Henrique Araújo é jornalista e doutorando em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC), com mestrado em Sociologia (UFC) e em Literatura Comparada (UFC). Cronista do O POVO, escreve às quartas-feiras no jornal. Foi editor-chefe de Cultura, editor-adjunto de Cidades, editor-adjunto de Política e repórter especial. Mantém uma coluna sobre bastidores da política publicada às segundas, quintas e sextas-feiras.
O atual cenário da política cearense se desenha com alguns dos principais personagens do motim de policiais de 2020
Foto: Reprodução/ Facebook
Cid Gomes foi baleado em Sobral durante o motim dos policiais
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Num 18 de fevereiro cinco anos atrás, uma parcela dos PMs do Ceará decidia parar as atividades, reeditando movimento de 2011/2012, quando emparedaram o governo de Cid Gomes. Em 2020, contudo, o chefe do Abolição era Camilo Santana, pupilo de Cid. O prefeito de Fortaleza, Roberto Cláudio, então aliado do petista e principal fiador da candidatura de José Sarto ao Paço. O presidente da República, Jair Bolsonaro, naturalmente inclinado a apoiar a causa dos militares amotinados.
O desfecho, no entanto, seria diferente do daquele de quase uma década antes, quando os policiais obtiveram ganhos políticos, eleitorais e financeiros. Apenas à guisa de exemplo, toda uma geração de parlamentares foi catapultada pelo episódio, entre os quais Capitão Wagner (União Brasil). Entre 18/2/20 e 1º/3/20, quando o motim se encerrou em meio a uma explosão nos números de homicídios e ao quase assassinato de Cid, os estragos se multiplicavam, definindo o panorama do jogo de disputa que se dá ainda hoje no Ceará.
Resumo da ópera: se os eventos de 2011/2012 ajudaram a consolidar uma oposição no Estado a partir do engajamento das tropas em torno de um ideário cuja síntese fora a eleição de Bolsonaro, os de 2020 praticamente enterraram as pretensões de alguns atores no cenário local.
Tudo que se seguiu ao motim ajudou a configurar o ambiente político atual. Dos "estilhaços" que fariam Wagner perder a corrida para Sarto (à época, Camilo exploraria as relações entre o postulante e os PMs aquartelados) ao fortalecimento de personagens importantes do governismo (Élcio Batista, chefe da Casa Civil que negociara diretamente com os policiais, e o próprio Camilo), o motim estabeleceu um corte radical de posições para o qual a presença de Bolsonaro iria colaborar decisivamente.
Logo, os termos da queda de braço em 2020 já foram uma antecipação do que se aprofundaria em 2022, ou seja, petismo de um lado e bolsonarismo do outro.
Wagner e RC
Convém notar a mobilidade do quadro num intervalo tão curto quanto esse de cinco anos. Em 2020, Wagner concorreu ao Palácio do Bispo em aliança com André Fernandes e tendo como adversário o nome escolhido para suceder a Roberto Cláudio. Por sua vez, RC era, até ali, o sucessor natural de Camilo no Governo - não fosse a drástica alteração que significou a reentrada de Lula no tabuleiro, levando a um rearranjo de forças.
Salto para 2025: Camilo é ministro e Elmano de Freitas, que havia sido o relator da CPI do motim na Assembleia sob presidência de Evandro Leitão, ocupa a cadeira que foi do chefe do MEC. Evandro, que talvez sequer cogitasse postular a Prefeitura, houve por bem se tornar representante do bloco - Romeu Aldigueri, o novo comandante da Alece, foi autor da proposta de instalação da CPI.
Vendo-se a coisa com mais atenção, há um nexo entre a paralisação dos PMs e o Ceará de hoje, do qual o recente encontro entre Wagner e RC é apenas o sinal mais eloquente.
O que pode a oposição
Por vias tortas, RC e Wagner convergiram em 2024 depois de duelarem por uma década, com saldo positivo para o pedetista. Ano passado, todavia, os ex-desafetos se afeiçoaram por imposição das novas circunstâncias políticas: o 2º turno da eleição.
Nele mediram forças Evandro e André Fernandes (PL). Daí que os "neoaliados" estejam ensaiando o que pode redundar numa composição para o ano que vem. Vai dar certo? Há muita água por rolar, mas, lendo-se nas entrelinhas, o único empecilho a esse entendimento seria o PL, que tende a procurar uma candidatura bolsonarista de olho num palanque para o candidato ao Planalto chancelado pelo ex-presidente. Superada essa dificuldade, nem de longe trivial, todo o resto pode se resolver.
Política como cenário. Políticos como personagens. Jornalismo como palco. Na minha coluna tudo isso está em movimento. Acesse minha página
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