Logo O POVO+
Ter motivos pra cantar
Foto de Marcos Sampaio
clique para exibir bio do colunista

Marcos Sampaio é jornalista e crítico de música. Colecionador de discos, biografias e outros livros falando sobre música e história. Autor da biografia de Fausto Nilo, lançado pela Coleção Terra Bárbara (Ed. Demócrito Rocha) e apresentador do Programa Vida&Arte, na Nova Brasil FM

Marcos Sampaio arte e cultura

Ter motivos pra cantar

Num período em que o rock nacional precisa de uma terapia de grupo, os Paralamas do Sucesso celebram o longo caminho que os trouxe até aqui. E o segredo para essa união feliz foi focar nos seus dois principais patrimônios: a música e a amizade
Tipo Opinião
Os Paralamas do Sucesso celebram quase 40 anos de carreira em show no I'Music (Foto: Divulgação)
Foto: Divulgação Os Paralamas do Sucesso celebram quase 40 anos de carreira em show no I'Music

São antigas as brigas envolvendo artistas do rock nacional dos anos 1980. Para citar as mais recentes, teve Paula Toller processando Leoni por ter cedido uma parceria para uma campanha do Partido dos Trabalhadores; Paulo Ricardo impedido de cantar as músicas do RPM; e a briga de Giulliano Manfredini, filho adotivo de Renato Russo, contra Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá pelas cifras da Legião Urbana. Se for atrás, o cardápio oferece ainda tretas entre Capital Inicial e seu ex-guitarrista Loro Jones; Roger Moreira (Ultraje a Rigor) e a artista plástica Adriana Varejão; Lobão e todo mundo.

Leia também | Confira mais histórias e opiniões sobre música na coluna Discografia, com Marcos Sampaio

Caminhando ao largo, um certo trio carioca segue fiel aos próprios princípios. Os Paralamas do Sucesso são um caso raríssimo no meio musical: perto dos 40 anos, eles mantém a mesma formação de quando estrearam. E não me refiro só a Herbert Vianna, Bi Ribeiro e João Barone. Quem chega perto desses caras parece encontrar bons motivos para não se afastar. Por exemplo, o tecladista João Fera foi convidado para tocar com a banda em 1987 e permanece até hoje. Maurício Valladares fez as fotos do disco de estreia - "Cinema Mudo" (1983) - e do mais recente - "Sinais do Sim" (2017). Tem ainda os músicos Monteiro Junior, Bidu Cordeiro, Eduardo Lyra, e um tal de Zé.

"Esse disco não seria possível sem o amor do Zé", está nos agradecimentos do disco "Bora Bora" (1988). Zé é o empresário José Fortes, que aprendeu este ofício trabalhando com a banda desde o início. Essa relação de amizade é retratada no filme "Os Quatro Paralamas", disponível na Netflix. A direção é de Pachoal Samora e Roberto Berliner, que também acompanha a banda desde o início. A proposta é simples: Zé, Herbert, Bi e João reunidos numa sala, conversando e relembrando histórias. Colorindo tudo, imagens preciosas de gravações, turnês e momentos de lazer.

E claro que não falta no filme o discurso de Herbert Vianna no primeiro Rock in Rio, criticando quem jogou pedras em Eduardo Dusek por achar que ele não rock o suficiente. "Em vez de vir jogar pedra, fica em casa aprendendo a tocar guitarra. Quem sabe no próximo você está aqui no palco", mandou o guitarrista, à época um estreante em eventos daquele porte. O acidente sofrido por Herbert, a morte de sua esposa Lucy, a recuperação e o retorno da banda é retratado como mais um evento no meio dessa história. Sem sentimentalismos, mas com algumas lágrimas.

Do power trio de baixo, bateria e guitarra à big band, o filme vai captando as transformações sonoras que fizeram deles um dos grupos mais influentes da América Latina. De um início mais radiofônico, passando por uma aproximação com sons da Jamaica e da África, até uma linguagem pop universal e tropical ao mesmo tempo, eles trazem na discografia, pelo menos um clássico ("Selvagem?", de 1986) e duas experiências intrigantes ("Os Grãos", de 1991, e "Severino", de 1994) que, se não foram sucessos de vendas, certamente abriram caminhos sonoros e poéticos.

Pra nossa sorte, os Paralamas do Sucesso não são unanimidade. Há quem goste e quem não veja nada demais. Só não dá mais pra dizer que eles são uma cópia do The Police. Essa época já passou, a banda assume isso sem problemas e até já exorcizou esse fantasma quando tocou "Don't Stand so Close to Me" e "Every Breath you Take" na turnê de 30 anos. De lá pra cá, muita água rolou, muitas influências chegaram e muita coisa mudou. Só não mudaram as razões pelas quais eles fazem música.

João Pedro Foster, colecionador e vendedor de discos na 78 Rotações
João Pedro Foster, colecionador e vendedor de discos na 78 Rotações

A lista de Pedro Foster

João Pedro Foster, colecionador discos, considera "O Passo do Lui", segundo disco da carreira dos Paralamas do Sucesso (1984), o melhor disco de rock nacional dos anos 1980. A pedido da Coluna, ele que é vendedor na 78 Rotações (@78rotacoesdiscoseaudio), loja de LPs localizada no Cantinho do Frango, seleciona - com muito esforço - os cinco melhores discos daquela geração. Vamos a eles.

Os Paralamas do Sucesso – O Passo do Lui (1984)

Imagine ser uma banda com três anos de vida, emplacar pelo menos seis hits no mesmo álbum, fazer um show lendário naquele que se tornaria o maior festival de música da América Latina e não ficar com fama de “banda de um disco só”. Os Paralamas do Sucesso conquistaram tudo isso com “O Passo do Lui”, o disco que pavimentou o caminho do trio como uma das maiores bandas do cenário nacional. Músicas como “Óculos”, “Meu Erro” e “Romance Ideal” tornaram-se trilha sonora na vida de brasileiros nascidos na segunda metade do século XX.

Fausto Fawcett e Os Robôs Efêmeros (1987)

Futurista, irreverente, malicioso e fantástico; o debute de Fausto Fawcett apresenta uma zona sul carioca misturada com uma fantasia cyberpunk à la Blade Runner. Todas as faixas do disco apresentam histórias diferentes sobre o ambiente imaginado por Fawcett, “O Rap d’Anne Stark” e “A Chinesa Videomaker” são claros exemplos da genialidade do compositor, apresentadas em melodias que passam pelo rock, rap, disco e até mesmo pagode, como na última faixa, “Juliette”. Definitivamente, um dos trabalhos mais originais já apresentados no rock brasileiro.

Legião Urbana – As Quatro Estações (1989)

O pico criativo do Legião na década de 1980 está nesse disco, músicas como “Há Tempos”, “Feedback Song for a Dying Friend” e “Se fiquei esperando meu amor passar” mostram o claro amadurecimento da banda em relação aos discos anteriores e já criam o caminho que seria seguido no fantástico álbum “V”, lançado dois anos depois. A incrível e melancólica “Pais e Filhos” caiu no desgosto dos mais jovens, mas vale a pena ser revisitada com outra mentalidade.

Violeta de Outono (1987)

Partindo pro meio alternativo, o disco de estreia do Violeta de Outono foca no rock psicodélico das décadas de 1960 e 1970, misturado com o post-punk oitentista, diferenciando-se das bandas da época e ganhando o status de cult. Essa fusão pode ser percebida logo na primeira faixa, “Outono”, solos de guitarra psicodélicos podem ser ouvidos em “Declínio de Maio” o post-punk é forte em “Dia Eterno”, umas das favoritas dos fãs e o disco fecha com um majestoso cover de “Tomorrow Never Knows”, dos Beatles. Com uma trajetória forte no underground, a influência do Violeta pode ser percebida ainda hoje em bandas como Boogarins e Supercordas.

Barão Vermelho – Carnaval (1988)

O disco definitivo do Barão Vermelho sem Cazuza, aqui, Frejat está no auge como vocalista e compositor, o hard rock é o motor principal no álbum, apresentando uma trinca estrondosa logo de início, com a pesada “Lente”, o hit “Pense e Dance” e a divertida “Não Me Acabo” (composição dos titãs Arnaldo Antunes e Paulo Miklos). O sucesso do disco rendeu música em novela, participação em show de astros internacionais e um disco ao vivo. Cazuza ainda está presente como compositor na última faixa do álbum, “Rock da Descerebração”, escrita com Frejat e presente no primeiro disco solo do poeta, lançado três anos antes.

Podcast Vida&Arte
O podcast Vida&Arte é destinado a falar sobre temas de cultura. O conteúdo está disponível nas plataformas Spotify, Deezer, iTunes, Google Podcasts e Spreaker.

Foto do Marcos Sampaio

Ôpa! Tenho mais informações pra você. Acesse minha página e clique no sino para receber notificações.

O que você achou desse conteúdo?