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Coronavírus: outras histórias de heróis da resistência
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Coronavírus: outras histórias de heróis da resistência

Enquanto você fica em casa no isolamento social, trabalhadores de diversas áreas e histórias de vida enfrentam um mundo de incertezas em tempos de pandemia
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FORTALEZA, CE, BRASIL, 03.04.2020: Personagem do Heróis da Resistência, Primeiro Tenente Isabel Almeida do Corpo de Bombeiros Militar do Ceará - Núcleo de Busca e Salvamento (Foto: Thais Mesquita/O POVO) (Foto: Thais Mesquita)
Foto: Thais Mesquita FORTALEZA, CE, BRASIL, 03.04.2020: Personagem do Heróis da Resistência, Primeiro Tenente Isabel Almeida do Corpo de Bombeiros Militar do Ceará - Núcleo de Busca e Salvamento (Foto: Thais Mesquita/O POVO)

Enquanto as famílias se fecham dentro de seus lares, esperando pelo fim da pandemia de Covid-19 que varre o mundo, um porteiro se mantém como guardião na madrugada. Um veterinário, além de se preocupar com os bichos - em prol dos quais sai de casa todos os dias em plena quarentena - encontrou nos exercícios físicos um meio de se sentir menos enjaulado.

 

O gari passa o dia empurrando um carrinho e recolhendo lixo das ruas quase sem pessoas. Os equipamentos de proteção individual que o resguardavam das poeiras e outras intempéries do ofício, agora passam também a protegê-lo de vírus invisíveis. “Se eu não for para a rua, aumentam as doenças”, aponta, sábio. Ao chegar em casa, ele evita encontrar as filhas, ainda que lhe doa o coração repelir as crianças que correm para abraçá-lo. O carinho só pode existir depois de afastar o perigo de um contágio.

O policial experiente comanda um batalhão, mas a surpresa o acerta em cheio no peito ao ver a cidade de mais de 2,5 milhões de habitantes quase deserta. Os patrulhamentos se tornaram mais tranquilos, mas o comandante tem receio de ver suas equipes adoecerem. “Somos um serviço muito essencial, principalmente, para população carente”, diz, angustiado também com a violência doméstica que tem crescido debaixo dos telhados.

O médico não está na linha de frente do combate ao novo coronavírus, mas torce pelos colegas que estão. Ele sai todos os dias de casa para cuidar das pessoas que precisam de sua especialidade. Acredita fortemente no pensamento positivo, mas a resposta para as perguntas diárias e aflitas da esposa sobre quando tudo isso vai acabar, ele não sabe dar de uma forma melhor.

Passadas duas semanas de isolamento social estabelecido por meio de decreto estadual, essa é a realidade para muitos cearenses que continuam nas suas rotinas - não mais normais, mas essenciais. Os profissionais aqui citados se juntam a tantos outros, anônimos: farmacêuticos, revendedores de gás, técnicos de empresas de energia elétrica, frentistas, padeiros. Eles são os heróis que resistem nas ruas para você ficar em casa.

O guardião das portas

Por Catalina Leite

Enquanto a população fecha as portas de seus apartamentos para cumprir as medidas de isolamento social, os porteiros ficam na linha de frente dos condomínios. Eles observam o escasso ir e vir dos condôminos, enquanto se preparam para mais um dia (ou noite) de trabalho. Luís Silva Sousa, 64, trabalha no prédio atual há 17 anos e afirma nunca ter faltado ao emprego, nem ter chegado atrasado e muito menos apresentado atestado.

Mesmo já configurando grupo de risco, o porteiro continua cumprindo o horário de 19h às 7h de vigilância. “Pra ser sincero, a gente não se sente seguro quando sai de casa. Mas tem que ter dinheiro para proteger a gente”, comenta seu Luís. É por isso que, munido de álcool em gel e máscaras cedidas pelo condomínio, o porteiro mantém a rotina. Do Aracapé, onde mora, até a Parangaba, onde trabalha, são 20 minutos. Pelo menos nisso a pandemia dá uma trégua, já que a ausência de carros desafoga o trânsito e encurta a viagem dentro do ônibus. No trajeto, o pensamento é religioso: “É o que Deus quiser, é confiar em Deus.”

Quando o porteiro volta para casa, a segurança da família vem em primeiro lugar. Ao cruzar o portão, a esposa de Luís já o recebe com uma toalha. Assim, ele tira a roupa do trabalho e segue direto para o chuveiro. Toma banho, lava bem as mãos e só então interage com os familiares. Apesar do cenário de tensão, seu Luís parece manter a calma. Ele se sente protegido pelas quatro paredes altas da guarita e a pouca movimentação noturna. E enquanto famílias se fecham, aguardando o fim da pandemia, o porteiro guarda suas portas para garantir a sobrevivência delas e da própria família. (Catalina Leite - catalina.leite@opovo.com.br)

FORTALEZA, CE, BRASIL, 03.04.2020: Personagem do Heróis da Resistência, Coronel Belline, comandante do 17º Batalhão da Polícia Militar do Ceará. (Foto: Thais Mesquita/O POVO)
FORTALEZA, CE, BRASIL, 03.04.2020: Personagem do Heróis da Resistência, Coronel Belline, comandante do 17º Batalhão da Polícia Militar do Ceará. (Foto: Thais Mesquita/O POVO)

Patrulhamento em ruas quase vazias

Por Filipe Pereira 

O comandante Hideraldo Bellini, 44 anos, começou a atuar como major no 17º Batalhão da Polícia Militar do Ceará em novembro de 2019. Há 25 anos, o PM relata nunca ter vivenciado uma rotina tão incomum com a qual tem vivido desde o dia 16 de março, início da pandemia do novo coronavírus no Ceará. O policial integra a equipe dos 100 profissionais diários que percorrem as ruas desde o Genibaú até o Siqueira, garantindo a segurança da população, onde, segundo ele, possui um crítico Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).
“Somos um serviço muito essencial, principalmente, para população carente e que não tem emprego formal, aspecto que os deixam em maior estado vulnerável” afirma. Segundo Bellini, a corporação opera com máscaras e álcool em gel e as viaturas são constantemente limpas com a mistura de água natural e sanitária. “Até para que nossos profissionais não sofram baixa pedimos que as pessoas colaborem também com a área médica, cumprindo a orientação da vigilância sanitária,” ressalta.
O PM reforça que, durante as últimas semanas, embora o trabalho tenha sido relativamente calmo, viaturas fixas têm se concentrado nas áreas comerciais da região, onde houve um pequeno aumento dos roubos - com mais de 6 flagrantes de pessoas armadas até o momento. Contudo, Bellini traz uma notícia boa, apesar da alta taxa de violência doméstica após o confinamento, felizmente, o padrão não se repete em em sua região. (Filipe Pereira - filipepereira@opovo.com.br)

Dávio faz parte de um time de X funcionários do Ecofor
Dávio faz parte de um time de X funcionários do Ecofor

Ofício: limpar as ruas. Missão: cuidar da família

Por Bruna Damasceno

O gari Dávio José Pereira, 32, não abraça mais as duas filhas de cinco e 11 anos. Ele precisou adotar novos hábitos em casa já que ainda precisa encarar as ruas todos os dias para trabalhar, das 7h às 15h. Quando chega, todo coberto de álcool, corre para tomar banho e mantém a distância de todos.
“Eu passo álcool em gel nos braços, nas mãos, em todo o canto. Evito pegar nas meninas, abraçar… É um pouco difícil, mas é por amor à família”, relata. Os cuidados são necessários após um dia longo que começa antes mesmo do ofício, quando toma um ônibus para o terminal da Messejana e outro da empresa. Depois, segue limpando praças, parques e vias dos bairros Curió e Passaré.
Para Dávio, contar com os equipamento de proteção individual (EPI) ajuda a diminuir a percepção de insegurança diante dos riscos. O que preocupa mesmo é família, os pais que moram no interior e ele liga para saber se estão se cuidando. “Nosso trabalho é essencial. Se eu não for para a rua, aumentam as doenças”, frisa. Ele não está sozinho. Outros 1.280 funcionários do Ecofor fazem a limpeza da cidade todos os dias. (Bruna Damasceno
bruna.damasceno@opovo.com.br)

FORTALEZA, CE, BRASIL, 03-04-2020: Homem da aera da saúde de mascara. Pessoas transitando nas proximidades no Hospital Walter Cantidio em época de COVID-19. (Foto: Aurelio Alves/O POVO)
FORTALEZA, CE, BRASIL, 03-04-2020: Homem da aera da saúde de mascara. Pessoas transitando nas proximidades no Hospital Walter Cantidio em época de COVID-19. (Foto: Aurelio Alves/O POVO)

O médico que não está na linha de frente mas não deixa a batalha

Por Bárbara Bezerra

As demandas não puderam parar e, por mais que não esteja trabalhando em uma unidade voltada a tratamentos de Covid-19, o otorrinolaringologista André Alencar precisa sair de casa para cuidar de demais atendimentos que também merecem atenção. As formas de contato físico com os pacientes é analisada com cautela. Assim como a chegada em casa, com banho tomado seguindo as medidas de prevenção antes de entrar no apartamento e encontrar a família.
“A minha roupa vai direto para um recipiente com sabão para fazer a lavagem. O sapato sempre dentro do carro”, comenta. A resposta para as perguntas diárias e aflitas da esposa sobre quando tudo isso vai acabar, ele ainda não consegue dar, mas o pensamento positivo é sua arma. Neste momento, André acredita que a empatia é fundamental. “Para os meus colegas de profissão que estão nessa batalha, eu bato palma e tiro o chapéu. Passam seis horas em pé trabalhando, sem poder ir ao banheiro ou beber água. Essa é a realidade de quem trabalha em uma unidade que trata pacientes com Covid-19”, pontua, sem perder a esperança de que dias melhores virão. (Bárbara Bezerra - barbarabezerra@opovo.com.br)

FORTALEZA, CE, BRASIL, 01-04-2020: Profissões que não podem parar na quarentena. Personagem é o dr. Ricardo Henz, veterinário e proprietário da Clínica Veterinária São Francisco | Pet Shop - Av. Barão de Studart, bairro Aldeota.(Foto: Thais Mesquita/ O POVO)
FORTALEZA, CE, BRASIL, 01-04-2020: Profissões que não podem parar na quarentena. Personagem é o dr. Ricardo Henz, veterinário e proprietário da Clínica Veterinária São Francisco | Pet Shop - Av. Barão de Studart, bairro Aldeota.(Foto: Thais Mesquita/ O POVO)

Dedicação à saúde dos animais

Por Letícia do Vale

Mesmo em meio à quarentena causada pelo coronavírus, alguns profissionais não podem parar. É o caso do veterinário Ricardo Henz que, além de se preocupar com a própria saúde, deve zelar pela saúde dos clientes. Proprietário da Clínica Veterinária São Francisco e com uma baixa no movimento de 70%, continuar trabalhando é o que tem mantido seu lado emocional equilibrado.

“Sempre fui muito saudável, mantenho os cuidados, não tenho doenças e estou fazendo a minha parte. Outro motivo que me faz trabalhar é conseguir pagar os salários de todos os funcionários integralmente no fim do mês”, indica Ricardo. Os clientes, a maioria receosos e até apavorados com o cenário, agora são atendidos por hora marcada, e não mais por ordem de chegada, para evitar aglomerações na recepção. O álcool em gel se tornou um companheiro inseparável e os ambientes são mantidos sempre muito bem arejados.

Ao chegar em casa, a regra é ir tomar banho imediatamente e higienizar as roupas. Para aliviar a tensão, a prática diária de exercícios físicos é fundamental. Em meio à nova realidade, Ricardo se mantém otimista: “As medidas sanitárias adotadas pelos especialistas responsáveis são adequadas e vão começar a fazer efeito em breve. Basta ter paciência e respeitar as limitações”, acredita. Como dica para donos de bichos, alerta que as vacinas não podem atrasar mais de seis meses e que o passeio para o animal não pode faltar. Em casa ou no prédio, basta procurar o local com maior incidência solar para a atividade. (Letícia do Vale -leticiadovale@opovodigital.com)

FORTALEZA, CE, BRASIL, 03.04.2020: Personagem do Heróis da Resistência, Primeiro Tenente Isabel Almeida do Corpo de Bombeiros Militar do Ceará - Núcleo de Busca e Salvamento (Foto: Thais Mesquita/O POVO)
FORTALEZA, CE, BRASIL, 03.04.2020: Personagem do Heróis da Resistência, Primeiro Tenente Isabel Almeida do Corpo de Bombeiros Militar do Ceará - Núcleo de Busca e Salvamento (Foto: Thais Mesquita/O POVO)

Preocupação com os que não cumprem o isolamento

Por Filipe Pereira

Segundo a primeiro Tenente Isabel Cristina, 28 anos, a rotina agora é outra no Núcleo de Busca e Salvamento do Corpo de Bombeiros Militar do Ceará, localizado na avenida Leste-Oeste, em Fortaleza. Há quatro anos na unidade, a bombeira relata que, embora mais calmo, o cotidiano é de constante preocupação interna e externa.
“Há uma preocupação de sempre higienizar as mão, usar álcool em gel, em nosso próprios dormitórios tivemos que afastar as camas e realizar a limpeza dos equipamentos que são de uso comum” afirma a bombeira. Já a higienização geral, segundo ela, foi intensificada após a realização do serviço de sanitização na unidade oferecido por duas empresa privadas. “Tanto na parte de dentro das cabines das viaturas quanto nos dormitórios estamos recebendo uma limpeza com ozônio, especial para vírus” revela.
As ocorrências constantes como quedas e resgates continuam as mesmas, revela Isabel. Crente na eficiência do isolamento social como medida de combate à Covid-19, ela ressalta a permanência, em alguns bairros, de pessoas nas ruas. “Como atendemos todos os tipos de bairros de diferentes níveis sociais, percebi que nas comunidades mais pobres a gente vê mais gente na rua e nas calçadas” avalia. Apesar disso, a expectativa é que a curva epidemiológica não seja “tão acentuada” em Fortaleza, com o sistema de saúde conseguindo tratar os infectados. (Filipe Pereira - filipepereira@opovo.com.br)

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