Talvez um dos vídeos que eu mais tenha visto na vida, em VHS ou pelo Youtube, seja o registro do "Show Nº 1", transmitido pela Rede Globo em 1992. O especial marcava o reencontro de duas lendas, João Gilberto e Tom Jobim. Em determinado momento, o cantor e violonista olha para o amigo ao piano e dá a deixa: "Vou cantar uma música que acho que o Tom não lembra mais". Tom, atento e sorridente, ouve uma introdução que nasceu 30 anos antes.

Essa introdução remetia a agosto de 1962, na reinauguração da boate Au Bon Gourmet, em Copacabana, que reuniu Tom, João, Vinicius de Moraes e o grupo Os Cariocas. Seria mais uma das muitas apresentações da turma da Bossa Nova se nesse dia não tivesse sido tocada, pela primeira vez, a "Garota de Ipanema". A introdução era uma brincadeira para anunciar a canção que, até então, ninguém poderia prever que faria tanto sucesso.

João - Tom, e se você fizesse agora uma canção que possa nos dizer, contar o que é o amor?

Tom - Olha, Joãozinho, eu não saberia sem o Vinicius escrever a poesia.

Vinicius - Para esta canção se realizar, quem me dera o João para cantar!

João - Ah, mas quem sou eu? Eu sou mais vocês. Melhor se cantássemos os três.

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Para bem da história, duas pessoas gravaram a apresentação. Uma delas foi o advogado Jorge Karam, que registrou em fita o que deveria ter rendido um disco que nunca saiu oficialmente (mas que circula "piratamente" pela Internet). A outra pessoa foi o jovem cantor Pery Ribeiro que, encantado pela garota, decorou versos e melodia, e no dia seguinte correu pro estúdio. Com arranjos de Lyrio Panicalli, a canção foi "roubada" dos seus autores e gravada no disco "Pery é todo bossa", antes mesmo de ter registro em editora.

No ano seguinte, "Garota de Ipanema" recebeu a versão que ganharia o mundo, com o piano de Tom, violão de João, voz de Astrud Gilberto e sax de Stan Getz. Daí em diante, a lista é grande. De Gal Costa a Ultraje a Rigor, de Nat King Cole a Los Hermanos, de Tim Maia a Ella Fitzgerald e Sarah Vaughan, de Al Jarreau a Roberto Carlos, da francesa Jacqueline François à japonesa Noriko Ito, de Zimbo Trio a Negra Li, de Ed Motta a Cássia Eller, de Xuxa a Amy Winehouse.

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Agora chegou a vez de Anitta se inserir nessa lista pra dar prosseguimento ao seu plano de carreira internacional. Fazendo questão de alardear que trata-se do seu clipe mais caro, "The Girl from Rio" começa a viagem na Zona Sul carioca, em Copacabana, berço da bossa nova; cruza até a Zona Norte, em Ramos, berço de uma luminosa geração de sambistas que vieram na cola do bloco Cacique de Ramos, e onde fica o mais famoso piscinão do Brasil; depois vai até o antigo Galeão, hoje Aeroporto Tom Jobim, e pega um voo pro exterior guiado pelo som do Trap, subgênero do Rap. Há quem considere uma afronta misturar os acordes nobres de Tom Jobim com o canto popular de Anitta. Mas o fato é que ela não é a primeira e certamente não vai ser a última a reconhecer que a geração Bossa Nova ensinou ao mundo que é possível, apesar de tudo, ter orgulho de ser brasileiro. Sim, desde que aquela garota passou com seu doce balanço a caminho do mar, a beleza da música brasileira não é mais só de Tom, Vinicius, João ou Pery. É do planeta inteiro.

 

Notas musicais

O músico e produtor cearense Dionísio Dazul lançou mais um single pelo selo paulistano Maxilar, criado por Gabriel Thomaz (Autoramas). "Tentei Até" é uma parceria com o conterrâneo Xavier e celebra uma amizade deles de 20 anos. Com guitarras nervosas, percussão forte e sopros de Daniel Brita, a faixa já tem um lyric vídeo disponível.

O cantor e compositor niteroiense Marcos Sacramento está lançando "Crônicas do Apartamento 20", projeto concebido durante o período de pandemia. Num misto de cinema, videoclipe e performance, ele retrata sensações de solidão, tédio e críticas sociais num filme de pouco mais de 30 minutos. O projeto foi contemplado pela Lei Aldir Blanc.

Em mais de 30 anos de amizade, Zeca Baleiro e Chico César já cantaram e tocaram juntos muitas vezes, mas nunca compuseram juntos. A primeira leva de parcerias nasceu durante o isolamento social. Foram mais de 20 canções, das quais eles tiraram 10 para lançar em um disco previsto para "breve". Uma amostra desse encontro foi lançado essa semana, com os singles "Lovers" e "Respira".

Jà está disponível o segundo volume do projeto "Classix Remix", com estrelas da cena eletrônica recriando a obra de Rita Lee e Roberto de Carvalho. Ao todo, serão 36 faixas divididas em três álbuns e a presença de nomes fortes como Zé Gonzales, Dubdogs, Marky e Tropkillaz. Esta segunda parte tem participação de Beto Lee, filho do casal remixado, e de Apollo 9. A produção e curadoria é de João Lee, outro filho do clã roqueiro.

Músico cearense que integrou a Vanguarda Paulistana, Tiago Araripe abriu financiamento coletivo para produzir seu novo disco. Celebrando os 70 anos do compositor natural do Crato, "Terramarear" tem 10 faixas e participações de Zeca Baleiro, Nonato Luiz, Marcos Lessa e Vânia Bastos. A campanha está sendo realizada pelo site Benfeitoria e as recompensas vão desde faixas inéditas até um jingle personalizado.

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