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Perder a ideia toda azul
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Marília Lovatel cursou Letras na Universidade Estadual do Ceará e é mestre em Literatura pela Universidade Federal do Ceará. É escritora, redatora publicitária e professora. É cronista em O Povo Mais (OP+), mantendo uma coluna publicada aos domingos. Membro da Academia Fortalezense de Letras, integrou duas vezes o Catálogo de Bolonha e o PNLD Literário. Foi finalista do Prêmio Jabuti 2017 e do Prêmio da Associação de Escritores e Ilustradores de Literatura Infantil e Juvenil – AEILIJ 2024. Venceu a 20ª Edição do Prêmio Nacional Barco a Vapor de Literatura Infantil e Juvenil - 2024.

Perder a ideia toda azul

Como não louvar quem abriu caminhos, ocupou espaços dificultados às mulheres, militou na literatura e no jornalismo, soube ser lírica e crítica, amou e foi amada, e nos deixa o legado da completude que poucos alcançam?
Tipo Crônica
Marina Colasanti faleceu na última terça-feira, 28, aos 87 anos (Foto: FáBIO MOTTA/DIVULGAÇÃO)
Foto: FáBIO MOTTA/DIVULGAÇÃO Marina Colasanti faleceu na última terça-feira, 28, aos 87 anos

Conferi o verde dos olhos de Marina, quando ela veio a Fortaleza em 2018. Estivemos juntas no mesmo evento, sentamo-nos à mesma mesa, e quase não falei porque a oportunidade era de ouvi-la, reparar no seu cabelo perfeitamente preso no penteado arrematado por um lenço de seda, acompanhar os sorrisos espontâneos, fáceis, os movimentos do corpo leve, harmônico, dos braços e das mãos, aquelas mãos que escreveram as suas ideias azuis.

E essas ideias, que preenchem mais de 70 livros, nos mais diversos gêneros, contemplam das crianças aos adultos, se expressam nas palavras da escritora e nas imagens da artista plástica.

Sua obra vem iluminando gerações de leitores, entre os quais me incluo. Quando se está na sua presença de luz tão intensa, corremos o risco de cegar. No entanto, Marina brilhou suave, generosa. Manifestou-se com firmeza e doçura. Contou-nos sobre a amizade dela com Clarice e sobre a ida das duas num fusca à casa de uma cartomante.

Marina levou Clarice, e a experiência inspirou a trama de “A hora da estrela”. Relatou-nos com a intimidade das confidências que “ela (Clarice), no início incrédula, não deixou mais de visitar a vidente”.

Pouco me pronunciei, concentrada em tudo que vinha dela, em estado de adoração, admirada com aquela moradora do Olimpo interagindo conosco, pedindo o que lhe apetecia no cardápio do restaurante à beira-mar.

Como não louvar quem abriu caminhos, ocupou espaços dificultados às mulheres, militou na literatura e no jornalismo, soube ser lírica e crítica, amou e foi amada, e nos deixa o legado da completude que poucos alcançam?

Escreveu o que quis, como quis. Transitou com elegância e sutileza por searas distintas. E também o fez de modo explícito e mordaz. Teve reconhecimento em vida. Não consigo mensurar a falta dessa voz para um País que acaba de perder a sua ideia toda azul.

Foto do Marília Lovatel

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