Escreve sobre política, seus bastidores e desdobramentos na vida do cidadão comum. Já foi repórter de Política, editor-adjunto da área, editor-executivo de Cotidiano, editor-executivo do O POVO Online e coordenador de conteúdo digital. Atualmente é editor-chefe de Política e colunista
"Não existem perguntas embaraçosas, apenas respostas embaraçosas", dizia o jornalista e escritor Carl Rowan. A resposta de Jair Bolsonaro foi embaraçosa: "Vontade de encher sua boca de porrada". Por que uma pergunta deixaria o presidente da República com impulsos de encher de porrada a boca de um profissional cujo papel é fazer questionamentos?
A pergunta foi: "Presidente, por que a sua esposa recebeu R$ 89 mil do Fabricio Queiroz?" Qual a razão para tal questionamento despertar impulso violento no presidente?
Uma coisa que muita gente no poder e no público não entende: o dever do jornalista é o de incomodar. Fazer os questionamentos justamente que os governantes não querem que sejam feitos.
As respostas às perguntas que desconcertam o presidente
As movimentações financeiras entre Queiroz e a família Bolsonaro já levantam suspeitas há bastante tempo. São muito estranhas, mal explicadas. A suspeita fica maior. A pergunta se justifica mais. Qualquer pessoa deveria ter interesse na resposta. Alguém que acredita na honestidade do presidente deveria ter mais ainda. Bolsonaro deveria ser o mais interessado em esclarecer, no caso de ter uma explicação dentro da legalidade.
Não é a primeira vez que o assunto tira o presidente do sério. Em outubro de 2019, uma pessoa da plateia de apoiadores perguntou onde estava Queiroz. "Tá com sua mãe", disse o presidente. Em dezembro passado, repórter perguntou como ele agiria se o senador Flávio Bolsonaro tiver cometido alguma irregularidade. "Você tem uma cara de homossexual terrível, mas, nem por isso, te acuso de ser homossexual", reagiu o presidente. Na mesma entrevista, Bolsonaro disse que repassou R$ 40 mil à mulher, por meio de cheques de Queiroz. Questionado sobre comprovantes, Bolsonaro saiu-se: "Porra, pergunta para a tua mãe o comprovante que ela deu pro teu pai, tá certo?" Um estadista.
Em janeiro, indagado sobre contratos da empresa do secretário de Comunicação Social, Fabio Wajngarten, Bolsonaro reagiu: "Você está falando da tua mãe?" e também: "Cala a boca, sai fora". Em maio, questionado sobre agressões a jornalistas em manifestações, voltou a dizer: "Cala a boca". O presidente tem reações de quem não saiu da 5ª série.
Nada justifica
Houve ontem um debate ridículo nas redes sociais, sobre os motivos do presidente. Tentou-se justificar o injustificável. Espalhou-se que o repórter teria dito: "Vamos visitar sua filha na cadeia". Na verdade, foi um dos apoiadores que se dirigiu ao presidente: "Vamos visitar a nossa feirinha da catedral, presidente". Quem espalhou a versão inventou uma mentira e sabia que estava inventando. Criou a farsa para tentar justificar um absurdo. Isso é coisa de gente perigosa, sem limites éticos.
Depois da mentira desmascarada, começou-se a especular: mas o repórter não provocou? Bem, a quem acusa cabe o ônus da prova. O ponto é: não sei de nada que justificasse o presidente da República ameaçar um jornalista. Se o repórter dissesse que daria um murro no presidente, seria justificável ele reagir daquele modo? Não, deveria acionar os seguranças. Se o cara xinga o presidente, seria o caso de reagir daquela maneira? Não. Que o processasse se fosse o caso. O mesmo se envolvesse a família dele. Nada justifica alguém na posição de Bolsonaro reagir daquele modo.
Esse é o ponto principal: as responsabilidades de presidente da República. Vá lá que seja provocado, irritado, confrontado, xingado, Bolsonaro não pode se trocar por aí. É parte do ônus do cargo para o qual foi eleito. Muitas vezes se tenta justificar reações de Bolsonaro pelo que fazem críticos, opositores, jornalistas. Nem vou discutir o que tenham feito. Ele não está em posição simétrica. Ele é presidente. Precisa entender isso.
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