A Universidade Federal do Ceará publicou, na última sexta-feira, 5, uma Proposta Pedagógica de Emergência (PPE) definindo a retomada gradual das atividades a partir de julho. A solução apontada para encerrar o semestre com "prejuízos mínimos" é a volta das aulas com atividades remotas. Entretanto, estudantes e professores têm discordado do plano. Entre os problemas apontados está a ausência de inclusão digital, além da baixa participação da comunidade acadêmica na elaboração do documento.
Desde março, quando o Ceará entrou em isolamento social, as atividades universitárias presenciais foram suspensas sem haver indicação de planejamento para garantir a isonomia do acesso à educação. Alguns cursos receberam a instrução de que deveriam imediatamente manter suas disciplinas por meio remoto. Outros decidiram paralisar as atividades. "A cada 15 dias suspendiam as atividades presenciais, o que impossibilitou aos cursos um planejamento efetivo", aponta Samantha Capdeville, coordenadora de Cinema e Audiovisual.
"Perdemos muito tempo mantendo o calendário acadêmico e essa expectativa de normalidade", afirma a professora. Segundo ela, diversos cursos estão fazendo questionários próprios e "tudo indica em torno de 30 a 35% dos estudantes não têm acesso a internet de qualidade". Ela aponta ainda que o problema vai além; mesmo em disciplinas teóricas são necessários equipamentos e programas a que nem todos os estudantes têm acesso.
Eduardo Junqueira, professor do Instituto UFC Virtual e especialista em aprendizagem online, explica que um bom curso remoto demanda tempo de planejamento, trabalho com equipe multidisciplinar e preparação do aluno.
"O aprendizado não tem sido bom. Não adianta fazer fichamento ou resumo de texto sem ter discussão sobre ele, nas Ciências Humanas isso é muito importante", relata Lívia Damasceno. A jovem está no sexto semestre de Geografia e conta que as atividades remotas foram mantidas por alguns professores apesar de ela e colegas terem dificuldade de acesso online.
Já a estudante do terceiro semestre de Odontologia Julyana Raab lembra das aprendizagens que dependem de atividades práticas. "É previsto que as aulas teóricas voltem dia 17 de julho, alguns professores já enviaram cronogramas", conta. "Ainda não sabemos quando será possível o retorno das práticas. Serão necessárias várias mudanças estruturais, além da necessidade de mais equipamentos de proteção individual." Lanna Carvalho, do quinto semestre de Cinema e Audiovisual, lamenta que as decisões da Reitoria não considerem as opiniões estudantis. "A UFC é uma universidade plural, mas estão colocando um modelo excludente em um momento de pandemia."
Para viabilizar o ensino remoto, a UFC afirma estar licitando 6 mil pacotes de dados com franquia de 20 GB pelo período de seis meses. Entretanto, a medida pode ser insuficiente. Enquanto o reitor Cândido Albuquerque tem destacado que apenas 1% dos estudantes não têm acesso à internet, a mesma pesquisa a que se refere, conduzida online pela Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis (Prae), indica que 13% só utilizam a rede por meio de pacote de dados 3G e 4G. O levantamento foi respondido por 10.069 alunos, o que corresponde a cerca de 34% de todos os campi da Universidade.
Outra pesquisa online, realizada entre maio e junho pelo Diretório Central dos Estudantes (DCE) da UFC, foi respondida por 3.013 alunos. Destes, 1.011 (33,6 %) afirmam que o principal problema nas suas turmas é a falta de acesso à internet. Outros 17,2% indicaram ter aulas à distância sem qualidade e 16,8%, aumento de problemáticas psicossociais. Stefany Tavares, estudante de Pedagogia e secretária geral do DCE UFC, explica que "desde o início do isolamento social e da suspensão das aulas presenciais, as entidades representativas dos estudantes da UFC têm se posicionado contrárias às aulas remotas".
De acordo o Diretório, o plano da UFC "deixa inúmeras brechas e causa muitas dúvidas" e a melhor medida seria a suspensão de atividades por tempo indeterminado com manutenção da assistência estudantil. A proposta foi elaborada ainda em março e, segundo Stefany, respondida pela Reitoria apenas com a confirmação de recebimento.
IFCE
O retorno ao calendário acadêmico, com ensino a distância, também é motivo de polêmica no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE). Hoje, das 15h às 17h, servidoras e servidores discutem o tema em uma assembleia geral online.