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Semitismo não pode ser sinônimo de apoio ao massacre de Gaza
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Sou jornalista de formação. Tenho o privilégio de ter uma vida marcada pela leitura e pela escrita. Foi a única coisa que eu fiz na vida até o momento. Claro, além de criar meus três filhos. Trabalhei como repórter, editora de algumas áreas do O POVO, editei livros de literatura, fiz um mestrado em Literatura na Universidade Federal do Ceará (UFC). Sigo aprendendo sempre. É o que importa pra mim

Semitismo não pode ser sinônimo de apoio ao massacre de Gaza

De forma corajosa, a escritora judia-canadense Naomi Klein, colunista do "The Guardian" afirma que o povo judeu erra na contemporaneidade por não ensinar as novas gerações a transformar dor, vergonha, raiva e desejo de vingança, vividos com o holocausto, em reflexão que pode impedi-los de cometer "atrocidades aos outros"
Palestinos inspecionam os danos após ataque israelense ao campo de refugiados de Bureij, no centro da Faixa de Gaza, em 23 de julho de 2025 (Foto: Eyad BABA / AFP)
Foto: Eyad BABA / AFP Palestinos inspecionam os danos após ataque israelense ao campo de refugiados de Bureij, no centro da Faixa de Gaza, em 23 de julho de 2025

Há alguns bons anos, fiz parte como jornalista do O POVO de uma comissão de empresários, pesquisadores e secretário de governo que visitou Israel.

De Haifa ao deserto de Neguev, conhecemos experiências agrícolas exitosas que poderiam, dadas as proximidades climáticas, serem replicadas no Ceará, o que de fato aconteceu. Desde então, tenho bastante interesse na região, principalmente no momento do atual conflito.

É possível dizer que a fundação de Israel, em 1948, foi o ápice da luta de povo sobrevivente, fraturado e espoliado durante a Segunda Guerra Mundial.

A perseguição aos judeus que, segundo Hannah Arendt, atravessou séculos, chegou ao século XX como uma explosão, utilizada pelos nazistas para colocar em curso o extermínio de um povo. Dar um lugar a essa população era, portanto, uma questão urgente e humanitária.

Reconhecer esse momento histórico, porém, não pode ser carta branca para apoiar a atuação Israel em Gaza atualmente. Aceito que o Hamas precisa ser contido, mas atacar Gaza da forma como vem acontecendo há quase dois anos é desumano e cruel.

Pôr na conta de “fatalidades e tragédias” as mortes causadas durante ações humanitárias em Gaza, como tem feito o governo israelense, chega a ser desonroso para espécie humana. Definir se o que está acontecendo em Gaza é genocídio ou não, me parece tratar-se de opacidade intelectual.

Convoco aqui o livro da escritora judia-canadense Naomi Klein, “Doppelgänger: Uma viagem através do mundo espelho”, ao enfrentar de forma corajosa os dilemas do duplo Palestina-Israel. Ela sugere que há uma falha na educação judaica em fazer cada criança israelense reviver o horror da guerra, mas nunca levá-la a refletir em como toda essa experiência brutal pode afastá-la de cometer “atrocidades aos outros”.

“Surpreende-me que nunca tenhamos sido convidados a tirar proveito da nossa raiva e transformá-la num instrumento de solidariedade” (pg. 358).

Naomi Klein expõe, historicamente, como os novos ocupantes do território palestino nos anos de 1940, invibilizaram seus antigos habitantes, tornando-se invisíveis também a estes.

Os judeus levaram para a região da Palestina, de acordo com Klein, o modelo colonialista de exploração e sujeição de outros povos, bastante conhecido e vivenciado por eles na Europa.

Por experiência própria, um judeu sabe o que é ser apátrida. Klein cita o intelectual palestino-estadunidense Edward Said que, em síntese, chamou os palestinos “vítimas das vítimas” (pg. 363).

Ler Naomi Klein, certamente, me aliviou a alma, embora saiba que muitos israelenses, até membros do Exército, são críticos da ação militar que está exterminando palestinos crianças e mulheres e idosos e homens inocentes. Ser antissemita não pode ser sinônimo de apoio incondicional a Israel enquanto este dizima palestinos em Gaza.

Gaza sob bombas: palestinos reportam dezenas de mortes | O POVO News

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