"Para Todos os Garotos" encerra de forma correta, mas sem brilho inicial
João Gabriel Tréz é repórter de cultura do O POVO e filiado à Associação Cearense de Críticos de Cinema (Aceccine). É presidente do júri do Troféu Samburá, concedido pelo Vida&Arte e Fundação Demócrito Rocha no Cine Ceará. Em 2019, participou do Júri da Crítica do 13° For Rainbow.
"Para Todos os Garotos" encerra de forma correta, mas sem brilho inicial
Parte final da trilogia de sucesso "Para Todos os Garotos", "Agora e Para Sempre" aposta em resolução redonda da relação de Lara Jean e Peter, mas sem o brilho do filme inicial
A trilogia audiovisual "Para Todos os Garotos", inspirada na série de livros de Jenny Han, chegou à Netflix em 2018 com "Para Todos os Garotos Que Já Amei", longa que trouxe consigo ares de novidade - não exatamente por inovações de trama e gênero, mas especialmente por lidar com clichês da comédia romântica adolescente de forma inspirada e bem-humorada. A parte final, "Agora e Para Sempre", chegou à plataforma na semana passada e encerra a trama de maneira redonda, mas rendida aos clichês com os quais a série fazia graça anteriormente.
No filme de estreia da saga, conhecemos Lara Jean (Lana Condor), adolescente que nunca namorou e encontra em tramas literárias as referências de amor. Da infância à juventude, acumula paixonites secretas e platônicas que elabora em cartas - que nunca quis de fato enviar - escritas a cinco meninos por quem já se apaixonou. Quando os destinatários recebem, sem seu consentimento, as correspondências, a trama se desenrola como uma comédia de erros que brinca com clichês do gênero, aposta na metalinguagem e traz frescor à conhecida fórmula.
A previsibilidade dos caminhos de roteiro nunca foi um problema em si justamente pela forma com que o primeiro filme operava um tema e uma forma "batidos". O tanto que ele soava fresco e inovador é o tanto que a trilogia veio perdendo, a cada filme, tal caráter diferenciador. "Agora e Para Sempre" entrega conclusões redondas, mas sem a graça inicial.
Nele, Lara Jean está no ano final da escola e precisa lidar com o futuro. Firme com Peter (Noah Centineo) após desafios no relacionamento - a segunda parte, "P.S. Ainda Te Amo" é focada nesses problemas -, ela antevê a possibilidade de uma separação no horizonte. Isso porque o casal combina de tentar uma vaga na mesma universidade, mas Lara precisa enfrentar a insegurança de não ser aceita na instituição e um desejo latente de arriscar outros caminhos.
Muito pelo caráter de conclusão de trama, "Agora e Para Sempre" se desenrola avolumando problemas e resoluções para as personagens de forma seguida. Qualquer tropeço que aparece no filme será facilmente contornado, superado ou resolvido porque, enfim, não haverá continuidade e o filme não deixa lugar para finais abertos.
O contexto geral da trama da parte final da trilogia é interessante por apontar questões mais amadurecidas, espelhando o crescimento do próprio público-alvo. Não só as temidas decisões profissionais são tema, mas também os receios acerca da primeira vez e o vislumbre do final da adolescência e do começo da vida adulta. Mesmo que os desenvolvimentos destes pontos tenham aspectos de interesse e diferenciação, "Agora e Para Sempre", no todo, acaba se tornando refém dos clichês do gênero, ao invés de retorcê-los como fazia anteriormente de modo inspirado.
Um exemplo frontal disso é o papel da obviedade na trama. Desde o primeiro filme, não havia muitos segredos ou surpresas em relação ao desenrolar da história de amor de Lara Jean e Peter. Era tudo óbvio, sim, mas de uma forma que agregava à obra por estabelecer comentários discursivos e visuais sobre a construção do amor romântico em obras de ficção, numa bem-vinda jogo de referências e autorreferências - o filme tanto brincava com cenas e dramaturgias icônicas de romances conhecidos do público como, especialmente, brincava consigo mesmo e suas próprias escolhas.
No longa final, porém, os caminhos da história são óbvios de forma menos interessante e esperta. Uma conversa entre Lara Jean e Peter no primeiro quarto do filme já indica, por exemplo, a trajetória que um problema central da obra irá percorrer no decorrer das quase duas horas de duração. A obviedade vira previsibilidade.
Momentos mais inspirados, que acabam lembrando o primeiro segmento, até aparecem em "Agora e Para Sempre", como a sequência em que Lara Jean e Peter conversam diretamente sobre filmes de comédia romântica e sua estrutura. São, porém, menções pontuais ao que o primeiro longa da trilogia fazia de melhor: comentar clichês do gênero apostando justamente na utilização deles. A trama termina bem, de forma redonda, satisfazendo os fãs. É tudo correto, como manda o figurino - e talvez esse seja o problema.
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