Magela Lima é jornalista e professor do Centro Universitário 7 de Setembro (Uni7), doutor em Artes Cênicas pela Universidade Federal da Bahia (UFBA)
Magela Lima é jornalista e professor do Centro Universitário 7 de Setembro (Uni7), doutor em Artes Cênicas pela Universidade Federal da Bahia (UFBA)
A vida cultural de Fortaleza, felizmente, vai se despedindo de 2025 em movimento. Do muito que vivemos ao longo do ano, a noite do último dia 28 de novembro tem tudo para figurar entre aqueles momentos, cada vez mais raros, em que o tempo, sempre cruel, não consegue se impor em definitivo.
Era o aniversário de 83 anos da menina Maria, Maria Luiza Fontenele, e era, também, a primeira exibição pública de "Prefeita", documentário do meu amigo Felipe Barroso. No caso, a aniversariante e a personagem-título do filme, diga-se, são as mesmas pessoas, que um Cineteatro São Luiz quase lotado ovacionou e veio às lágrimas.
Em pouco mais de uma hora de duração, a obra luta para avivar a memória de um dos episódios mais importantes da nossa história recente. Autor da coletânea de contos e crônicas "O velho que ainda escrevia cartas de amor" (2005) e diretor dos videodocumentários "A Padaria Espiritual" (2005) e "Subversivos" (2008), Felipe Barroso opera um quase milagre com a nova produção.
Em, pelo menos, dois sentidos. "Prefeita" se faz a contragosto do discurso de que a gestão de Maria Luiza na Prefeitura de Fortaleza, entre 1986 e 1988, foi um retumbante desastre, e se faz, ainda, desafiando a precariedade e a escassez absurdas de registros e documentos audiovisuais de então.
Ao contar uma história de apenas 40 anos, o documentarista volta ao feito de Maria para chegar ao Paço Municipal nas eleições de 1985 - derrotando Paes de Andrade (PMDB), apoiado por Gonzaga Mota, governador do Estado à época, e Lúcio Alcântara (PFL), candidato do coronel Adauto Bezerra - praticamente, através de discursos.
"Prefeita" resgata uma história que não foi registrada a contento nem mesmo por quem a viveu. É chocante, por exemplo, o trecho em que o professor Paulo Linhares, responsável pela campanha publicitária que levou o PT a administrar pela primeira vez uma capital, se entusiasma com a possibilidade de a equipe do filme ter recuperado as peças que ele mesmo criou.
Da insurgente Fortaleza de 1985, ficou pouquíssimo, quase nada, em imagens, e isso diz muito da gente. Não guardar e não preservar nossos documentos é uma forma de não guardar e não preservar nossa memória e nossa história. É nesse lugar que "Prefeita" sublinha sua importância.
Felipe Barroso reuniu e costurou depoimentos preciosos, como os de Jorge Paiva e da inesquecível Rosa da Fonseca, em especial, que permitem às gerações futuras o direito essencial de lembrar, de sorrir e de chorar. Maria e todos nós merecíamos esse filme. "Prefeita" põe nossa ousadia no mundo. "Prefeita" provoca nossa crítica e nossa revolta. "Prefeita", aparentemente sem muita pretensão, mostra que a gente, como cidade, pode mais, pode muito.
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