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No tempo do Dragão
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Escreve sobre política, seus bastidores e desdobramentos na vida do cidadão comum. Já foi repórter de Política, editor-adjunto da área, editor-executivo de Cotidiano, editor-executivo do O POVO Online e coordenador de conteúdo digital. Atualmente é editor-chefe de Política e colunista

Érico Firmo política

No tempo do Dragão

O Dragão do Mar é um marco do fim da minha adolescência e da minha primeira década como adulto. É um marco de Fortaleza, ou foi. Ele completa 25 anos. Não sei se o tempo dele é o passado ou se há presente e futuro
Tipo Opinião
MEMÓRIA, arte, diversão, conhecimento. Em seus melhores momentos, o Dragão do Mar tem tudo (Foto: Samuel Setubal)
Foto: Samuel Setubal MEMÓRIA, arte, diversão, conhecimento. Em seus melhores momentos, o Dragão do Mar tem tudo

O Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura foi inaugurado semanas depois de eu ter feito 17 anos, e mal consigo imaginar o fim da adolescência e início da vida adulta da minha geração sem aquele espaço. Nos tempos de faculdade, chegava a estar lá três, quatro vezes por semana. Até mais.

Quando um conhecido visitava Fortaleza, não havia hipótese de deixar de levá-lo lá. A arquitetura impressionava e as atrações eram o melhor que havia na noite de Fortaleza. Era onde as pessoas mais se encontravam.

Frequentei desde os primeiros tempos. Época de comer macaxeira no Bar da Esquina, jantar um “Chico da Matilde” ao som da Djane no restaurante Dragão do Mar. Assisti a muita coisa boa, e de graça, do projeto “Curta Petrobras às 6”. Fui repreendido por seguranças que não deixavam ficar deitado embaixo do planetário. Li obras boas e, algumas, baratas da livraria Livro Técnico.

Fiz parte da multidão que foi para a exposição do Rodin. Assisti a shows de gigantes, como Hermeto Pascoal, Moraes Moreira, Elza Soares, Chico César, Beth Carvalho. Sábado era dia de samba do Amici’s, onde, inclusive, jornalista com carteirinha da Fenaj não pagava entrada, durante algum tempo.

O Dragão foi uma potência a ponto de agitar tudo que havia a volta dele. No Alpendre, no Alfândega, no Órbita, no HeyHo. Mesmo uma igreja chegou a funcionar ali em frente. Nos tempos de centro acadêmico, a gente até organizou uma festa no Ritz Café, com show de SoulZé.

Tomei chope de vinho no Bexiga, e também vinho barato sentado nos bancos da praça Almirante Saldanha. Mas às vezes ia ao Dragão apenas para jogar conversa fora num começo de noite no Café Avião. Não sei se o Dragão do Mar tem concorrente na relevância como lugar de lazer durante, sei lá, minha primeira década como adulto.

Não me recordo a última vez que recebi um turista em Fortaleza e levei até lá. Nos últimos meses, visitei-o duas vezes. Vi filme, tomei café, fui ao museu, assisti a um espetáculo e visitei a exposição que deu tanto o que falar. Sempre tem coisa acontecendo, e a programação é de qualidade. Mas, chegar e ver o abandono da Almirante Saldanha já é espantoso. Que Prefeitura e Estado se entendam logo sobre mais essa. É triste, também, ver fechado o belo conjunto de casarões, que já foram alguns dos lugares mais frequentados da cidade.

O Dragão tem programação, gente boa envolvida. Mas perdeu, não de agora, o poder de ser a força motriz daquele pedaço de cidade. Talvez sempre tenha sido um fardo pesado demais, que nunca carregou sem alguma exaustão.

Sinceramente, não sei o que é necessário para o Dragão do Mar voltar a ser o que era. Nem sei se é possível. Tampouco sei, na ótima provocação trazida em reportagem do Vida&Arte, se o tempo do Dragão é o hoje ou o passado. Talvez tenha sido um sonho, um delírio maravilhoso. No aniversário de 25 anos, que completa neste domingo, deixo ao Dragão o meu obrigado, e o desejo de um futuro que marque a vida de mais e mais pessoas.

E o que eu sei é que, se alguém me contasse, 15 anos atrás, que o Dragão um dia daria a impressão de desolação, eu responderia: parabéns a quem conseguiu. É um feito e tanto.

A marca do governante

A ideia do Dragão do Mar nasceu no governo Ciro Gomes. A concretização coube ao segundo mandato de Tasso Jereissati. A inauguração ocorreu no terceiro mandato de Tasso. As administrações que se sucederam tiveram diferentes visões para ele. Nunca deixou de sofrer com as mudanças de ênfase e prioridade. No período de Cid Gomes, chegou a padecer, em certo período, com a gestão cultural como todo. É vítima, também, de uma das piores traços das nossas práticas políticas. Cada gestor quer a própria marca, a própria placa inaugural. Algo para chamar de seu e para brilhar. E assim, somam ao currículo o abandono do que veio antes.

Foto do Érico Firmo

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