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Que os candidatos disputem entre si; jornalista não deve ser alvo
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Plínio Bortolotti integra do Conselho Editorial do O POVO e participa de sua equipe de editorialistas. Mantém esta coluna, é comentarista e debatedor na rádio O POVO/CBN. Também coordenada curso Novos Talentos, de treinamento em Jornalismo. Foi ombudsman do jornal por três mandatos (2005/2007). Pós-graduado (especialização) em Teoria da Comunicação e da Imagem pela Universidade Federal do Ceará (UFC).

Que os candidatos disputem entre si; jornalista não deve ser alvo

Pelo jeito, o marqueteiro de Ciro Gomes terá muito trabalho para transformar seu comportamento acusatório e arrogante em "rebeldia".

“A rebeldia da esperança” será o slogan da campanha de Ciro Gomes (PDT), pré-candidato a presidente da República. Os objetivos do lema seriam dois: aproximá-lo do público jovem e reclassificar como “rebeldia” o proverbial temperamento reativo e arrogante do candidato no trato com eleitores e jornalistas.

Palavrões
Ciro apela constantemente a palavrões, já chamou eleitor que discorda dele de “burro”; gosta de constranger jornalistas (normalmente dizendo que eles ou o meio para o qual trabalham estão sob paga para fazer “serviços sujos” a alguém), passando por ameaça de prisão e xingamentos.

Não será necessário aqui desfiar todos os episódios, basta uma consulta ao Google, cruzando o nome dele com “xinga”; “empurra”; “fala palavrões” entre outras palavras aparentadas.

E não se trata de alguma questão episódica, mas de uma constância em sua trajetória política.

Compostura
O que se espera de um candidato a presidente da República, além de um plano para dirigir o País, é um pouco de compostura. Se ele se mostra pouco equilibrado durante a campanha, será difícil depois de, montado no poder, que venha a respeitar a “liturgia do cargo”, como classificava o ex-presidente José Sarney o respeito que o governante deve ter à instituição Presidência da República. Hoje, todos os brasileiros sabem muito bem como isso é importante.

Coletiva
A mais recente agressão moral de Ciro Gomes dirigida a um jornalista, deu-se contra Luís Costa Pinto, diretor editorial do portal de notícias Brasil 247. Após o lançamento de sua pré-candidatura, Ciro respondia a perguntas em uma entrevista coletiva.

Segundo turno
Quando chegou a vez de Costa Pinto, ele perguntou ao candidato, caso houvesse segundo turno em 2022, se ele ficaria no Brasil ou “viajaria para fora” como fizera em 2018.

Resposta
Ciro deu uma longa resposta fazendo um histórico sobre o comportamento de Lula, desde 1989, e como a trajetória do ex-presidente teria atrapalhado o Brasil. E arrematou: “[submeter-se ao] Capricho do lulopetismo nunca mais”.

Do ponto de vista político — concordando-se ou não com Ciro — foi uma boa réplica, que o pôs em vantagem em relação ao seu interlocutor.

Mas ele pôs tudo a perder quando acrescentou:

“Anote isso aí [falando com o entrevistador] para não fazer mais esse tipo de pergunta”. Fez menção de encerrar a resposta e voltou: “E a 247, Lula [o jornalista também é conhecido por esse apelido], desculpa, não é um órgão de imprensa. É um panfleto do Lula [o ex-presidente], pago com dinheiro sujo”.

Jornalista pergunta entrevistado responde

1. Não é o candidato que define que pergunta pode ou não ser feita. Todas as perguntas são justificáveis, por mais duras que sejam, desde que apresentadas adequadamente. O entrevistado sempre tem o direito de não responder.

2. Também não cabe ao candidato definir quais órgãos de imprensa estão autorizados a fazer-lhe perguntas. Todos, se for uma entrevista aberta, ou os veículos credenciados, quando for o caso.

3. O candidato estará no seu direito se, eventualmente, quiser organizar uma entrevista somente para os veículos, blogs ou portais de notícias que lhe forem simpáticos.

4. Também é lícito aos cidadãos, incluindo os políticos, criticar qualquer meio de comunicação. (Eu mesmo tenho restrições ao tipo de jornalismo do 247, mas é quanto à linha editorial, a forma de abordagem das notícias, entre outras questões de método, o que é diferente de acusá-los de crime.)

5. O que não pode é xingar jornalistas durante uma entrevista ou acusá-lo, sem provas, de estar fazendo algum tipo de trabalho “sujo” a serviço de terceiros: isso se chama covardia.

6. Se Ciro tem provas de que o portal 247 recebe “dinheiro sujo”, como um homem público, ele tem a obrigação de apresentar evidências.

Atenção: A disputa pela Presidência da República se dá entre os candidatos. É um equívoco grave que pretendentes ao cargo, qualquer um, queiram transformar o jornalista em alvo.

Emoji
Para piorar, Ciro publicou o trecho completo da entrevista em seu Twitter, com a pergunta “Sei ou não sei me controlar?”, com emoji com sorriso às lágrimas, como se fosse bonito o que fez. Vai ganhar muitos aplausos, dos convertidos.

Pelo jeito, o marqueteiro de Ciro terá muito trabalho para transformar esse tipo de comportamento acusatório e arrogante em “rebeldia”.

*

Aqui a íntegra do trecho da entrevista abordada neste texto, publicado no Twitter de Ciro Gomes.

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