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Família na política é sinal do atraso do Nordeste?
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Escreve sobre política, seus bastidores e desdobramentos na vida do cidadão comum. Já foi repórter de Política, editor-adjunto da área, editor-executivo de Cotidiano, editor-executivo do O POVO Online e coordenador de conteúdo digital. Atualmente é editor-chefe de Política e colunista

Érico Firmo política

Família na política é sinal do atraso do Nordeste?

A situação não vem de agora e não se restringe ao tribunais de contas nem às esposas. A presença de familiares em cargos se espalha pelo Brasil
Tipo Opinião
PLENÁRIO do Tribunal de Contas do Estado (TCE) do Ceará (Foto: Samuel Setubal)
Foto: Samuel Setubal PLENÁRIO do Tribunal de Contas do Estado (TCE) do Ceará

Na coluna de quinta-feira, 26, escrevi sobre famílias na política no Ceará. Prometi voltar ao assunto ontem, mas só deu hoje — houve uma reforma administrativa estadual no meio. Retorno para acrescentar: não só no Ceará. Esposa ser indicada para tribunal de contas virou tradição entre ministros do governo Lula (PT). Isso feito em sequência vira uma marca, de fato, muito negativa.

Além de Camilo Santana (PT) com Onélia Santana, houve mais quatro casos. Aline Peixoto, casada com o ex-governador e ministro da Casa Civil, Rui Costa, foi para o Tribunal de Contas dos Municípios (TCM) da Bahia. Rejane Dias, casada com o ex-governador e ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias (PT), foi para o Tribunal de Contas do Estado (TCE) do Piauí. Renata Calheiros, casada com o ex-governador e ministro dos Transportes, Renan Filho (MDB), está no TCE de Alagoas. Marília Góes, casada com o ex-governador e ministro da Integração Nacional, Waldez Góes (PDT), foi para o TCE do Amapá. Imagino que o assunto seja tratado nas rodas de conversa entre ministros.

A situação não vem de agora e não se restringe ao tribunais de contas estaduais nem às esposas. Em 2011, Ana Arraes, deputada mãe do então governador pernambucano, Eduardo Campos, foi escolhida para o Tribunal de Contas da União (TCE).

A sequência expõe um método. Não dá para ser coincidência. Ou a razão se restringir à competência das indicadas. O fato de isso ocorrer no Nordeste e no Norte acaba levando a um olhar de Sudeste e Sul como sinal do atraso regional. Mas, a presença de familiares em cargos se espalha pelo Brasil. Há os Neves em Minas Gerais, os Garotinho e os Maia no Rio de Janeiro, os Covas sinalizam se tornar dinastia em São Paulo, há os Richa no Paraná, onde Sergio Moro também elegeu a esposa.

Na coluna anterior, citei reportagem do O POVO sobre o tema, ainda no ano passado. Nela fala o cientista político Pedro Gustavo de Sousa: “Não importa o quão industrializada ou agrária seja a plataforma econômica do estado, persiste a presença de grupos e lideranças políticas que carregam os mesmos sobrenomes por várias gerações".

As famílias dos presidentes

Interessante perceber ministros petistas aderiram à prática, coisa que o presidente Lula nunca fez. Teria possibilidade de eleger uma penca de filhos, mas nunca o fez. Fernando Henrique Cardoso é bisneto de Felicíssimo do Espírito Santo Cardoso, poderoso político de Goiás no período monárquico. Mas tampouco lançou parentes na política. Nem, Dilma Rousseff. Diferentemente das dinastias familiares de Fernando Collor, José Sarney ou Jair Bolsonaro.

Motivações

Os motivos são diversos para ter parentes na política. A lógica do poder é ocupar espaços, e com aliados tão leais quanto possível. Talvez por isso a relação mais convencional na política seja também a mais estável no âmbito familiar — entre pais e filhos. Escrevi na coluna anterior sobre como, para o eleitor, o reconhecimento e a tradição também têm significado.

Indicar parente para um cargo é diferente de ajudar a eleger um parente. A pessoa, de todo modo, precisa ter algum nível de mérito pessoal. Mas, há o processo de transferência de voto.

A indicação, sem o crivo do voto popular, tem o complicador de atentar contra o princípio constitucional da impessoalidade. Para cargos de natureza política, o Supremo Tribunal Federal (STF) não veda por nepotismo. Políticos argumentam questão de confiança. O gestor acaba tendo acesso à gestão de recursos, cujos impactos podem ajudar a eleger integrantes do mesmo grupo ou família. O poder se perpetua. Quando a indicação é para instituição como tribunal de contas, há risco de se comprometer a independência.

Muita gente, para defender indicações como a de Onélia, aponta que os críticos acabam se unindo aos conservadores ao questionar a atitude. Vejo diferente. A forma de indicação é que me parece aproximar políticos tidos como progressistas de práticas conservadoras e arcaicas. Chama mais atenção quando é com o PT por ser um partido reformador das antigas estruturas do Estado e que sempre se opôs a tais práticas.

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