Danilo Fontenelle Sampaio é formado em Direito pela UFC, mestre em Direito pela mesma Universidade e doutor em Direito pela PUC/SP. É professor universitário, juiz federal da 11ª vara e escritor de livros jurídicos e infanto-juvenis
          Danilo Fontenelle Sampaio é formado em Direito pela UFC, mestre em Direito pela mesma Universidade e doutor em Direito pela PUC/SP. É professor universitário, juiz federal da 11ª vara e escritor de livros jurídicos e infanto-juvenis
            Imagina descobrir que aquele colega que você chamava de "CDF esquisito" agora vai ter uma igreja com o nome dele? Pois é. O Carlo Acutis virou santo — e a mãe dele ainda escreveu um livro sobre isso.
Certamente algum colega de escola o invejava e até mesmo fizesse bullying, sem saber que mexia com um santo. Daí, imaginei que ele pudesse escrever algo para Carlo. Quem sabe o santo até responderia.
“Querido Carlo,
Eu sei, já começo errado: chamar de “Carlo” alguém que virou santo deve ser uma heresia pela informalidade celestial. Talvez o protocolo exija algo tipo Vossa Santidade Teen, ou Excelentíssimo Protetor dos Nerds de Deus. Mas enfim… pra mim, você ainda é o garoto do fundo da sala que levava USB com hinos em latim e dividia sanduíche de mortadela junto aos pobres no portão.
Quando te canonizaram, eu dei uma risadinha debochada. Mas no fundo... foi só nervoso mesmo. Porque, meu caro... eu zuei um santo em formação.
Me acostumei tanto a achar que você era só “estranho” — aquele menino quieto demais, gentil demais, religioso demais — que não percebi que você estava, na real, a caminho do altar... e eu, provavelmente, no caminho inverso.
Lembra do dia em que você me emprestou uma caneta e eu perguntei se era "ungida"? Pois é. Você riu. Eu achei que tinha te vencido na ironia. Mas, olhando agora, talvez você só estivesse exercendo o que hoje sei ser: paciência infinita com gente besta. No caso: eu.
E a Marina... Ela gostava de conversar com você nos recreios. Dizia que você “tinha um brilho diferente”. Ela queria alguém que a inspirasse a ser melhor. Eu só queria alguém pra rir das minhas piadas ruins.
O mais estranho é que, mesmo tendo debochado, tirado sarro, virado os olhos a cada vez que você mencionava Jesus... eu nunca consegui te odiar. Porque, no fundo, todo mundo sabia: você era bom. Bom de um jeito que incomodava. Bom de um jeito que parecia injusto. Bom de um jeito que fazia a gente olhar pra si mesmo e pensar: 'e eu... tô fazendo o quê com a minha vida?'.
E agora, com você nos altares, estampado em vitral, com igreja e relíquia e tudo... eu fico pensando: será que dá tempo? Dá tempo de ser menos idiota? Dá tempo de fazer alguma coisa que preste? De, sei lá, parar de rir das coisas certas e começar a corrigir as erradas?
Vai ver esse é o meu milagre pessoal: me arrepender com estilo. E com um pouco de sorte, você intercede aí por mim.
Com respeito tardio (e um restinho de vergonha),
Teu ex-colega de sala — aquele que chamava tua mochila de ‘arca da aliança’”.
Caro amigo,
Antes de tudo: obrigado por escrever. No céu não tem WhatsApp, mas de vez em quando chegam umas cartas assim, vindas direto do coração — e são as que mais tocam por aqui. A sua veio com cheiro de saudade, risada contida e... leve arrependimento. Mistura boa. Mistura humana.
Confesso que achava engraçado quando você me chamava de “Wi-Fi dos anjos”. Você tinha (e tem) esse talento de fazer os outros rirem e o bom humor sempre tem lugar no coração de Deus quando vem da inquietação sincera.
Nunca achei que tivesse brilho algum. Era só reflexo. Reflexo de algo muito maior que passava por mim e me fazia querer viver certo. Coisa daquelas que só o Espírito Santo sabe fazer passar pela gente sem a gente perceber.
Aliás, você ainda me chama de “santo da internet”, e eu acho ótimo. Porque se tem um lugar onde as pessoas mais precisam de amor e menos sarcasmo, é ali. Você, com seu humor afiado e coração escondido atrás das piadas, pode fazer milagres por lá.
O céu não quer gente perfeita — quer gente disposta. E sim: dá tempo. Dá tempo de rir diferente. Dá tempo de ser menos personagem e mais pessoa. Dá tempo de fazer o bem. O tempo, pra quem quer se tornar melhor, é sempre agora.
Adorei ver seu progresso. Tá escrevendo. Tá olhando pra dentro. Tá rindo de si mesmo sem maldade. Isso já é metade do caminho.
Te espero — sem pressa, claro. Mas te espero.
E, até lá, vou pedindo aqui por você.
Com carinho (e um sorriso de quem lembra das suas imitações horríveis do professor de geografia),
Carlo.
P.S.: A caneta ungida ainda está comigo. Tá ótima. Nunca falhou.
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