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Série de artigos analisa 500 dias do governo Bolsonaro
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Henrique Araújo é jornalista e mestre em Literatura Comparada pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Articulista e cronista do O POVO, escreve às quartas e sextas-feiras no jornal. Foi editor-chefe de Cultura, editor-adjunto de Cidades e editor-adjunto de Política.

Série de artigos analisa 500 dias do governo Bolsonaro

Tipo Análise
Jair Bolsonaro  (Foto: EVARISTO SA / AFP)
Foto: EVARISTO SA / AFP Jair Bolsonaro

Na marca dos 500 dias de gestão do presidente Jair Bolsonaro, que se completam nesta sexta-feira, 15, pesquisadores, analistas e aliados do chefe do Executivo refletem sobre as marcas desse período. A convite do O POVO, cada um deles escolheu três palavras ou conceitos que traduzam esses dias sob Bolsonaro. Boa leitura.

Leonardo Avritzer, cientista político e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), autor de “O pêndulo da democracia” 

Leonardo Avritzer, cientista político.
Foto: BRUNA VIEIRA/DIVULGAÇÃO
Leonardo Avritzer, cientista político.

Palavras: “desgoverno, militarização e ataque à ciência”

O presidente Jair Bolsonaro não tem uma visão de governabilidade. Tem uma visão de ministros que desestruturam áreas de políticas públicas das quais ele não gosta e das quais quer tensionar. O melhor exemplo são educação, o meio ambiente e a ciência e tecnologia.

O governo tem mais cargos de primeiro e segundo escalão ocupados por militares do que havia no último governo militar, do presidente João Batista Figueiredo. Além disso, todos os ministros da casa são militares.

O ataque à ciência é parte constitutiva do governo. Desde o ataque às universidades públicas até a redução das verbas do CNPq, e agora a defesa de concepções não científicas em relação ao novo coronavírus.

Felipe Braga, professor de Direito Constitucional da Universidade Federal do Ceará (UFC)

Felipe Braga Albuquerque - Prof. doutor da Faculdade de Direito da UFC
Foto: Andre Stoppelli
Felipe Braga Albuquerque - Prof. doutor da Faculdade de Direito da UFC

Palavras: “necropolítica, foco e anestesia”

Conceito desenvolvido pelo filósofo negro, historiador, teórico político e professor universitário camaronense Achille Mbembe, necropolítica significa se negar a humanidade do outro de modo que qualquer violência se torna possível, de agressões até morte. A política em Bolsonaro cada dia mais se expressa de modo paralelo à ideia de morte. Isso vale para políticas de segurança e, agora com a pandemia, as de saúde pública.

Por outro lado, a mudança de foco é uma grande habilidade política do presidente. Ele consegue continuamente (quase que diariamente) criar uma nova polêmica para afastar uma crise gerada por comportamento anterior. Utiliza-se comumente de factoides, pois suas declarações são em grande parte falsas, fabricadas ou não verificadas.

Anestesia política é o estado de apatia que tem dominado o comportamento social. Há um isolamento de multidões solitárias que, cada vez mais, têm dificuldade de conseguir unidade política. Tal característica não foi inaugurada no governo Bolsonaro, mas a rapidez de sua impopularidade fez crescer tal manifestação.

Rodrigo Prando, cientista político da Faculdade Presbiteriana Mackenzie (SP)

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Foto: EE
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Palavras: “presidencialismo de confrontação, pós-verdade e ‘e daí?’”.

Ao que parece, o presidente Bolsonaro substituiu o “presidencialismo de coalizão” e o “presidencialismo de cooptação” pelo presidencialismo de confrontação. Neste caso, confrontar tem sido mais importante que governar. Assim, Bolsonaro transformou os adversários em inimigos e, para ele, há inimigos internos e externos, reais e imaginários. Confrontou os atores políticos, chamando-os de velha política; confrontou até aliados de primeira hora; a imprensa, o STF, o Congresso Nacional, os estudantes, a classe artística, os cientistas, intelectuais, governadores e prefeitos. Essa lógica, até o momento, tem garantido o vigor da base de apoio bolsonarista com vistas às eleições de 2022. Contudo, inexiste governabilidade possível dentro do constante confronto, que esgarça o tecido democrático e institucional brasileiro.

Há ainda várias situações, durante o governo Bolsonaro, de uso da pós-verdade, nas quais o apelo às emoções e às crenças pessoais tornam-se mais importantes que os fatos concretos da realidade ou até fatos históricos já amplamente conhecidos.

Num embate com o presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, o presidente Bolsonaro afirmou que poderia contar a Santa Cruz como o pai dele havia sido morto durante o Regime Militar e depois completou: “Não é minha versão. É que a minha vivência me fez chegar nas conclusões naquele momento”. Aqui, nesse caso, a vivência é mais importante do que a documentação e conhecimento histórico que apontam que o pai de Santa Cruz, Fernando Augusto Santa Cruz de Oliveira, desapareceu em fevereiro de 1974, após ter sido preso por agentes do DOI-Codi.

Outros tantos exemplos de pós-verdade estão no desprezo pelo conhecimento científico, como, nos últimos tempos, o incessante empenho pessoal do presidente, alicerçado sobre suas crenças pessoais, de que o isolamento social durante a pandemia deve ser flexibilizado e, ainda, da defesa do uso de um medicamento sem evidências científicas de sua efetiva eficácia no combate ao coronavírus, a cloroquina.

Para finalizar: “e daí?”. Uma expressão banal para a maioria das pessoas que, ao dialogarem, indicam a pouca importância de algum fato ou assunto tratado na conversa. No entanto, o presidente Bolsonaro, desconhecendo a liturgia do cargo e, ainda, tendo desconsideração e empatia pelos milhares de brasileiros mortos ou por seus familiares, durante a pandemia, respondeu da seguinte forma à pergunta sobre o exorbitante número de mortos: “E daí? Lamento. Quer que eu faça o que? Sou Messias, mas não faço milagres”.

Cleyton Monte, professor e cientista político da UFC

Cleyton Monte  Cientista político, professor universitário e pesquisador do Lepem (Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia)
Foto: Cleyton Monte
Cleyton Monte Cientista político, professor universitário e pesquisador do Lepem (Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia)

Palavras: “militarização, reacionarismo e ultraliberalismo”

Há não apenas presença grande de militares no governo, mas várias propostas no Legislativo que beneficiam militares, como o excludente de ilicitude. Na gestão Bolsonaro, houve um empoderamento dos militares das Forças Armadas e também das forças auxiliares. Vimos movimentos no Brasil inteiro quase que sincronizados, de cobrança de melhoria salarial. É uma militarização também envolvendo a flexibilização das armas. Essa é a grande marca do governo. Não é um governo militar, mas militarizado e que tem nos militares a sua base social.

Além disso, é um governo mais reacionário do que conservador. O conservador preserva seus valores dentro jogo democrático. O governo Bolsonaro, não. Ele se inspira num período de exceção e nega conquistas da pós-redemocratização. É um governo que joga tensionando as instituições e com uma pauta que não é conservadora, é reacionária. As declarações de ministros como Damares Alves, por exemplo, apontam isso.

O reacionário tem dificuldade de lidar com a imprensa e a oposição, de modo geral. É um pensamento anti-democrático. É aí que entram o discurso fundamentalista religioso e a visão monolítica de família.

O terceiro ponto é a agenda do Paulo Guedes (Economia). É ultraliberal porque junta a venda dos ativos do estado, redução de investimentos e o desligamento da economia de um aspecto de justiça social. Exemplo disso foi o discurso de aprovação da reforma da Previdência, sempre numa perspectiva de maximização do mercado.

A semântica do governo é passadista, portanto. É da década de 1950, década de 1960, de transição pré-golpe militar, dos tempos de polarização e de ameaça do comunismo.

Cynara Mariano, professora de Direito da UFC

Palavras: “conflito, fascismo e ressentimento” 

O Governo mantém-se com base em uma política de conflito, responsável pela eleição de Bolsonaro, para demonstrar a necessidade de sua permanência e a de suas ações apenas como forma de enfrentamento dos “inimigos”, o que demonstra um governo sem projeto de país.

Para além do significado de um governo autoritário, a gestão Bolsonaro pratica o fascismo de Florestan Fernandes (“Poder e contrapoder na América Latina”), a partir da reação de suas estruturas contra as conquistas democráticas dos últimos governos progressistas em prol de uma maior democratização econômica e social.

O Executivo também demonstra, a partir do próprio titular da Presidência e seus ministros, o ressentimento do homem inexpressivo e comum, que nutre ódio à ciência, à cultura e aos avanços democráticos e civilizatórios, porque deles foi alijado ou invisibilizado na sua produção.

Heitor Freire, deputado federal pelo PSL

FORTALEZA, CE, Brasil - 27.01.2020: Heitor Freire, deputado federal, presidente estadual do PSL no Ceará Fotos: Thais Mesquita/O POVO)
Foto: Thais Mesquita
FORTALEZA, CE, Brasil - 27.01.2020: Heitor Freire, deputado federal, presidente estadual do PSL no Ceará Fotos: Thais Mesquita/O POVO)

Palavras: “Fé, desafio e reforma”

Acreditar que é possível é o mais importante para seguir em frente, trabalhando diante das dificuldades, sejam elas impostas por aqueles que estão na contramão de uma nova história para a política nacional; ou que a própria vida se encarrega de colocar no caminho exatamente para testar a força, resiliência e o compromisso com os objetivos maiores.

O maior desafio do governo Bolsonaro é devolver o Brasil para os brasileiros, após mais de uma década dos governos petistas ineficientes e corruptos, que colapsaram o país com maior roubalheira a que já assistimos.

Eu creio que os três poderes, Executivo, Legislativo e Judiciário, trabalhando em conjunto, realizarão esse feito.

Um dos pilares disso são as reformas de que o Brasil tanto precisa. O Governo começou com uma reforma ministerial, reduzindo de 27 para 22 o número de ministérios. Mas, sem dúvidas, a que mais impactará o futuro do Brasil é a Reforma da Previdência, aprovada no ano passado. A economia será na base de R$ 1 trilhão nos próximos 20 anos. Além dessas, até o fim do governo, acredito que vamos aprovar as reformas tributária e administrativa.

Adriano Vieira, presidente do Endireita Fortaleza

Palavras: “guerra pelo Brasil”

Essas palavras definem o que aconteceu e continua acontecendo em nosso país desde o primeiro dia do governo Bolsonaro. De um lado, o primeiro Presidente da República não só declarada, mas explicitamente “patriota”, que não rouba e não deixa roubar.

Do outro, “globalistas” do mundo inteiro tentando saquear nossas riquezas com a intermediação desta “oposição capaz de toda espécie de sordidez” para voltar ao poder - incendiar as próprias florestas, contaminar as próprias praias, vender a própria imprensa para a China, até matar seu próprio povo para roubar em contratações sem licitação.

Emanuel Freitas, cientista político da Universidade Estadual do Ceará (Uece)

Emanuel Freitas da Silva  Professor assistente de Teoria Política, pesquisador do Nerpo e do Lepem
Foto: Emanuel Freitas da Silva
Emanuel Freitas da Silva Professor assistente de Teoria Política, pesquisador do Nerpo e do Lepem

 

Palavras: “patriota, honesto e cristão”

Esse foi o tripé elencado pelo próprio Bolsonaro mesmo quando votou contra o processo de investigação do então presidente Michel Temer. Bolsonaro, à época, disse que, para ser uma grande nação, o Brasil precisa de um presidente patriota, honesto e cristão.

Esse tripé caminhou com ele durante a campanha e durante o governo. Patriota foi como se representou, sobretudo porque veio das Forças Armadas, que têm como pilar a defesa da pátria. E também porque soube, na campanha, sequestrar os símbolos da pátria, com destaque para as cores da bandeira. O verde e o amarelo passaram a ser as cores do Bolsonaro. Mas é um patriotismo contraditório.

A honestidade foi pilar na campanha e é do governo, com reiteradas afirmações de não existência de escândalos. Num primeiro momento, deu-se pelo lavajatismo, que estava dentro do governo e o blindou de investigações, de certa forma.

Mas é uma ideia que pode ser questionada pelas relações dos filhos, pelas tentativas de barrar investigações, divulgação dos gastos com cartão corporativo etc. Essa bandeira e seus usos são uma marca de Bolsonaro.

E, por fim, o cristianismo, ou talvez fosse melhor referir-se ao “terrivelmente evangélico”. É um dos pontos de ancoragem do governo. É uma gestão em que as lideranças evangélicas do Congresso apostam todas as suas fichas e fecham com ele, transformando o presidente numa autoridade político-religiosa.

FORTALEZA, CE, Brasil. 17.11.2019: Manifestação pelo impeachment do ministro Gilmar Mendes na Praça Portugal. Na foto: Amanda Martins, líder do movimento Consciência Patriótica. (Fotos: Deísa Garcêz/Especial para O Povo)
Foto: DEÍSA GARCÊZ/Especial para O POVO
FORTALEZA, CE, Brasil. 17.11.2019: Manifestação pelo impeachment do ministro Gilmar Mendes na Praça Portugal. Na foto: Amanda Martins, líder do movimento Consciência Patriótica. (Fotos: Deísa Garcêz/Especial para O Povo)

Amanda Martins, do Consciência Patriótica

Palavras: “Deus, pátria e família”

Essas palavras sempre nortearam a vida do presidente Jair Bolsonaro. Ele é o único governante do nosso país que não é movido pelos seus próprios interesses, mas leva a sério esses três pilares.

Bolsonaro coloca o bem-estar do Brasil acima de tudo, sempre valorizando a principal instituição que rege a sociedade que é a família e seus direitos fundamentais, dentre eles a liberdade. Além disso, é um homem temente a Deus, que vê o cargo que ocupa hoje como uma missão.

Diante disso, não tem sido fácil governar um país em que os demais políticos e representantes dos outros poderes não estão visando o bem da nação. Mas, ao contrário do que é propagado, o presidente fica cada vez mais forte e tem o povo brasileiro ao seu lado. Junto com ele faremos um grande Brasil!

 

Foto do Henrique Araújo

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