No intervalo de menos de um mês, o mundo perdeu duas grandes referências humanas: o papa Francisco encerrou o seu sofrimento no dia 21 de abril, e Pepe Mujica, ex-presidente do Uruguai, no dia 13 de maio. Um partiu durante o período da Páscoa, e o outro em uma das datas mais importantes para os católicos, o aniversário da aparição de Nossa Senhora de Fátima às crianças pastoras na portuguesa Cova da Iria, também o marco oficial da libertação dos escravizados no Brasil.

O Pepe e o papa tinham similaridades, a repetição de sílabas pelas quais ficaram conhecidos, as pregações sinceras, fortalecidas pelo exemplo de vivência da simplicidade. O icônico fusca de Pepe, sua casa modesta, em uma chácara nos arredores de Montevidéu. O crucifixo do papa sem a ostentação de seus antecessores, o túmulo de Francisco, provas concretas da humildade em comum.

Ambos, cada um a seu modo, alimentavam o desejo de uma sociedade menos desigual e mais fraterna. Lutaram contra a pobreza material e espiritual. “Há muita infelicidade no mundo, não só pobreza. Há pobreza na mente e na alma”, defendeu Mujica.

Em uma de suas falas antológicas, ele nos pergunta em que gastamos o tempo de nossas vidas. “Em que você gasta o milagre de ter nascido?”, enfatiza, “você vai passar a vida pagando contas e comprando coisas até ser um velho destruído. E não se compra com o dinheiro, se compra com o tempo de vida que gastou para ter esse dinheiro, e o tempo da vida não se repõe. A vida é uma aventura”.

No último discurso, o papa fez um apelo à paz na Ucrânia e em Gaza. Suas palavras derradeiras foram de gratidão. O legado de Francisco é histórico. “Tem que deixar um bom capítulo”, afirmou Pepe. Os dois escreveram bem os seus capítulos. Somos leitores desse legado.