Jansen Lucas é coordenador de criação no O POVO, publicitário, designer e artista visual. Dedica-se a escrever sobre cultura com foco em produções de quadrinhos, cinema e literatura, explorando as conexões entre arte, narrativa e mídia em seus trabalhos
Top HQs de 2025: obras que marcaram o ano nas histórias em quadrinhos
Uma seleção dos quadrinhos que definiram 2025, escolhidos pela maturidade narrativa, pela ousadia visual e pela forma como traduzem questões contemporâneas em linguagem gráfica
As melhores leituras em quadrinhos surgem para mim quando a combinação entre narrativa e imagem revelam algo que a prosa, sozinha, não alcança. Nesta lista os quadrinhos ofereceram justamente isso: obras que expandem temas sensíveis, revisitam fatos históricos e iluminam conflitos íntimos com precisão gráfica.
Na coluna de hoje, reuni os títulos que mais se destacaram ao longo do ano, não por grandiosidade, mas pela consistência artística e pela capacidade de dialogar com o presente. São histórias diversas, unidas pelo olhar atento de seus autores e pela força que trazem consigo em cada página.
As Sereias de Haarlem - Felipe Pan
Foto: Divulgação/Nemo
As Sereias de Haarlem
A graphic novel de Felipe Pan e Gio Guimarães revisita a resistência holandesa pela lente íntima de três jovens que trocaram a rotina de uma cidade ocupada pela urgência do risco.
A história pulsa entre missões clandestinas e silenciosas fraturas emocionais, enquanto a arte em preto e branco, riscada com suavidade e sombra, transforma cada quadro numa memória tensa e frágil.
Não é apenas um relato sobre a segunda guerra; é um retrato da coragem que nasce quando o medo deixa de caber dentro do peito.
Aula de Teatro - Nick Drnaso
Foto: Divulgação
Aula de Teatro
Nick Drnaso conduz o leitor a um espaço onde todos acreditam estar apenas “brincando” de atuar, até perceberem que o palco exige mais do que fingimento. A sala de aula vira laboratório de desconfortos, onde vidas comuns se descascam como se expostas a luz muito forte.
Os desenhos contidos e as cores desbotadas acentuam a sensação de suspensão, criando um clima que nos deixa em dúvida se estamos diante de exercícios dramáticos ou confissões involuntárias. O resultado é um estudo incisivo sobre as máscaras que vestimos para existir.
Bossa Nova – Música Popular em Quadrinhos (MPQ) – Diversos autores
Foto: Divulgação/Stereo
Bossa Nova – Música Popular em Quadrinhos (MPQ)
Em capítulos ilustrados por diferentes artistas brasileiros, as histórias baseadas da Bossa Nova se desenrolam como um mosaico musical: encontros casuais que mudam rumos, cidades que vibram ao ritmo do violão e personagens que traduzem em acordes o espírito de um Brasil que se reinventava artisticamente.
Doce Amargo - João Marcos Mendonça
Foto: Divulgação/Nemo
Doce Amargo
Na HQ de João Marcos Mendonça, o rompimento da barragem de Mariana deixa de ser acontecimento distante e se torna experiência íntima. O autor mira o depois: a rotina desfeita, a água que some, os rumores que se espalham e a confiança que rui quando o essencial falta.
O traço direto carrega uma inquietação constante, como se a lama, mesmo longe dali, tivesse impregnado o ar. Entre filas, improvisos e medo, o livro expõe a distância entre promessas oficiais e a realidade de quem precisou sobreviver ao abandono.
Dormindo Entre Cadáveres - Luís Moreira Gonçalves e Felipe Parucci
Foto: Divulgação/Comix Zone
Dormindo Entre Cadáveres
A primeira obra acompanha o relato de um médico que, em meio ao colapso da pandemia, atravessa turnos longos enquanto o corpo já não distingue cansaço que enfrenta. A narrativa alterna entre memórias e observações com um senso de urgência mas longe do sensacionalismo.
Mostrando o peso de permanecer ali, mesmo quando o mundo ao redor está caindo e nada podemos fazer. Uma obra extrema, que da forma a diversos relatos que “cansamos” de ouvir nos anos de pandemia da covid-19.
Sou o Seu Silêncio - Jordi Lafebre
Foto: Divulgação
Sou o Seu Silêncio
Jordi Lafebre apresenta Eva Rojas, uma psiquiatra à deriva, perseguida por culpas e pelas vozes de mulheres que falam em sua mente. O crime apresentado na obra, que a envolve, é menos um mistério policial e mais um mergulho em sua mente inquieta.
Narrado com delicadeza gráfica e ritmo quase hipnótico. Entre flashbacks e consultas desconfortáveis, a protagonista tenta reconstruir tanto sua memória quanto sua reputação.
A arte, luminosa e cheia de gestos expressivos, sustenta a tensão emocional que guia o leitor até perceber que o silêncio, às vezes, diz mais que qualquer testemunho.
Helen de Wyndhorn - Tom King e Bilquis Evely
Foto: Divulgação
Helen de Wyndhorn
Na nova colaboração entre Tom King e Bilquis Evely, a juventude ferida de Helen encontra um mundo paralelo que tanto pode ser fuga quanto revelação.
A mansão Wyndhorn, com seus corredores silenciosos e ecos familiares, é o ponto de partida para aventuras que dialogam com fantasia clássica sem abandonar a melancolia do luto. A narrativa avança por confissões, memórias imperfeitas e territórios mágicos cuja existência nunca é dada como certa.
A arte arrebatadora transforma a dor em paisagem e faz da jornada de Helen um rito de passagem que encanta e fere na mesma medida.
Ouroboros - Luckas Iohanathan
Foto: Divulgação
Ouroboros
Luckas Iohanathan segue Kesler, um policial marcado por um trauma que insiste em reaparecer. Ao voltar à casa da infância, ele revisita um passado que não cicatrizou, a partir dai a história se desenrola como espiral, onde cada lembrança contamina o presente.
A paleta fria e econômica de Luckas, já característica de seu trabalho, reforça essa sensação. Criando um drama que não se apoia em revelações grandiosas, e sim no silêncio entre as cenas, no gesto contido e na palavra evitada.
Reflexos da Vida: Trabalhar e Viver - Fabien Toulmé
Foto: Divulgação/Nemo
Reflexos da Vida: Trabalhar e Viver
Fabien Toulmé conduz uma investigação global sobre a relação entre trabalho e dignidade, ouvindo histórias que revelam tanto rupturas pessoais quanto sistemas inteiros em falência.
Em suas viagens, o autor encontra trabalhadores exaustos, outros recém-libertos de jornadas insustentáveis e alguns que tentam reinventar a vida a partir do pouco que têm.
A narrativa gráfica dá textura aos relatos, mostrando rostos marcados por rotinas pesadas e sonhos interrompidos. O que emerge é um mosaico emotivo e político, que questiona como, afinal, escolhemos, ou somos forçados, a viver.
Túneis - Rutu Modan
Foto: Divulgação/WMF
Túneis
A aventura criada por Rutu Modan cruza arqueologia e política com um humor inesperado, enquanto segue Níli em sua busca pela mítica Arca da Aliança.
O túnel cavado clandestinamente funciona tanto como dispositivo narrativo quanto como símbolo da tentativa de atravessar fronteiras que a história insiste em erguer. Israelenses e palestinos surgem lado a lado, não como caricaturas de conflito, mas como pessoas presas a crenças, medos e disputas antigas.
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