Jornalista, colunista de Economia da rádio O POVO/CBN; Coordenador de Projetos Especiais do Grupo O POVO DE COMUNICAÇÃO; Co-Autor do livro '50 Anos de Desenvolvimento Industrial do Ceará' e autor dos 'Diálogos Empresariais', dois livros reunindo depoimentos de líderes empreendedores do Estado do Ceará
O leito dele cede a ocupações irregulares, lixo, retirada de areia para construção civil. Em suas veias já não corre água, e o que tem são poças poluídas. O esperançoso Castanhão nunca mais sangrou nem vai sangrar. Não é a seca. É o consumo imediato da água por atividades de irrigação e o abastecimento de Fortaleza
Este é um mapa do Ceará do fim do século XIX, já com o território bem mais definido do que nos mapas anteriores ao período imperial. Observem o mapeamento dos nossos generosos mananciais hídricos, com destaque para o rio Jaguaribe, tracejado mais largo de modo a registrar seu leito volumoso a receber afluentes de porte, como o Banabuiú (engrossado pelo rio Patu), o Quixeramobim e o riacho do Sangue.
No inverno, esses rios faziam a alegria do vale jaguaribano, até a foz do rio, no Aracati. No inverno "macho" o Jaguaribe descia com força e muitas cachoeiras, trazendo fartura. Por isso era chamado "o maior rio seco do mundo", pois suas águas, no verão, minguavam à espera do próximo inverno.
Veio o homem e pinçou suas artérias com barragens poderosas de modo a suportar sua valentia. O Orós, em 1958, o Banabuiú e depois o Castanhão, nos anos 90. O Jaguaribe foi perdendo sua força. Todo o sistema hídrico foi morrendo aos poucos, não mais por conta das secas, como também pelo consumo crescente.
Nos últimos dias, meu amigo jornalista limoeirense Nelson Faheina tem reportado pra mim o quadro de tristeza que moldura o rio caudaloso e farto de ontem. E me pede ajuda para ecoar as agressões que estão deixando o Jaguaribe fora do mapa.
Relata ele que o leito dele cede a ocupações irregulares, lixo, retirada de areia para construção civil. Em suas veias já não corre água, e o que tem são poças poluídas. O esperançoso Castanhão nunca mais sangrou nem vai sangrar. Não é a seca. É o consumo imediato da água por atividades de irrigação e o abastecimento de Fortaleza.
Esta realidade dos nossos rios repete-se por todo o país e, mais tempo menos tempo, afetará o abastecimento e o equilíbrio ambiental da outrora admirada reserva hídrica do Brasil.
Como exemplo, bem aqui, na região conhecida por MATOPIBA (fronteira do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), amplos territórios já se tornaram imensos desertos. Terras esgotadas pelos fazendeiros de soja e milho sem o menor compromisso com o meio ambiente. Dentro de dez anos, caso não sejam observados protocolos ambientais, a região se assemelhará ao Saara.
A médio prazo, nos salvaremos por conta da transposição do rio São Francisco, que já libera dosadamente água para o Castanhão. Mas ele já pede socorro, ante o esgotamento de seus recursos ambientais e o consumo desenfreado.
Este é um problema só nosso, aborígenes extrativistas ? Claro que não. Nos Estados Unidos, o caudaloso Mississipi quase morre pela exploração indevida e insuportável poluição; o Sena cortava Paris nos anos 60 como um imenso esgoto, morto, fedorento; o Rheno corria poluído na Alemanha por razões semelhantes em meados do século passado.
Todos correm hoje fagueiros ambientalmente protegidos e onde se pode nadar e fazer turismo náutico. O que nos assusta é um Estado brasileiro indiferente e negacionista diante de realidades tão gritantes e ameaçadoras.
Do ponto de vista econômico, foi a fartura hídrica e o solo rico que puderam dar respostas ao empreendedorismo rural que hoje compreende o agronegócio. Mas todos sabem que, a continuar o esgotamento indiscriminado desses recursos, a longo prazo ele estará morto.
Não se trata de discurso de ativista ambiental. São fatos. Tudo aqui são fatos, a começar pelo Nelson indignado. Faça o mesmo.
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