Logo O POVO+
A saída do armário de jogadores de futebol: de Justin Fashanu a Josh Cavallo
Foto de André Bloc
clique para exibir bio do colunista

Jornalista formado na Universidade Federal do Ceará (UFC). Foi repórter do Vida&Arte, redator de Primeira Página e, desde 2018, é editor de Esportes. Trabalhou na cobertura das copas do Mundo (2014) e das Confederações (2013), e organizou a de 2018. Atualmente, é editor-chefe de Cidades do O POVO. Assinou coluna sobre cultura pop no Buchicho, sobre cinema no Vida&Arte e, atualmente, assumiu espaço sobre diversidade sexual e, agora, escreve sobre a inserção de minorias (com enfoque na população LGBTQ+) no meio esportivo no Esportes O POVO. Twitter: @andrebloc

André Bloc esportes

A saída do armário de jogadores de futebol: de Justin Fashanu a Josh Cavallo

É fácil perder a perspectiva diante da onda reacionário do mundo. Mas é fato que a sociedade deu passos enormes para a aceitação de pessoas LGBTQIA+ nos esportes nos últimos 40 anos
Australiano Josh Cavallo se assumiu gay na semana passada (Foto: Reprodução / Twitter)
Foto: Reprodução / Twitter Australiano Josh Cavallo se assumiu gay na semana passada

Era 1981 quando um jovem inglês de ascendência nigeriana se tornava o primeiro homem negro a assinar uma transferência de mais de 1 milhão de libras. Justin Fashanu tinha 20 anos quando saiu do Norwich City, onde era destaque e por meio do qual chegou às seleções de base inglesas, indo ao então gigante Nottingham Forest, campeão da Copa Europeia — atual Liga dos Campeões — em 1979 e 1980.

O técnico era Brian Clough, cujo número de taças acumuladas só rivalizava com as polêmicas em que se envolvia. E, segundo consta, Fashanu não era lá dos mais disciplinados. Uma base frágil, uma transferência milionária e um deslumbramento que já foi visto tantas vezes no futebol mundial. Acontece que, dizem relatos da época, o jovem jogador frequentava boates e clubes gays durante as noites. O baixo desempenho e os boatos de homossexualidade azedaram a relação. Quando a questão sexual foi confirmada internamente, Fashanu foi proibido de treinar com a equipe.

De lá, rodou por clubes profissionais cada vez menores até entrar no semiamadorismo. Em 1990, ele fez história ao se assumir gay. Ele tinha 29 anos e vendeu a história para um tabloide inglês, que publicou ainda que ele alegava ter tido um caso com um congressista conservador. Uma semana depois, John, irmão dele, declarou que Justin fora proscrito pela família. 

Apesar de alegar ser aceito por colegas, Justin dizia que ouvia piadas nos vestiários. Nas ruas era pior. Ele acabou se mudando para os Estados Unidos. Em 1998, um rapaz de 17 anos acusou o atleta de agressão sexual. Um mandado de prisão foi expedido, mas Fashanu não foi encontrado.

Menos de um mês depois, a história trágica se encerrava em suicídio, com Fashanu escrevendo que o encontro sexual havia sido consensual e ele esperava provar a inocência com o ato desesperado.

Esse é o resumo da história do primeiro homem a se assumir gay no futebol mundial. Ela não é feliz, mas ela não pode ser apagada.

Outros vieram depois, com vivências bem menos trágicas. A maioria saía do armário logo após o anúncio da aposentadoria. Foi assim com o norueguês Thomas Berling, com os norte-americanos David Testo e Robbie Rogers (este voltou aos campos anos depois) e com o alemão Thomas Hiltzperger — o mais bem sucedido entre os gays assumidos do futebol.

Falo de Fashanu não para resgatar aquele tropo do cinema mundial, o "bury your gays" ("enterre seus gays", em que os queers sempre acabam morrendo na dramaturgia). Relato isso para mostrar que a sociedade evoluiu.

Aos 21 anos, o australiano Josh Cavallo, do Adelaide United, se assumiu publicamente em um vídeo emocionante e doloroso. A própria equipe dele divulgou a saída do armário. Desde então, ele recebeu apoio público de diversos jogadores. Piqué, Griezmann, Varane, Ferdinand, Ibrahimovic, Rashford, Lingard, de Gea e Giroud foram retuitados por ele. Além de clubes, federações, apresentadores. O Vasco da Gama e o atacante Germán Cano também mandaram mensagem.

 

Diante de tanta gente sem caráter tendo visibilidade por ser homofóbico, a gente precisa ter perspectiva. A sociedade precisa aprender com os erros e evoluir. Ainda tem muita luta pela frente. Por hoje, permito-me celebrar.

Fashanu estava só. Esteve só provavelmente a vida toda. Cavallo, não. Seja bem-vindo, Josh.

Foto do André Bloc

Ôpa! Tenho mais informações pra você. Acesse minha página e clique no sino para receber notificações.

O que você achou desse conteúdo?