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74ª Festival de Cannes começa nesta terça com pouca presença latino-americana
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João Gabriel Tréz é repórter de cultura do O POVO e filiado à Associação Cearense de Críticos de Cinema (Aceccine). É presidente do júri do Troféu Samburá, concedido pelo Vida&Arte e Fundação Demócrito Rocha no Cine Ceará. Em 2019, participou do Júri da Crítica do 13° For Rainbow.

João Gabriel Tréz arte e cultura

74ª Festival de Cannes começa nesta terça com pouca presença latino-americana

Após ter sido cancelado em 2020 por conta da pandemia, Festival de Cannes abre hoje com 24 filmes em competição, forte presença europeia e Brasil no júri e mostras paralelas
Tipo Análise
Filme de Karim Aïnouz, 'Marinheiro das Montanhas' mostra viagem do cineasta a Algéria, país natal do pai, acompanhado de memórias da mãe, Iracema
 (Foto: fotos divulgação)
Foto: fotos divulgação Filme de Karim Aïnouz, 'Marinheiro das Montanhas' mostra viagem do cineasta a Algéria, país natal do pai, acompanhado de memórias da mãe, Iracema

Diretor do Festival de Cannes, Thierry Frémaux afirmou em entrevista ao site estadunidense IndieWire em 1º de junho - dois dias antes do anúncio da seleção oficial - que Cannes estava "se adaptando para continuar sendo o maior evento do mundo". Em 3 de junho, após a divulgação dos filmes, a crítica peruana Mónica Delgado escreveu no Twitter: "Pouca presença latino-americana (...). A pandemia voltou a centralizar o cinema para territórios antigos". As duas ideias dizem bastante sobre a retomada do festival em 2021, após a edição cancelada em 2020.

Chama atenção na seleção oficial desta 74ª edição a massiva participação de produções francesas e europeias na competição principal, formada por 24 obras. O fato não é em si novidade, mas é possível que tenha sido intensificado pelo contexto de restrições sanitárias. Em que pesem os cenários de dificuldade de produção em países latino-americanos como o próprio Brasil e o Peru, a ideia que desponta é a de um gesto curatorial que privilegia a seleção de filmes cujas cineastas e equipes possam participar presencialmente do festival - em nota paralela, até a cobertura midiática da região será diminuta pela impossibilidade prática de viajar para outros países.

Dirigido pelo cineasta Mahamat-Saleh Haroun, o drama 'Lingui' está na competição principal da 74ª edição do Festival de Cannes(Foto: Mathieu Giombini / divulgação)
Foto: Mathieu Giombini / divulgação Dirigido pelo cineasta Mahamat-Saleh Haroun, o drama 'Lingui' está na competição principal da 74ª edição do Festival de Cannes

Levando em conta que a nacionalidade de um filme é um conceito menos fechado por conta das coproduções, é possível contar um total de 18 obras da competição oficial que trazem a França nos créditos de produção, por exemplo, sendo 10 delas majoritariamente francesas - por terem o nome da nação à frente das outras, indicando maior participação.

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Incluem-se neste segundo grupo obras "essencialmente" francesas como o novo filme de Bruno Dumont, inequivocamente intitulado "France", mas também "Lingui", de Mahamat-Saleh Haroun - uma produção filmada no Chade, país que foi colônia francesa do século XIX até a independência em 1960.

Somente sete dos 24 filmes em competição são majoritariamente não-europeus - incluindo dois dos EUA e um do Japão - e é neste grupo minoritário que se encontra a principal presença latino-americana da competição: "Memoria", longa filmado na Colômbia pelo tailandês Apichatpong Weerasethakul e protagonizado pela britânica Tilda Swinton. É a primeira obra do diretor fora do país natal, numa decisão política tomada por ele há pelo menos sete anos, uma vez que a Tailândia sofreu um golpe militar em 2014.

O tailandês Apichatpong Weerasethakul apresenta em Cannes o longa 'Memoria', filmado na Colômbia com a britânica Tilda Swinton no elenco(Foto: divulgação)
Foto: divulgação O tailandês Apichatpong Weerasethakul apresenta em Cannes o longa 'Memoria', filmado na Colômbia com a britânica Tilda Swinton no elenco

Como aponta o crítico argentino e delegado geral de Cannes para a América Latina Diego Lerer em entrevista à AFP, a participação da região nas coproduções não necessariamente "compensa" a ausência. "Há coproduções técnicas, nas quais um país põe dinheiro e não participa dos conteúdos", explica, e outras como a de "Memoria", obra descrita por ele como "muito colombiana".

Encaixadas no grupo "técnico" descrito por Lerer, podem ser citadas as participações da RT Features, do brasileiro Rodrigo Teixeira, como coprodutora de "Bergman Island", da francesa Mia Hansen-Love, e da mexicana Piano em três coproduções ("Annette", do francês Leos Carax; e também "Bergman Island" e "Memoria").

Alargando-se o escopo, é nas sessões especiais que o Brasil encontra o único longa do País da seleção oficial: o documentário "Marinheiro das Montanhas", do cearense Karim Aïnouz, um registro de uma viagem do cineasta à terra natal do pai, a Argélia, munido de uma câmera e memórias da mãe Iracema.

A mostra Un Certain Regard, dedicada a descobertas de novos nomes, traz 10 filmes que oportunamente fogem do Norte global entre os 20 selecionados - ainda que muitos sejam cofinanciados por países europeus. No recorte latino-americano, serão exibidas "La Civil" - produção rodada no México pela cineasta Teodora Ana Mihai, nascida na Romênia e radicada na Bélgica - e "Noche de Fuego" - da salvadorenha radicada no México Tatiana Huezo, que tem o Brasil na coprodução. (Com informações da AFP)

'Medusa', de Anita Rocha da Silveira
'Medusa', de Anita Rocha da Silveira

Do júri aos curtas

Apesar da quase total ausência de produções brasileiras - e latino-americanas - na seleção oficial do Festival de Cannes, o País se faz presente em diferentes contextos do evento em 2021.

O diretor Kleber Mendonça Filho compõe o júri oficial da edição, que é presidido pelo estadunidense Spike Lee. Completam o grupo que escolherá os premiados do ano as cineastas Mati Diop e Jessica Hausner, a cantora Mylène Farmer, as atrizes e diretoras Maggie Gyllenhaal e Mélanie Laurent e os atores Tahar Rahim e Song Kang-ho.

Além da exibição do novo documentário de Karim Aïnouz em sessão especial da seleção oficial, há dois curtas que irão competir pela Palma de Ouro do formato: "Céu de Agosto", de Jasmin Tenucci, e "Sideral", de Carlos Segundo.

Além das três obras, outros filmes brasileiros fazem parte de mostras paralelas de Cannes. O curta "Cantareira", de Rodrigo Ribeyro, está na seleção da Cinéfondation, voltada para produções ligadas a processos formativos.

Já a Quinzena dos Realizadores recebe a estreia do novo longa de Anita Rocha da Silveira, "Medusa". Vale citar, ainda, que a mostra Cannes Classics irá exibir versão restaurada de "Orfeu Negro", do francês Marcel Camus, que foi gravado no Brasil, tem música de Tom Jobim e levou a Palma de Ouro em 1959. (João Gabriel Tréz)

 

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