
Magela Lima é jornalista e professor do Centro Universitário 7 de Setembro (Uni7), doutor em Artes Cênicas pela Universidade Federal da Bahia (UFBA)
Magela Lima é jornalista e professor do Centro Universitário 7 de Setembro (Uni7), doutor em Artes Cênicas pela Universidade Federal da Bahia (UFBA)
Nos grandes centros, nós somos todos uma leva de invisíveis. Nos miúdos, ao contrário, para o bem e para o mal, todo mundo é filho de alguém. Em parte, é isso que explica a graça dos desfiles de 7 de Setembro que tomam a Rua Major Agostinho, em Maranguape. Ali, ao menos por instantes, a mancha de "cidade mais violenta do Brasil" se anuvia e o que sobressai é uma explosão de alegria cuja marca maior é a voz estridente da agora comediante e influenciadora Morgana Camila.
O que se deu com Morgana Camila - revelada aos atuais mais de meio milhão de seguidores nas redes sociais pela narração particular dos festejos - acontece, ano a ano, com outros tantos maranguapenses, tirados de suas funções cotidianas, comuns, para ser vistos e celebrados pelos seus com outros olhos. O 7 de setembro em Maranguape ocupa lugar bastante semelhante ao carnaval da Unidos do Roçado de Dentro, lá na minha Várzea Alegre, ou ainda ao cortejo da abertura do Festival de Teatro em Guaramiranga.
Então, o professor de catecismo vira Dom Pedro I, a balconista da farmácia vira passista e a agricultora aposentada vira Catirina de Reisado. Quer coisa melhor? Essas festas populares rasgam o ordinário da vida. Por menor que sejam em duração, se agigantam ao garantir um deslocar de experiências, ao promover uma brecha no fluxo das censuras. É quando corpos e comportamentos fora das normas podem se expressar com liberdade. "Se amostrar" é revolucionário. Ser o que a gente é, do jeito que a gente quer ser, mesmo por um instante, é transformador.
Nas pequenas cidades, esses momentos, raros, ainda são possíveis. Felizmente. No automático das cidades grandes, no entanto, o natural é conviver com a indiferença. Os pais entregam seus filhos nas escolas a porteiros de quem nem sabem o nome. As pessoas, quando se cumprimentam num elevador, o fazem por obrigação. Isso não é vida, não, Vida é poder comer pão de um padeiro conhecido, é levar uma roupa numa costureira que já conhece suas medidas. Viver é poder conviver. Estar disponível ao outro é, antes de tudo, estar disponível a si.
Quanto menos comunitária é a vida, mais desinteressante ela fica. Isso não tem nada a ver com privacidade. Tem a ver com pertencimento, com a possibilidade de construir vínculos com as pessoas e os lugares. Eu não tenho a menor dúvida de que Maranguape amanhece melhor no dia 8 de setembro, assim como Várzea Alegre chega radiante na Quarta-Feira de Cinzas e Guaramiranga pela quando se despede de seu Festival de Teatro. As cidades e as pessoas são melhores quando sabem que é possível uma vida outra, mais leve, mais humana, mais sensível. Decidi: em 2026 estarei na Major, se não arrasando, ainda, prestigiando outros tantos arrasar.
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