte Coberta, em Cinfães, Portugal - e o dia 10 de novembro, um menino de nove anos sofreu puxões de cabelo, chutes, ficou com o pescoço roxo, foi criticado por não falar o português de Portugal e perdeu as pontas de dois dedos.
A mãe, com dupla nacionalidade (brasileira e portuguesa), cinco dias antes do crime havia voltado a cobrar atitude da escola para coibir as agressões a seu filho. Saiu de lá com a garantia da educadora de que falaria no dia seguinte com os que importunavam seu filho.
Quando as crianças impediram o brasileiro de sair do banheiro e imprensaram a mão dele na porta, a ineficiência da escola portuguesa se revelou.
Ao ponto de a professora dizer que as crianças estavam apenas brincando, de negligenciarem a forma de contar para a mãe, que só soube que as pontas de dois dedos do filho haviam sido decepadas quando as recebeu de um funcionário da ambulância, dentro de uma luva. Sem qualquer cuidado, sem afeto.
São todas crianças. Mas, entre elas, devem ter filhos de pais que propagam a xenofobia e o racismo, entre outros males que deformam mentes. Os que agrediram – assim como a vítima – foram confiados a um sistema de ensino que, além de educar, devia fazer a guarda de suas integridades.
Maldade. Tortura. Bullying. Preconceito. Xenofobia. Racismo. Gordofobia. Descaso. Todos eles juntos na memória física e psicológica de um menino que completou dez anos com a mão enfaixada e a alma enlutada por conhecer tão cedo o ódio gratuito.
Os médicos disseram que a perda das pontas dos dois dedos é irreversível. E no íntimo da criança, vítima da crueldade de outros da sua mesma idade, de quem se espera brincadeiras sadias, o que se tornou irreversível? Este é um assunto que muito me dói: pelas vítimas, pelas crianças mal orientadas por pais que têm preconceito por imigrantes, por escolas que não protegem.
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