Boris Feldman é mineiro, formado em Engenharia e Comunicação. Foi engenheiro da fábrica de peças para motores Metal Leve e editor de diversos cadernos de automóveis. Escreve a coluna sobre o setor automotivo no O POVO e em diversos outros jornais pelo país. Também possui quadro sobre veículos na rádio O POVO/CBN
Foto: Divulgação/BYD
Frente do BYD Song Plus Premium
Nos meus quase 60 anos de jornalismo especializado, nunca fui tão assediado por leitores (e seguidores...) em dúvida sobre qual automóvel adquirir. Pois, até o início desta década, o problema era entre um sedã e um SUV, ou entre um importado e um nacional. Hoje, além destas, somam-se as questões conceituais levantadas pela eletrificação. Aderir à bateria ou manter-se fiel à gasolina. E, se a opção cair num eletrificado: híbrido puro, plug-in ou elétrico?
A eletrificação não trouxe apenas uma alternativa energética, mas em seu vácuo, a súbita presença de várias marcas chinesas desconhecidas no Brasil e no mundo.
E nosso mercado, com um potencial que se destaca e estratégico em termos globais, revelou-se altamente atrativo para as chinesas. Com articulações políticas e verbas bilionárias, elas desembarcam com apetite, compram fábricas abandonadas (Ford e Mercedes) e estabelecem parcerias com outras ociosas (Mitsubishi, Renault).
A situação é excelente sob a ótica do consumidor, que passou a contar com mais uma dezena de marcas de produtos de qualidade, design, tecnologia e preços competitivos. A ele não interessa se o acesso mais fácil a um carro com todos estes quesitos seja talvez resultado de subsídios de um governo “comunista” do outro lado do planeta.
É quase inacreditável a rapidez com que o brasileiro derrubou os padrões de fidelidade às marcas tradicionais e migrou para as desconhecidas BYD e GWM. Ele quer um carro bom, bonito e elétrico para estar em dia com o mundo e sair bem na foto.
O sucesso dos novos players asiáticos acabou reformulando o tabuleiro de xadrez da nossa indústria automobilística, e que agora, além de brigar contra baixos volumes de vendas, impostos entre os maiores do mundo, “Custo Brasil”, baixo poder de compra e oscilações de juros que influem no crédito, tem pela frente a temida concorrência chinesa.
As fábricas da BYD e GWM planejam produzir volumes substanciais, nada menos que 100 mil veículos anualmente cada. A GWM começa em julho. A BYD só deve começar a produção no fim de 2026. Já passou por contratempos nas obras das novas instalações e pretende uma suspeita redução nos impostos para produzir no regime SKD (só montagem de componentes importados), mas anuncia volumes ainda superiores aos da GWM dentro de dois a três anos.
Geely e GAC estabeleceram parcerias com a Renault e Mitsubishi para aproveitar a capacidade ociosa de ambas no Paraná e Goiás. Já está anunciada também a famosa marca inglesa MG, comprada pela chinesa SAIC.
Duas outras já iniciaram vendas: a Omoda/Jaecoo (que pertence à poderosa Chery) e a Zeekr (da Geely, dona também da Volvo e Lotus). E ainda mais duas que virão acopladas à Stellantis (Leapmotor) e à VW (XPeng). Fora Caoa Chery e JAC, há anos no mercado brasileiro.
Só as newcomers representam, a médio prazo, um acréscimo de 300 mil carros anualmente. Questão curiosa: se os carros chineses oferecem alto padrão de qualidade e modernidade por preços competitivos, os impostos de importação não irão travar seus planos.
Entretanto, as previsões de crescimento das vendas domésticas (com as limitações do nosso mercado) não comportam este volume adicional. Ou seja, cada carro de origem chinesa vendido aqui representa uma unidade a menos nas estatísticas das montadoras tradicionais. Que, através de sua associação (Anfavea), buscam todos os argumentos para brecar este avanço.
Um deles coloca o governo federal diante de uma encruzilhada: qualquer pedra que mover no tabuleiro para facilitar as chinesas e estimular a modernização do setor, significa uma pedra no sapato de montadoras e fornecedoras locais, com redução de empregos e rentabilidade.
Faz contraponto à Anfavea a associação dos veículos elétricos, a ABVE, que reúne as empresas envolvidas com a eletrificação veicular, as chinesas entre elas. Existe um risco ponderável, pela postura de cada entidade, de que, se a Anfavea não avaliar com cuidado seus passos, vir a ser taxada de defensora do passado, enquanto a ABVE navega pelos mares da modernidade.
O protecionismo defende empregos, mas desestimula o desenvolvimento tecnológico e o alinhamento da nossa indústria com as do Primeiro Mundo.
E agora, José?
A invasão chinesa elevou nossas importações e desequilibrou a balança comercial que já sofria com as dificuldades de nossas exportações. Nossos modelos não conseguem competir no exterior por sua inferioridade tecnológica. E agora menos ainda pois os próprios chineses avançam em mercados que já foram nossos fregueses. Se ficar, o bicho pega, se correr....
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