Danilo Fontenelle Sampaio é formado em Direito pela UFC, mestre em Direito pela mesma Universidade e doutor em Direito pela PUC/SP. É professor universitário, juiz federal da 11ª vara e escritor de livros jurídicos e infanto-juvenis
Danilo Fontenelle Sampaio é formado em Direito pela UFC, mestre em Direito pela mesma Universidade e doutor em Direito pela PUC/SP. É professor universitário, juiz federal da 11ª vara e escritor de livros jurídicos e infanto-juvenis
Um dia desses, conversando com um grande amigo, ele me pontuou que devemos nos esforçar para nos santificar a cada dia.
Sem dúvida alguma, sua intenção foi no sentido de nos aperfeiçoar moralmente, nos elevar espiritualmente e nos comportar com retidão, honestidade e sinceridade, o que evidencia tanto a humildade de nos percebermos imperfeitos, quanto a admissão da necessidade de melhoria contínua.
Entretanto, fiquei pensando: será mesmo positiva essa santidade toda? Não que devamos continuar como pecadores desenfreados, soltos na poeira da iniquidade e desvairados por entre tentações e inconsequências, mas será que uma santidade perfeita nos conservaria humanos?
Digo isso porque a perfeição é tão somente divina e, consequentemente, não é humana. Não sendo humana, quem sabe algumas vezes se torne desumana. Explico melhor: como é que uma pessoa perfeita, sem máculas, fraquezas ou arrependimentos, se relacionaria com os imperfeitos?
Será que essa pessoa completa em qualidades seria capaz de identificar as dúvidas, temores e debilidades tão comuns a todos? Será que essa pessoa íntegra em equilíbrio emocional e ponderação racional seria capaz de compreender nossas inseguranças e vacilações, nossos tropeços e quedas, nossas falhas e frustrações nas tentativas de sermos melhores?
Uma pessoa que procura ajuda financeira para acomodar melhor um familiar em um leito hospitalar não precisa ouvir de um santo que deve rezar mais, nem que deve aceitar passivamente o que entende ser desígnio de Deus.
Quem procura ajuda, quer ajuda humana, mesmo que imperfeita, passageira ou superficial em comparação com uma palavra imaculada. Sem negar a santidade almejada, as necessidades humanas
precisam de soluções humanas.
A busca pela perfeição é, em si, uma jornada cheia de beleza e aprendizado. Porém, pergunto-me se não seria, paradoxalmente, a imperfeição — tão presente e intrínseca ao ser humano — que nos conecta uns aos outros e nos torna verdadeiramente empáticos.
É curioso perceber que os momentos em que mais nos sentimos próximos de alguém não são aqueles em que mostramos nossas forças, mas sim nossas fraquezas. A dor compartilhada cria pontes, enquanto a perfeição inatingível ergue muros.
Um santo intocável, por mais admirável que seja, acaba distante, nos altares onde os colocamos. Já alguém que erra, que se levanta com dificuldade e, mesmo assim, segue tentando, nos inspira de um jeito diferente: nos lembra que também podemos continuar, mesmo com nossos tropeços.
Se todos fôssemos santos e imaculados, o que seria da compaixão? Afinal, compaixão nasce quando reconhecemos no outro uma luta que também travamos dentro de nós.
Leia mais
Ser humano é ser falho, mas é também, e talvez principalmente, ser capaz de enxergar a falha no outro e abraçá-la, ao invés de julgá-la.
E há ainda outra questão. A perfeição não cansa? Seria possível viver em um estado constante de virtude impecável? Acredito que até mesmo os santos de nossas tradições religiosas viveram dilemas internos e enfrentaram tentações, porque é nesse embate entre o que somos e o que queremos ser que reside o crescimento.
Talvez a questão não seja ser santo ou pecador, mas sim ser... verdadeiro. Verdadeiro em admitir nossas quedas. Verdadeiro em reconhecer que a jornada importa mais do que o destino. E verdadeiro em buscar, sempre que possível, sermos melhores — mas nunca perfeitos. Porque a perfeição nos afasta; a humanidade nos une.
Quem sabe o segredo não seja nos santificar a cada dia, mas sim nos humanizar. Ser santos na intenção, mas humanos na prática. Não demasiados santos, mas santos suficientes.
E, no meio dessa estrada entre erros e acertos, descobrimos algo ainda mais valioso: a aceitação do outro e de nós mesmos, com todas as nossas imperfeições e com toda a nossa capacidade de sermos, de vez em quando, também divinos.
Ôpa! Tenho mais informações pra você. Acesse minha página e clique no sino para receber notificações.