Hugo de Brito Machado Segundo é mestre e doutor em Direito. Membro do Instituto Cearense de Estudos Tributários (ICET) e do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT). Professor da Faculdade de Direito da UFC e do Centro Universitário Christus. Visiting Scholar da Wirtschaftsuniversität, Viena, Áustria.
Parece haver consenso de que o sistema tributário brasileiro precisa de correções. Daí falar-se tanto em "reforma tributária". Mas quando se trata do que, especificamente, deve ser alterado, o consenso acaba
Parece haver consenso de que o sistema tributário brasileiro precisa de correções. Daí falar-se tanto em “reforma tributária”. Mas quando se trata do que, especificamente, deve ser alterado, o consenso acaba. Talvez por isso se fale muito, mas se faça pouco. Interessante, então, identificar os principais defeitos que são apontados ao sistema: oneroso, complexo e injusto. As propostas de emenda constitucional (PECs) em trâmite seriam remédios eficazes contra tais males?
Propõe-se a unificação de vários tributos. ICMS, IPI, ISS, PIS e COFINS dariam lugar a um único IBS. Mas, quanto à onerosidade, ela não decorre da quantidade de tributos, mas das suas alíquotas, que são as frações da realidade tributada, usadas para o cálculo do valor devido. Quando se diz, por exemplo, que “o ICMS é 18%”, está-se falando da alíquota, pois 18% (do valor da operação tributada) corresponde ao montante devido de imposto. Só que as alíquotas são fixadas em lei, ou, no caso de alguns impostos, como o IPI, em Decretos. Para reduzi-las, portanto, não é preciso emendar a Constituição, onde estão as garantias do contribuinte. Aprovadas, as PECs em trâmite nenhum efeito terão sobre este problema, embora possam criar outros.
Já a complexidade decorre basicamente das “obrigações acessórias”, ou seja, de deveres ligados ao preenchimento de formulários e declarações, emissão de documentos etc. Mas tais obrigações são estabelecidas em atos infralegais (decretos, portarias...). Nem o Congresso precisa ser acionado, se a intenção for mesmo simplificá-las. A tecnologia e a inteligência artificial também poderiam ser usadas pelo Fisco para dar a sua contribuição, em vez de apenas facilitar o trabalho de autoridades para descobrir e multar os erros do contribuinte.
Também aqui, os projetos em trâmite não remediam o problema. É certo que a unificação de tributos também pode, em tese, ajudar na simplificação, mas isso dependerá de como as obrigações acessórias serão regulamentadas depois. A julgar pela complexidade do texto das propostas de emenda, é possível que tudo fique ainda mais complicado.
Finalmente, a injustiça. Diz-se que no Brasil se paga muito tributo. Mas também que se paga pouco. Talvez haja parcela de razão nos dois lados, sendo por isso que o sistema é injusto. Pessoas mais pobres pagam proporcionalmente muito, e as mais ricas, proporcionalmente pouco. Na Europa, por exemplo, tributam-se heranças com alíquotas que podem chegar a 20%. No caso da renda, podem passar dos 40%. Diante desses percentuais, os equivalentes brasileiros (8%, e 27,5%) são baixos. O problema é que, no Brasil, se tributam com tais alíquotas pessoas que, na Europa, seriam consideradas isentas, por receberem heranças ou rendimentos pouco significativos.
A reforma nada fará a esse respeito. Mas ela tornará a tributação do consumo ainda mais pesada. Estima-se uma alíquota para o IBS em torno de 25%. É muito. Se se considerar que os mais pobres consomem toda a sua pouca renda, enquanto os mais ricos podem aplicar apenas uma parte dela no consumo, poupando o restante, um sistema tributário que alcança mais pesadamente o consumo onera precipuamente os mais pobres.
A reforma em discussão, portanto, praticamente não atua sobre dois dos principais defeitos do sistema, e piora o terceiro deles. Não será de se estranhar se, depois de sua aprovação, as pessoas continuarem clamando por uma “reforma tributária”.
Ôpa! Tenho mais informações pra você. Acesse minha página
e clique no sino para receber notificações.
Esse conteúdo é de acesso exclusivo aos assinantes do OP+
Filmes, documentários, clube de descontos, reportagens, colunistas, jornal e muito mais
Conteúdo exclusivo para assinantes do OPOVO+. Já é assinante?
Entrar.
Estamos disponibilizando gratuitamente um conteúdo de acesso exclusivo de assinantes. Para mais colunas, vídeos e reportagens especiais como essas assine OPOVO +.