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Quanto custa pagar bem aos professores no Brasil
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Escreve sobre política, seus bastidores e desdobramentos na vida do cidadão comum. Já foi repórter de Política, editor-adjunto da área, editor-executivo de Cotidiano, editor-executivo do O POVO Online e coordenador de conteúdo digital. Atualmente é editor-chefe de Política e colunista

Érico Firmo política

Quanto custa pagar bem aos professores no Brasil

Mudança de remuneração começa este ano e deve seguir até 2026, com potencial de transformar o interesse que há em se tornar professor
Tipo Opinião
Escola José Nilton Salvino Franco, em Campo Belos, Caridade (Foto: Thais Mesquita/OPOVO)
Foto: Thais Mesquita/OPOVO Escola José Nilton Salvino Franco, em Campo Belos, Caridade

O governador Camilo Santana (PT) sancionou o reajuste salarial de 33,34% para professores da rede estadual, que passará a ser pago na folha de pagamento seguinte, retroativamente a janeiro. Serão contemplados profissionais na ativa, aposentados, pensionistas e temporários. Na Prefeitura de Fortaleza, o aumento de 33,24% já havia sido sancionado pelo prefeito José Sarto (PDT) e já começa a ser pago. O percentual tem por base a lei do piso nacional (número 11738/2008), em função do aumento do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). O índice foi confirmado em portaria do Ministério da Educação.

O percentual é expressivo e causa controvérsia com entidades de prefeitos. Não apenas isso: a perspectiva é de que aumentos semelhantes, e até maiores, ocorram gradualmente nos próximos anos, até 2026. Há um jogo de pressões e forças políticas contrárias que têm poder de fazer barulho. O que está em jogo é, potencialmente, uma das maiores transformações já vistas nas políticas públicas no Brasil.

Por que o aumento é tão expressivo?

A inflação no Brasil é muito elevada, mas não chega a tanto. Então, por que uma categoria de trabalhadores tem reajuste de 33%? O motivo está numa medida que foi aprovada pelo Congresso Nacional em agosto de 2020: o novo Fundeb. Na época, classifiquei como o mais relevante projeto legislativo aprovado no Brasil na década, talvez no século. Desconfio que muitos dos que votaram não tinham a dimensão do que estava sendo decidido.

Basicamente, aumentou-se o dinheiro federal aplicado em educação. E vai aumentar muito mais. Em 2021, primeiro ano de aplicação, a contribuição da União no Fundeb passou de 10% para 12%. Em 2022, passará a 15%. Em 2023, para 17%. Em 2024, irá a 19%. Em 2025, chegará a 21%. Em 2026, atingirá o novo patamar previsto, de 23%.

Ocorre que a lei do piso do magistério estabelece que o reajuste obedece ao "percentual de crescimento do valor anual mínimo por aluno referente aos anos iniciais do ensino fundamental urbano, definido nacionalmente". Quando cresce o repasse do Fundeb, o impacto repercute no salário do magistério. O valor total do Fundeb em 2021 foi de R$ 179 bilhões. Para 2022, é estimado em R$ 236 bilhões.

Por que há resistências

Os professores são a maior categoria do serviço público. A que está mais espalhada, por todos os lugares. Por isso, um aumento mesmo pequeno tem grande impacto nas folhas de pessoal. Prefeituras estão preocupadas, em particular com a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

Acontece que as prefeituras recebem dinheiro federal para pagar esse reajuste. E o aumento de repasse eleva o limite da LRF. O problema é que várias prefeituras já estão quebradas. Não é que vão quebrar por isso. Mas, é o caso de tapar o rombo com repasses do Fundeb?

Há um argumento jurídico. A lei do piso, de 2008, fazia remissão à lei anterior do Fundeb, que foi revogada. Mas, foi revogada não para acabar. Ela foi substituída por nova lei que fortaleceu o instrumento.

A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) há tempos aponta que o piso dos professores cresce muito acima da inflação e defende que esse seja o índice de aumento. Seria um enorme equívoco.

Se for concedida apenas a reposição da inflação, o salário dos professores não sairá do atual patamar, não terá aumento real, não terá mudança do poder de compra. O que se conseguiu com o aumento do Fundeb foi transformar, gradualmente, a realidade dos trabalhadores da educação. Professor é visto como profissional de segunda linha no Brasil, do ponto de vista da remuneração. Muita gente não quer ser professor porque trabalha muito e ganha pouco. Isso pode estar começando a mudar. No Ceará, o salário inicial, a partir de maio, passa a ser de R$ 5.413,18. Professor doutor poderá ganhar até R$ 15.348,17.

Isso significa uma profissão de professor mais atraente, com perspectiva de ter mais e melhores educadores, mais gente interessada em ingressar na carreira. Isso se reflete em todas as áreas da vida brasileira, inclusive na economia, com ganho na qualificação de todo o mercado de trabalho, com pessoas mais bem formadas.

Ao longo deste ano, provavelmente haverá uma disputa política para mudar o entendimento e para que os professores não sigam tendo aumento similar nos próximos anos, até 2026. É uma briga que se propõe a favor dos municípios, mas é contra o Brasil.

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