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Idson Rico em Artes
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Jornalista, divulgador científico e professor da Universidade Federal de Rondonópolis. É doutor em ecologia pela Universidade Autônoma de Madrid, Espanha

Fabio Angeoletto ciência e saúde

Idson Rico em Artes

.Temos um gênio da música em Quixadá, Idson Ricart, ainda que ele abra um sorriso condescendente sempre que lhe certifico que suas canções são biscoitos finos, tão bons que o doutor e o pedreiro as consomem gostosamente
Tipo Opinião
Na foto, a vista de Elisama Sousa no Quixadá - CE, durante uma trilha. (Foto: Reprodução / Arquivo pessoal)
Foto: Reprodução / Arquivo pessoal Na foto, a vista de Elisama Sousa no Quixadá - CE, durante uma trilha.

Vivi em Quixadá, trabalhando como professor na Feclesc, um campus da Uece no interior. Eu ouvia de alguns colegas que trabalhar na Feclesc era considerado por parte dos docentes da Uece em Fortaleza como um exílio acadêmico, coisa pra tipos em fim de carreira. Que um educador se considere superior por estar neste ou naquele campus dá a letra de certa indigência mental - se o cabra é assim tão superlativo, por que não está em Harvard? O Sertão Central é um ambiente fabuloso para biólogos como eu, mas também para qualquer cientista com olhos para ver e sentir o que emana por ali. E são muitos os eflúvios!

Essa fervura do sol forte que catalisa paisagem e cultura, a caatinga modulando arte, dá em muita coisa boa. Temos um gênio da música em Quixadá, Idson Ricart, ainda que ele abra um sorriso condescendente sempre que lhe certifico que suas canções são biscoitos finos, tão bons que o doutor e o pedreiro as consomem gostosamente.

Sua obra musical está no panteão de diamantes como os álbuns de Chico Science e Nação Zumbi. Mas Idson não é uma emulação do mangue beat, porque ele veio ANTES do movimento musical pernambucano. Idson bebeu fundo nos sons e poesias sertanejas, sons da sua infância entre a cidade e os monólitos de Quixadá. Ele caiu na estrada para escutar emboladores, repentistas, poetas e sonhadores. Eles estão lá nas suas músicas. Está lá um físico da Feclesc sampleado, falando do lirismo que há na Teoria da Relatividade. Está lá Zé do Peixe, músico soberbo cujo instrumento é um pente de plástico. Tá tudo lá, na geleia geral mixada com rap, rock e música eletrônica.

Essa mesclagem soaria enfadonha e pretensiosa nas mãos de um comum. "Todo Mundo Vai Ouvir", seu primeiro disco, foi uma explosão, me perdoem o clichê, mas é assim que soa. Elogiado pelo Raimundo Fagner e por todo mundo, porque todo mundo ouviu. Eu tenho claro que não há Deuses, mas, se eles existem, eles não são equânimes ao distribuir seus talentos aos seus filhos mortais. Quisera ser poeta, e encaixar as palavras nessa voltagem:

"Ascatumbalacobaco, pau no curso do riacho,/ Pororoca em Pirapora,/ Desce o 'mí', Judas piora/ O jumento no roçado/ Tacapi. Cajá. Tá dura a ata doida pra cair/ Pelo buraco, a cobra embriagada/ Na vereda de preá tatu caminha dentro/ Fazendo num sei o que lá/ Tarzan em terra minha foi o filme que passou/ Num motel lá na Amazônia que eu fui com meu amor/ Não tem dinheiro. Não tem casa. Não tem nada/ O ser que não é não tem/ O ser que não tem não é/ Se não comprar roupa de marca, carro novo/ E deixar de comer ovo/ O ser não será nem é/ É o consumo entrando pelo rego, fumo/ Pra comprar os absurdos no mercado da ilusão." Idson Ricart está no YouTube e na Amazon Music.

 

Foto do Fabio Angeoletto

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